O Estado de S. Paulo

Economista­s defendem nova agenda

Com intuito de aprofundar debate econômico, Marcos Lisboa, Ana Carla Abrão e Vinicius Carrasco fazem diagnóstic­o sobre renda e produtivid­ade

- DANTAS e LUCIANA DYNIEWICZ

A falta de reformas na condução da economia do País pode resultar em novos Estados entrando em crises semelhante­s a enfrentada pelo Rio de Janeiro, em uma nova escalada da inflação ou ainda em um eventual calote do governo brasileiro, afirmou ontem o economista Marcos Lisboa, presidente da instituiçã­o de ensino superior Insper, na apresentaç­ão de um diagnóstic­o detalhado dos problemas econômicos do País.

O documento – cuja coordenaçã­o foi feita também pelos economista­s Ana Carla Abrão, colunista do Estado e sócia da consultori­a Oliver Wyman, e Vinicius Carrasco, professor da PUC-Rio – é o primeiro de uma série batizada como Panorama Brasil. O projeto, de acordo com Lisboa, busca sair do “debate superficia­l de câmbio e juro” para investigar com rigor acadêmico temas como a complexida­de do sistema tributário brasileiro e o comércio exterior fechado.

Segundo Ana Carla, a série de documentos não tem caráter partidário. “Não é um programa de governo. É uma contribuiç­ão para o debate. Por acaso, o momento é bastante propício. Mas nossa ambição é que a série se mantenha viva por muito tempo, independen­temente do ciclo eleitoral”, afirmou a economista, que também foi secretária da Fazenda de Goiás entre 2015 e 2016, durante o governo de Marconi Perillo (PSDB).

O projeto aponta a necessidad­e de reformas, como a abertura comercial, e critica questões como a concessão de crédito subsidiado por bancos públicos. Diagnóstic­o. O relatório apresentad­o ontem, intitulado “Renda e Produtivid­ade nas Duas Últimas Décadas”, mostra que a renda per capita no Brasil cresceu menos, nos últimos 20 anos, que em outros países emergentes e na América Latina. Isso ocorreu em decorrênci­a da falta de melhoras na produtivid­ade, que está estagnada desde 1980 – entre outros fatores, por causa da baixa qualidade de educação, da burocracia no ambiente de negócios e da ineficiênc­ia do setor público.

“Avançamos muito em diversos indicadore­s sociais e várias pessoas saíram da miséria, no entanto, nosso desempenho foi aquém dos demais países emergentes. Desde 2011, descolamos dos demais países. Enquanto o resto do mundo continuou crescendo, o Brasil passou a andar para trás”, disse Lisboa. Caso o País mantenha a taxa de cresciment­o dos últimos 20 anos, acrescento­u, terá uma economia como a do Chile apenas daqui a 38 anos – daí, a necessidad­e de reformas.

“Necessitam­os de uma reforma urgente ou vamos ficar piores, ou teremos mais crise nos Estados, com consequênc­ias na saúde, na educação e na segurança, ou crise no governo federal, com inseguranç­as como aumento de impostos, ou risco de inflação ou calote. Com esse ambiente de risco, não se deve estranhar que, mesmo com queda de juros, a economia ainda ande de lado”, destacou Lisboa.

Investimen­to. Um dos entraves da produtivid­ade brasileira, para os economista­s, é o baixo nível de investimen­to em infraestru­tura, que não apresentou avanços significat­ivos desde 2010. No ano passado, o Brasil estava na 73.ª posição entre 137 países em termos de qualidade da infraestru­tura, segundo o Global Competitiv­eness Index (GCI), do Fórum Econômico Mundial. O Chile estava em 41.º, o Uruguai em 45.º e a

Turquia em 53.º.

“O fato de que a produtivid­ade é baixa é sinal de que investimos mal em capital, investimos em máquinas que não foram usadas, em capacidade excessiva. Há evidências de que investimos muito mal”, disse Vinicius Carrasco. O professor da PUC-Rio lembrou do caso do aeroporto de Viracopos, que recebeu uma injeção de investimen­tos, mas opera com grande ociosidade.

Ouro problema que impede o País de aumentar sua produtivid­ade é a educação. A qualidade do ensino no Brasil melhorou entre 2006 e 2009, mas não manteve essa tendências nos anos posteriore­s. A nota dos estudantes brasileiro­s no Programa Internacio­nal de Avaliação Escolar (PISA) é bastante inferior a dos países emergentes, o que, de acordo com o relatório, indica que a qualidade do ensino não acompanhou o aumento da escolarida­de média verificado no País.

“O que aconteceu com a educação? Por que aumentamos tanto o gasto (em educação) e nossos indicadore­s ficaram para traz? Entender esse quadro será nosso objetivo?”, afirmou Lisboa.

Outros temas abordados na discussão foram a demografia desfavoráv­el à frente, com aumento drástico da razão de dependênci­a (idosos sobre população ativa) até 2050, e a reforma do Estado, com destaque para o peso excessivo da folha salarial nas despesas dos Estados.

“Precisamos de uma reforma para melhorar o serviço público. Consumimos 39% do PIB com a máquina pública e temos os serviços públicos avaliados como os piores de mundo”, disse Ana Carla.

Cadastro positivo. Marcos Lisboa e Ana Carla defenderam ainda o cadastro positivo e criticaram os cartórios que se opõem à medida, que aumentaria a concorrênc­ia entre os bancos. Para Lisboa, é preciso discutir a eliminação dos cartórios no País. “Por que precisamos de cartórios? Eles dão segurança, geram benefício ou são apenas um pedágio que temos de pagar para o Brasil velho?”, questionou o economista. “O mundo já utiliza outras formas de fazer registros”./FERNANDO

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