Raquel pede ‘cuidado’ com delação de Palocci
Lava Jato. Procuradora-geral da República afirma que desconhece e pode contestar os termos da colaboração premiada do ex-ministro de Lula e Dilma; tema está no Supremo
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, disse ontem que o acordo de delação premiada firmado entre o exministro Antonio Palocci e a Polícia Federal precisa ser avaliado com “cuidado” e poderá ser contestado pelo órgão máximo do Ministério Público Federal. A possibilidade de a PF e a Polícia Civil firmarem acordos de colaboração está sob análise do Supremo Tribunal Federal. O tema é alvo de uma disputa entre policiais federais e procuradores que tem como pano de fundo o modelo de acordo defendido pelas instituições.
Em Paris, Raquel afirmou “desconhecer” os termos e a “extensão das cláusulas” do entendimento entre Palocci e a PF. Segundo ela, as negociações não foram realizadas na “jurisdição de Brasília”, o que obrigará a Procuradoria-Geral a estudar em detalhes o acordo para decidir o que fará a respeito.
“O meu gabinete, ou a instância cabível, certamente examinará esse documento”, disse a procuradora-geral. “Não examinei que documento é esse, como foi feito, qual a extensão das cláusulas. Tudo precisa ser avaliado com muito cuidado.”
O Supremo não concluiu um julgamento iniciado em dezembro do ano passado sobre o tema. A análise na Corte foi provocada em ação direta de inconstitucionalidade apresentada pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
A maioria dos ministros do Supremo votou por autorizar delegados de polícia a firmar acordos de colaboração, mas com limites à concessão de benefícios a delatores. Há divergência sobre a extensão do acordo e a necessidade de aval do Ministério Público para a eventual homologação da delação.
Dos sete integrantes da Corte que já votaram, seis defenderam a possibilidade de a PF fechar acordos. Além de Palocci, o marqueteiro Duda Mendonça e o ex-empresário Marcos Valério Fernandes de Souza (preso no mensalão) assinaram delação com a polícia.
‘Vigência’. Ontem, ministros do Supremo afirmaram que a lei que permite à PF fechar delações está “em plena vigência”. “Estamos julgando uma ação que ataca a lei, não houve implemento de liminar, então a conclusão é de que a lei está em plena vigência, que contém expressamente a delação na polícia”, disse o ministro Marco Aurélio Mello, que é relator do processo na Corte e já votou favorável à autonomia das polícias no caso.
“O que está valendo é a lei”, afirmou o também o ministro Alexandre de Moraes.
Ex-ministro dos governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, Palocci está preso em Curitiba desde setembro de 2016. Sua defesa iniciou uma negociação com o Ministério Público Federal no Paraná, base da Lava Jato, sem que se chegasse a um acordo.
Palocci foi condenado no ano passado a 12 anos e 2 meses de prisão por lavagem de dinheiro e corrupção ativa na negociação de contratos com a Odebrecht para aquisição de sondas do Estaleiro Enseada do Paraguaçu e da Sete Brasil. Durante o processo, Palocci afirmou ao juiz Sérgio Moro que o ex-presidente Lula, quando estava no cargo, deu seu aval a um “pacto de sangue” com a construtora Odebrecht, que envolveria o pagamento de R$ 300 milhões ao PT em propinas pelos contratos assinados.
A falta de finalização do caso no Supremo levantou uma discussão sobre a estabilidade dos acordos que vêm sendo firmados pela PF. Além de destacar que a lei continua em pleno vigor, Marco Aurélio lembrou que “qualquer acordo”, antes de ser homologado pela Justiça, “jamais é definitivo”.
“O acordo é a parte que beneficia o delator, jamais é definitivo. A lei remete o acordo ao órgão julgador, que põe em eficácia a delação”, disse o ministro à reportagem.