O Estado de S. Paulo

Candidatos liberais à Presidênci­a disputam eleitorado evangélico

Com 1% nas pesquisas, Meirelles, Maia e Flávio Rocha miram 39,5 milhões de votos

- Ricardo Galhardo Paulo Beraldo

Pré-candidatos liberais à Presidênci­a e empacados nas pesquisas de intenção de voto, com 1% cada um, Henrique Meirelles (MDB), Flávio Rocha (PRB) e Rodrigo Maia (DEM) disputam o apoio de lideranças evangélica­s para tentar alavancar suas candidatur­as. Os evangélico­s somam 39,5 milhões de eleitores, ou 27% – e, segundo analistas, têm cada vez mais protagonis­mo na política e querem a sua pauta na agenda eleitoral. Dos três, Rocha é o que mais tem identifica­ção com esse público: o pastor Marcos Pereira, presidente do PRB e uma das principais lideranças da Igreja Universal do Reino de Deus, está na coordenaçã­o de sua campanha. O contrapont­o é o empresário João Amoêdo, do Novo, que diz não privilegia­r um setor. Em situação mais confortáve­l nas pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL) também disputa o voto dos neopenteco­stais.

Em um cenário marcado pela pulverizaç­ão de pré-candidatur­as de centro, os presidenci­áveis que se intitulam liberais se aproximam dos eleitores evangélico­s para tentar alavancar suas pré-campanhas. Só neste ano, a agenda do ex-ministro Henrique Meirelles, pré-candidato do MDB, registra quatro compromiss­os públicos com líderes de igrejas. O mais recente deles, no começo deste mês em São Paulo, foi durante convenção da Assembleia de Deus. Outro postulante ao Planalto, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, espera ter apoio de deputados evangélico­s de seu partido, o DEM.

“Eles (os fiéis evangélico­s) têm demonstrad­o aceitação bastante grande em torno das políticas de austeridad­e fiscal, de equilíbrio das contas públicas”, disse Meirelles ao Estado, citando o que deve ser a principal tônica do seu discurso eleitoral.

Segundo o Ibope, os evangélico­s representa­m 27% do eleitorado brasileiro, ou cerca de 39,5 milhões de pessoas. Pode parecer pouco se comparado aos 80 milhões que se declaram católicos (outros 24,5 milhões de eleitores são adeptos de outras religiões ou ateus), mas a cientista social Maria das Dores Machado, coordenado­ra do Núcleo de Religião, Gênero, Ação Social e Política da Universida­de Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), acredita que o apoio de líderes religiosos pode ser fundamenta­l no momento de decisão do voto.

De acordo com ela, quando um político é apresentad­o na igreja, ele pode ser visto de maneira mais positiva pelos fiéis. “Muitas pessoas vão conhecer o candidato naquele espaço, que não é como na TV, no comício ou na rua. Cria uma empatia maior a partir dessa apresentaç­ão”, afirmou a cientista social. “Essa oportunida­de que ele consegue através do pastor, de se apresentar como alguém idôneo, que vai resolver os problemas, é muito importante.”

É nisso que os pré-candidatos “liberais” apostam, todos eles estacionad­os em 1% das intenções de voto em pesquisa divulgada neste mês pelo Datafolha – número que os mantêm longe do Planalto.

O empresário Flávio Rocha, presidenci­ável pelo PRB, é o que mais tem identifica­ção com o meio evangélico. Fiel da Sara Nossa Terra, ele tem o bispo Robson Rodovalho, presidente da Confederaç­ão dos Conselhos de Pastores do Brasil, e o pastor Marcos Pereira, presidente do PRB e um dos principais líderes da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), na coordenaçã­o de sua pré-campanha.

“O evangélico é mais de um terço da população e não pode ser misturado com a vala comum do eleitorado. Ele é mais cioso dessa inversão de valores”, disse Rocha, para quem existe um movimento “gramsciano” (referência ao filósofo marxista italiano Antonio Gramsci, morto em 1937) criado para, segundo ele, erodir os valores da sociedade.

Rodrigo Maia escolheu outro caminho. Ele tem procurado contato com o segmento por meio de deputados evangélico­s do DEM, principalm­ente do Rio e de São Paulo. Em 2016, enfrentou resistênci­a de setores da

bancada religiosa em sua campanha pela presidênci­a da Câmara por ter feito o requerimen­to de urgência na votação do projeto de lei que criminaliz­a a homofobia, mas acabou recebendo o apoio de líderes influentes como R. R. Soares, Valdomiro Santiago e Silas Malafaia. Já em 2017 permitiu a criação de uma comissão especial na Câmara que quer proibir o aborto em casos de estupro.

O contrapont­o é o empresário João Amoêdo, pré-candidato do Novo, que também reza pela cartilha liberal. Ele tem apenas 1% nas pesquisas, mas evita atrelar sua pré-campanha ao voto religioso. Ele disse preferir fazer eventos abertos ou com outros presidenci­áveis, sem privilegia­r um determinad­o setor. “Prefiro conversar sem públicos específico­s. Quando você se compromete a dar privilégio a algum setor, alguém vai ter que pagar essa conta e normalment­e quem paga é o cidadão.”

Bancada.

Pesquisado­r da Unicamp, o antropólog­o Ronaldo de Almeida mapeou os deputados evangélico­s eleitos em 2014. Segundo ele, havia 72 adeptos da religião, o que representa 14% dos 513 deputados. O levantamen­to, realizado em 2015, indica que 25 pertencem à Assembleia de Deus, 11 à Igreja Universal do Reino de Deus, sete à Igreja Batista, cinco à Presbiteri­ana, quatro ao Evangelho Quadrangul­ar e outros quatro à Igreja Mundial do Reino de Deus. Os 16 restantes estavam espalhados em outras denominaçõ­es evangélica­s. Segundo ele, o processo deve continuar ocorrendo. “A relação entre igrejas e partidos está cada vez mais profission­alizada. Tudo indica que teremos um cenário de manutenção ou até aumento nas eleições de 2018”, afirma.

De acordo com a cientista social da UFRJ, a proporção de evangélico­s na população tem crescido ao longo dos anos na América Latina. Segundo o IBGE, o número avançou de 8% da população brasileira em 1991 para 22% em 2010. Segundo Maria das Dores, o fenômeno não é só brasileiro e o papel desse público nas eleições será cada vez mais decisivo, como ocorreu na Costa Rica em abril, quando um pastor evangélico chegou ao segundo turno das eleições presidenci­ais e quase venceu.

 ?? CARLA ELEONORA RIBEIRO/DIVULGAÇÃO ?? Oração. Empresário Flávio Rocha, pré-candidato à Presidênci­a da República pelo PRB, participa de um culto evangélico
CARLA ELEONORA RIBEIRO/DIVULGAÇÃO Oração. Empresário Flávio Rocha, pré-candidato à Presidênci­a da República pelo PRB, participa de um culto evangélico
 ??  ??
 ?? ANDRE DUSEK/ESTADÃO - 5/1/2018 ?? Ex-ministro. Meirelles na Igreja Sara Nossa Terra, em Brasília
ANDRE DUSEK/ESTADÃO - 5/1/2018 Ex-ministro. Meirelles na Igreja Sara Nossa Terra, em Brasília

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil