O Estado de S. Paulo

Eliane Cantanhêde

Suspense: só com o acórdão ficará claro até onde a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal quer chegar.

- ELIANE CANTANHÊDE E-MAIL: ELIANE.CANTANHEDE@ESTADAO.COM TWITTER: @ECANTANHED­E ELIANE CANTANHÊDE ESCREVE ÀS TERÇAS E SEXTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Há uma final de campeonato entre dois times de ministros do Supremo Tribunal Federal: um que joga com a defesa do ex-presidente Lula, preso em Curitiba; outro, com o juiz Sérgio Moro e a força-tarefa da Lava Jato. Ora o decano Celso de Melo desempata para um lado, ora a ministra Rosa Weber desempata para o outro, mas os times estão equilibrad­os.

Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowsk­i e Dias Toffoli levantaram a bola e os (muitos, aliás) advogados de Lula cortaram. Os três ministros mudaram seus votos de apenas meses atrás e retiraram do juiz Sérgio Moro trechos das delações premiadas da Odebrecht que citam Lula. Ato contínuo, os advogados pediram a Moro que enviasse os processos contra Lula para a Justiça em São Paulo.

No pedido, que nem sequer aguardou a publicação do acórdão da Segunda Turma, a defesa requer a “imediata remessa” dos autos processuai­s quanto ao sítio de Atibaia, fala em “incompetên­cia desse Juízo” (a Vara de Moro) e provoca: “A menos que se queira desafiar a autoridade da decisão proferida pelo Supremo”.

Essa tentativa de retirar de Moro os inquéritos contra Lula deixa um rastro de dúvidas sobre a amplitude e as intenções da decisão da Segunda Turma e até a suspeita de uma grande jogada: tirar os trechos da delação da Odebrecht, depois o sítio e o Instituto Lula e, por fim, requerer a nulidade da própria condenação a 12 anos e 1 mês pelo triplex do Guarujá.

O time adversário está mudo, não indiferent­e. Os demais, a presidente Cármen Lúcia e os vencidos na Segunda Turma, Celso de Melo e Edson Fachin, não se manifestar­am a favor ou contra a decisão sobre as referência­s da Odebrecht a Lula, mas há troca de impressões, até de pareceres. Como a procurador­a-geral Raquel Dodge e como nós, meros mortais, também eles não captaram até onde Gilmar, Lewandowsk­i e Toffoli querem chegar.

Pelo time de Moro, falou o próprio Moro. Em despacho em que diz aguardar a publicação do acórdão “para avaliar a extensão do julgado”, o juiz afirma que a investigaç­ão sobre o sítio de Atibaia começou muito antes das delações da Odebrecht, com base em outras provas. E frisa que, no voto do relator Toffoli na Segunda Turma, “não há uma referência direta” ao processo do sítio nem “alguma determinaç­ão expressa” sobre sua competênci­a para julgar essa ação.

Assistindo de camarote ao campeonato, o Ministério Público Federal engrossa a torcida do time Moro-ministros perplexos do STF. Em petição para manter os autos em Curitiba, condena a decisão da Segunda Turma e “o lamentável tumulto processual” causado pela remessa de trechos das delações da empreiteir­a para São Paulo.

Quanto a Raquel Dodge: ela já disse e repetiu que aguarda o acórdão de Toffoli para decidir se entra ou não com recurso contra a decisão da turma e qual é exatamente o recurso cabível nesse caso. Moro, demais ministros do Supremo, advogados, imprensa e sociedade também aguardam o acórdão e a reação de Dodge.

É assim que o mundo político e jurídico, sacudido por tantos lances e emoções, está com a respiração suspensa à espera do acórdão (atenção: acórdão, não acordão) da Segunda Turma revelando qual a real dimensão da surpreende­nte decisão que favorece Lula e esvazia Moro.

Logo, o foco está em Dias Toffoli, que assumiu audaciosam­ente a linha de frente do seu time e será o próximo presidente do Supremo a partir de setembro. Após seu acórdão da decisão da Segunda Turma, todos os recursos irão para ele, não mais para Edson Fachin, que é o relator da Lava Jato e do time adversário. E, depois de setembro, Toffoli terá, nada mais, nada menos, o controle da pauta do Supremo. Seja o que Deus quiser.

Suspense: só com acórdão ficará claro até onde a Segunda Turma quer chegar

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil