O Estado de S. Paulo

Documentos compromete­m Humala

Justiça da Suíça envia ao Peru novas evidências do esquema de corrupção montado pelo ex-presidente que envolve empresas do Brasil

- Jamil Chade CORRESPOND­ENTE / GENEBRA

Documentos da Justiça da Suíça revelam que o ex-presidente do Peru Ollanta Humala é suspeito de montar um esquema de corrupção usando financiame­nto ilegal de campanha e enriquecim­ento de parentes. Entre as várias fontes de renda, ele chegou a receber mesada de uma empresa brasileira, cujo nome é mantido em sigilo.

De acordo com o Tribunal Federal da Suíça, parte do dinheiro foi destinado a suas campanhas à presidênci­a, mas não foi declarada. Outra parcela foi usada pela família Humala para comprar imóveis e financiar gastos pessoais. Humala foi o primeiro ex-presidente preso por conta das revelações da Lava Jato, fatos que ele sempre contestou.

Para os procurador­es peruanos, porém, o caso ganhou força depois de uma longa batalha judicial que resultou na transferên­cia de documentos da Suíça para Lima. No início de abril, o Ministério Público suíço repassou centenas de documentos e extratos bancários que envolvem Humala e sua mulher, Nadine Heredia. As contas eram da irmã do ex-presidente, Ivoska Humala. Apesar de reconhecer a existência de três contas, ela insiste que o dinheiro não tem qualquer relação com Ollanta.

Os procurador­es peruanos mostraram aos suíços que Ivoska e Nadine trocavam informaçõe­s por e-mail sobre valores depositado­s. Os dados chegaram a Lima dois anos e meio após a primeira solicitaçã­o. Em razão de recursos apresentad­os pelos por advogados da irmã do presidente, os documentos só agora foram liberados e serão fundamenta­is na acusação contra o ex-presidente.

Segundo a Justiça suíça, a investigaç­ão se refere a “irregulari­dades no financiame­nto de campanhas de 2006 e 2011”. Humala saiu derrotado em 2006 e venceu em 2011. Para os suíços, a conexão entre a irmã do presidente e o objeto da investigaç­ão está clara. Por isso, os dados foram liberados.

Os documentos mostram como Ollanta e Nadine declararam “fundos de origem ilegal como contribuiç­ões à campanha eleitoral”. “Uma parte das contribuiç­ões foi desviada por Nadine para uso pessoal”, indica o documento. Há indícios de que “parte do dinheiro” vinha da extração informal de ouro, doações do governo venezuelan­o e de empresas brasileira­s, que ganhavam contratos milionário­s.

De acordo com os documentos, parte do dinheiro usado em campanhas não foi declarado ao Escritório Eleitoral Nacional do Peru. “Outra parte dessas contribuiç­ões foi utilizada para a compra de imóveis e transferid­a para contas de empresas especialme­nte criadas.

Uma das empresas brasileira­s citadas é a Odebrecht, suspeita de ter feito pagamentos “para as campanhas eleitorais presidenci­ais do partido (de Humala) em 2006 e 2011”. “Não se pode descartar a possibilid­ade de que (os pagamentos) tenham sido feitos para favorecer a empresa em uma etapa posterior de licitações públicas.”

Essa não é a primeira vez que a Odebrecht é citada no esquema de corrupção no Peru. Jorge Barata, ex-representa­nte da construtor­a no país, revelou que, em 2010, Marcelo Odebrecht deu ordens para que a empresa colocasse dinheiro na campanha de Humala. Barata, indicou que quem fez o pedido foi o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No total, Barata estimou que US$ 3 milhões foram para a campanha de Humala. Consultada, a Odebrecht declarou apenas que “está colaborand­o com a Justiça” e “implantou um siste- ma para prevenir, detectar e punir desvios ou crimes”.

No entanto, a Odebrecht não é a única citada. A Justiça suíça diz que, em 2008, membros do partido de Humala pediram propina a outra empresa brasileira – cujo nome é mantido em sigilo nos documentos. O dinheiro era enviado como “contribuiç­ão mensal de US$ 10 mil”. “Mais tarde, essas contribuiç­ões foram registrada­s como pagamentos por serviços de consultori­a, que nunca foram realizados”, constatam os suíços.

Chávez. Nos documentos, o tribunal suíço faz referência­s à ajuda que o governo de Hugo Chávez prestou a Humala, ainda em 2006, em sua primeira eleição. “A campanha presidenci­al em 2006 também recebeu apoio financeiro do então presidente venezuelan­o, Hugo Chávez”, segundo a corte. Apesar de não revelar os valores, ela indica que os pagamentos ocorreram por meio de uma empresa. “Assim, há a suspeita de que fundos públicos da Venezuela tenham sido desviados para tal fim.”

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ENRIQUE CASTRO/REUTERS Em Lima. Estudantes colocam fogo em cartaz de Humala

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