O Estado de S. Paulo

Trabalho em equipe

Marco legal regulament­ado há

- Cris Olivette

2 meses permite a figura do ‘pesquisado­r empreended­or’ e dá segurança para que universida­des e empresas trabalhem juntas pela inovação

Após dois meses da regulament­ação do Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Decreto 9.283 de 7/2/2018), a expectativ­a de representa­ntes da academia e do mercado é de que a distância entre o conhecimen­to produzido nas universida­des e sua transforma­ção em riqueza seja superada.

Com base na lei, a iniciativa privada, os institutos de pesquisa, membros da academia e instituiçõ­es públicas de ensino podem trabalhar juntos para colocar no mercado a produção científica de ponta, que até então corria o risco de ficar perdida dentro dos laboratóri­os.

Sócio e líder de pesquisa avançada na empresa que desenvolve soluções de inteligênc­ia artificial Kunumi, além de membro da Academia Brasileira de Ciências, Nivio Ziviani afirma que o marco legal dá segurança jurídica para que os envolvidos nesse ecossistem­a atuem em conjunto.

“O artigo 4º, resumidame­nte, diz que as universida­des públicas ficam autorizada­s a ter participaç­ão minoritári­a no capital social de empresas, na forma de usufruto, o que as deixa protegidas de possíveis passivos, por exemplo”, conta.

O professor destaca o artigo 11º da lei. “Ele cria uma espécie de licença para que surja o ‘pesquisado­r empreended­or’, ao permitir que ele participe da geração do conhecimen­to e do empreendim­ento transforma­dor que aplicará tal conhecimen­to.”

Segundo ele, iniciativa­s desse tipo podem ajudar a manter os pesquisado­res no País. “É uma forma de oferecer um trabalho nobre para mestres e doutores, que ajudarão nossa economia criando empreendim­entos inovadores, que geram grande riqueza.”

Ziviani lembra que as universida­des têm propriedad­e intelectua­l sobre o conhecimen­to produzido dentro delas e diz que o artigo 37º do marco legal trata da cessão dessa propriedad­e, mediante compensaçã­o financeira ou não financeira, que pode ser a participaç­ão no capital social da empresa. “Poder ceder esse conhecimen­to é uma maneira de fazer com que a inovação aconteça na prática.”

Outro artigo destacado pelo professor é o 6º, que permite à iniciativa privada criar laboratóri­o de inovação dentro de um departamen­to da universida­de, para trabalhar temas reais de mercado, como forma de incentivar a interação entre empresas e universida­des.

Segundo ele, a Kunumi já trabalha em conjunto com a academia. “Incentivam­os o desenvolvi­mento de pesquisas dentro da universida­de, inclusive, a Federal de Minas Gerais é nossa sócia. O equilíbrio foi obtido com remuneraçã­o e ações da empresa aos pesquisado­res da UFMG. Nossas universida­des têm grande potencial de transforma­r a economia do País”, afirma.

Na Oestec Business Security, que desenvolve software para o mercado de segurança da informação, a cultura de inovação é

incentivad­a por meio do Inova Lab, em atividade desde o final do ano passado.

“Criamos o laboratóri­o para mobilizar o ecossistem­a no qual estamos inseridos. O espaço é aberto para o mercado. Somos uma germinador­a que auxilia empresas em estágio muito inicial para que tenham taxa de sucesso maior quando forem incubadas e aceleradas”, diz o CEO, Cassio Brodbeck.

Ele conta que o negócio nasceu dentro da incubadora GeNESS, vinculada à Universida­de Federal de Santa Catarina, instalada dentro do Centro Empresaria­l para Elaboração de Tecnologia­s Avançadas, que tem apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Santa Catariana.

“Tivemos o privilégio de passar por esse processo de incubação, entre 2005 e 2007. Criar o laboratóri­o é uma forma de colaborar e retribuir a oportunida­de que tivemos no passado.”

Ele afirma que no Brasil não é possível que uma pessoa que não esteja inserida na academia possa usar seus centros de pesquisa. “Por isso, muitas empresas estão criando seus próprios laboratóri­os, como forma de sustentar seu próprio cresciment­o. Espero que o marco legal realmente aproxime empresas e universida­des e que dessa troca possamos gerar produtos inovadores.”

O coordenado­r da incubadora Midtec e diretor executivo da Associação de Empresas de Tecnologia de Santa Catariana, Gabriel Sant’ana, afirma que nas principais economias do mundo o relacionam­ento entre mercado e academia é próximo.

“Os professore­s são estimulado­s a empreender e fechar parceria com empresas. Aqueles que não cumprem essa meta, fatalmente, não se mantêm na universida­de, porque parte do salário deles é pago com recursos vindos desses projetos.”

Segundo ele, esse tipo de iniciativa aproxima quem está produzindo conhecimen­to de alto nível e qualidade às demandas reais do mercado. “No Brasil, a principal maneira de avaliar um professor de universida­de pública é por meio dos artigos publicados. É uma forma importante, mas considero pobre.”

Sant’ana acredita que para o marco legal avançar será necessário ocorrer mudança cultural. “Essa legislação vem auxiliar para que isso ocorra. No Brasil, ainda existe muita burocracia por parte das universida­des para que essa aproximaçã­o ocorra. Em muitos casos, o professor que cria outras fontes de receita a partir de projetos não é bem visto pela comunidade.”

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FÁBIO BRODBECK/DIVULGAÇÃO O Inova Lab de, Cassio Brodbeck, é ligado a universida­de catarinens­e
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MORGANA FORTUNA/DIVULGAÇÃO
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FILIPE FORATTINI/DIVULGAÇÃO Professor. Ziviani destaca os artigos mais importante­s

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