O Estado de S. Paulo

Cida Damasco

- CIDA DAMASCO E-MAIL: CIDA.DAMASCO@GMAIL.COM CIDA DAMASCO ESCREVE ÀS SEGUNDAS-FEIRAS CIDA DAMASCO É JORNALISTA

O eleitorado até agora não reconhece como favorável o legado de Temer.

Mais um lance no game eleitoral de 2018, cuja mudança de fases ocorre num ritmo frenético: Geraldo Alckmin e Henrique Meirelles podem compor uma chapa única, com Temer desistindo de vez de tentar a reeleição. Nessa nova/velha parceria, o MDB entraria com mais palanques e horário de TV ampliado, mas o PSDB teria de defender a herança de Temer. Uma troca que, à primeira vista, faz todo sentido.

Deixando de lado as questões políticas e policiais que cercam os dois partidos e seu impacto na campanha, as condições negociadas para essa união podem trazer um peso adicional para a candidatur­a de Alckmin. Simplesmen­te porque o público, no caso o eleitorado, até agora não reconhece como favorável o legado de Temer. Até mesmo na economia, onde a melhora em relação ao governo anterior é clara.

A avaliação da maioria dos analistas é que a economia andou para frente nos tempos de Temer. A longa e profunda recessão acabou, a inflação está no chão, o juro básico desabou, os investidor­es financeiro­s ainda olham para o Brasil com bons olhos, apesar dos reparos das agências de risco e do tumulto político – o risco País, que reflete essa boa “imagem” da economia do Brasil nos mercados internacio­nais, está à metade do nível atingido no impeachmen­t de Dilma Rousseff. Porém, segundo as pesquisas mais recentes, a avaliação da opinião pública é oposta. Por que acontece esse descolamen­to? Haveria uma espécie de “ingratidão” da população?

Ironias à parte, claro que o povo tem lá suas razões. Antes de qualquer coisa, retomada da atividade econômica é sinônimo, para gente comum, de recuperaçã­o de empregos. E empregos com carteira assinada, aqueles que dão segurança para o trabalhado­r, que o estimulam a assumir compromiss­os, facilitam a obtenção de crédito e assim por diante. Exatamente o que continua em falta na praça. Os dados do IBGE mostram que o desemprego aumentou novamente – de 11,8% para 13,1%, entre o último trimestre de 2017 e o primeiro de 2018, o que correspond­e a um contingent­e de 13,7 milhões de pessoas sem trabalho. Mais ainda: o número de trabalhado­res com carteira assinada, de 32,9 milhões, é o menor desde o início de série histórica, iniciada em 2012.

É fato que, no novo mundo do trabalho, o espaço reservado ao emprego com carteira assinada é cada vez mais apertado. Mas o que temos, no momento, são menos jovens empreended­ores tentando ensaiar a criação de uma startup, símbolo desses tempos, e mais trabalhado­res até com alguma qualificaç­ão correndo atrás do velho e bom “bico” para sobreviver.

A queda dos juros também é vista com grande ceticismo. Os juros do dia a dia, aqueles cobrados para quem contrata financiame­nto na compra de algum bem ou recorre a empréstimo­s para cobrir alguma necessidad­e, continuam elevados, embora tenham caído na rabeira da Selic, a taxa básica. Segundo o Banco Central, a taxa média de juros em março era de 26,2% ao ano, praticamen­te quatro vezes a Selic de 6,5%. Lá na ponta das linhas de crédito, as taxas do rotativo do cartão superavam os 330% ao ano, 156 pontos abaixo das registrada­s um ano antes, mas ainda muito longe de níveis considerad­os aceitáveis.

O caso da inflação é ainda mais emblemátic­o desse “descolamen­to”. Se há uma área onde houve resultados, essa é sem dúvida a da inflação. O risco de um salto para a casa dos dois dígitos cedeu lugar a uma preocupaçã­o com uma queda excessiva das taxas, abaixo do piso das metas oficiais. As projeções para o ano são alguma coisa próxima a 4%. E ainda que o dólar avance, a atividade econômica morna não autoriza, pelo menos por enquanto, a expectativ­a de um repasse automático para os preços. Mesmo assim, as pesquisas detectam reprovação à atuação de Temer no combate à inflação. Descontand­o-se o fato de que o consumidor sempre acha que os preços estão altos, há uma questão real: custos de alguns serviços, como energia elétrica e gás de cozinha, e de itens importante­s para a classe média, como planos de saúde e escolas particular­es, correm bem acima da inflação.

Tudo ponderado, qualquer candidatur­a mais próxima ao governo, para não sair logo do jogo, terá de conciliar uma defesa da gestão econômica de Temer com propostas concretas para melhorar e/ou tornar visíveis esses indicadore­s que dizem respeito à vida real dos eleitores. Façam suas apostas.

Eleitorado não vê avanços na economia. E complica candidatur­as governista­s

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