Craque é essencial
Otítulo da crônica tem a ver com Cristiano Ronaldo, Messi, Romário, Rivaldo, Zico, Maradona, Garrincha, Cruyff, Pelé e milhares de craques, de hoje, ontem e sempre, daqui e de lá. Claro que, de cara, contém uma constatação óbvia, não lhe parece? Também para mim e para qualquer um que goste do futebol a presença em campo do fora de série continua a ser fator de atração, fascínio e desequilíbrio. No entanto, o tema merece reflexões, pois de uns tempos para cá essa verdade passou a ser atacada.
Uma geração de teóricos, respaldados em análises com verniz científico, decidiu detectar no empenho coletivo (quase) o único caminho para o sucesso de uma equipe. O individual ficou em segundo plano, na visão de quem enxerga o joguinho de bola como uma equação de Física Quântica, um problema insolúvel, de torrar cérebros comuns e à altura só de mentes como as de Einstein ou Hawking.
Há tantos números, estatísticas e gráficos para comporem o raio-X de uma partida que fica a impressão de que jogadores são robôs, incapazes de iniciativas, erros, acertos, lampejos e improvisação, como você e eu. Cada um tem funções específicas, da execução das quais dependem vitórias ou insucessos. Sei lá, acho que tem gente que sonha com máquinas ou réplicas humanas a desfilarem nos gramados, pois assim se atingirá a perfeição. O futebol do futuro será um problema de Matemática; ganhará o time mais competente para encontrar as incógnitas.
Mas eis que, no meio desse papo furado, Jurgen Klopp tocou no assunto com sensatez e simplicidade. Numa das rotineiras entrevistas de véspera de jogo, o alemão treinador do Liverpool foi ao centro da questão: “O futebol é coletivo, mas os craques são importantes, porque saem do lugar-comum.” Bingo! Ou “cinqüina”, como se dizia no Bom Retiro, quando alguém acertava os números da tômbola nas festas da paróquia de Santo Eduardo.
Não se trata de negar a importância do conjunto; seria postura tola. Nenhum dos gênios citados no primeiro parágrafo entrou em campo sozinho e fez a farra em cima dos adversários. Todos têm ou tiveram suporte de companheiros de vários níveis – dos habilidosos, dos práticos, dos carregadores de piano, dos menos talentosos porém taticamente imprescindíveis, dos xerifes, dos maluquinhos e esquentados. E, até, de um ou outro perna de pau. Um time de futebol, miniatura da sociedade, reúne tipos variados, como topamos na nossa vida cotidiana.
No entanto, precisa do sujeito especial, daquele de cuja inventividade surgem maravilhas que desmontam retrancas, que arrebatam plateias, que arranquem aplausos e viram manchetes mundiais. Enfim, que justifiquem a magia do jogo e sua imprevisibilidade.
O Santos era magnífico nos anos 60 e 70. Tornou-se mítico com Pelé. O Botafogo tinha gente boa, e um Garrincha fenomenal. O Napoli dos anos 80 contava com atletas de primeira linha, e um Maradona irrefreável. O Barcelona é uma congregação de solistas, e tem Messi como virtuose. O craque altera o curso da História.
Assim é no basquete, no vôlei, no atletismo e na natação (por equipes). Assim é em orquestras, bandas, agências de publicidade, numa companhia teatral, num hospital, numa banca de advogados. Num restaurante! No nosso dia a dia. Vamos parar com essa onda de querer reduzir o astro a um algarismo.
A constatação é óbvia, mas há quem prefira, no futebol atual, ações mecânicas e robotizadas
Gigante! O Real Madrid garantiu ontem, com os 2 a 2 com o Bayern, a 16.ª presença em decisão da Liga dos Campeões da Europa. Tem 12 títulos, perdeu em 62 (Benfica), 64 (Inter) e 81 (Liverpool). Assim como há muitos jogadores e só um Rei Pelé, há milhares de clubes pelo planeta, porém apenas um com a majestade do Real Madrid. Um espanto!