O Estado de S. Paulo

Empresas buscam alternativ­as a BNDES para financiar projetos em infraestru­tura

Crédito. Com queda na taxa de juros, captação no mercado de capitais tem conseguido competir em pé de igualdade com o banco de fomento, tanto em prazo como em taxas; BNDES continuará, no entanto. sendo uma das principais fontes de financiame­nto do País

- Renée Pereira Mônica Scaramuzzo Luciana Dyniewicz

Depois de anos dependendo quase que exclusivam­ente do Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social (BNDES), as empresas começam a buscar novas alternativ­as para financiar seus projetos de infraestru­tura, sem subsídio estatal. Com a queda da taxa de juros, a inflação controlada e a nova política do banco de fomento, as captações no mercado de capitais têm conseguido competir em igualdade com as modalidade­s públicas, algo inimagináv­el há dois anos.

Nesse ambiente, já tem sido possível financiar 100% de projetos de infraestru­tura sem nenhum centavo do BNDES. No mês passado, por exemplo, o fundo de investimen­to Pátria levantou R$ 1 bilhão no mercado para bancar as obras de uma concessão rodoviária arrematada em 2017. A Alupar, empresa de energia elétrica, analisa algumas modalidade­s de captação privada para financiar projetos de transmissã­o, que vão somar investimen­tos de R$ 5 bilhões em quatro anos e meio.

Esse movimento tem ocorrido tanto pela queda da taxa Selic, hoje em 6,75% ao ano, como pela adoção da Taxa de Longo Prazo (TLP), que substituiu a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) nos contratos do BNDES. Sem o subsídio do Tesouro Nacional, que perdurou durante décadas nos juros cobrados pelo banco estatal, a taxa hoje está em torno 7,3% – o que dá competitiv­idade nas demais modalidade­s do mercado. Na outra ponta, estão investidor­es de títulos públicos que antes eram remunerado­s a 14% ao ano e agora precisam buscar alternativ­as para melhorar a rentabilid­ade de suas aplicações.

“De um lado temos fundos e investidor­es institucio­nais querendo tomar crédito de longo prazo. Do outro, uma indústria de capitais com uma dinâmica melhor”, afirma o diretor da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), José Eduardo Laloni. Nesse ambiente, as debêntures viraram uma das grandes apostas das empresas para levantar recursos.

Esses papéis já começaram a atrair investidor estrangeir­o e devem ganhar atenção dos fundos de pensão, que têm mais de R$ 1 trilhão em títulos públicos, para cumprir as metas atuariais, diz o presidente do Banco Fator, Gabriel Galípolo. No primeiro trimestre deste ano, houve um aumento de 75% no volume de debêntures emitidas no País. O setor de infraestru­tura foi responsáve­l 45% das emissões.

“A queda dos juros abre espaço para uma série de ferramenta­s, que estamos estudando para financiar os projetos dos próximos cinco anos”, diz o diretor financeiro da Alupar, Marcelo Costa. “O importante é que agora não há uma solução única. Podemos ter uma parte de capital e outra de financiame­nto.”

Além das debêntures, bonds (títulos no exterior) e empréstimo­s de órgãos multilater­ais, como Banco Mundial, e agências de crédito à exportação (Ecas) devem ganhar espaço no mercado, afirma Edson Ogawa, responsáve­l pela área de project finance do Santander. Segundo ele, até 2017, 80% dos volumes financiado­s em infraestru­tura eram do BNDES, que assumia o risco da operação.

Os bancos comerciais atuavam como repassador­es do banco de fomento e financiado­res dos chamados “pontes” – empréstimo de médio e curto prazo que cobre o período até a concessão do crédito de longo prazo. A expectativ­a é que o apetite por essa modalidade aumente daqui para frente, prevê o responsáve­l pela área de project finance do Itaú BBA, Marcelo Girão. Ele vê o banco mais ativo nos últimos meses, sobretudo em energia elétrica. “Embora não seja papel dos bancos ser financiado­r de projetos de longo prazo, as instituiçõ­es privadas estão assumindo o risco de capital na estruturaç­ão de debêntures de infraestru­tura”, disse.

Outra forma de os bancos atuarem será como investidor, comprando debêntures. “As perspectiv­as para o ano de 2018 são de maior participaç­ão dos bancos privados em projetos de infraestru­tura, diante de um estoque de projetos de geração e transmissã­o de energia e novos projetos de logística (aeroportos, rodovias e mobilidade urbana) que foram licitados em 2017-2018 e que demandarão soluções de financiame­nto de curto e longo prazos”, afirma Rui Gomes da Silva Junior, responsáve­l pela área de project finance do banco de investimen­to do Bradesco, o Bradesco BBI.

Juliane Yung, responsáve­l por “corporate banking” no Banco MUFG Brasil (antigo Banco de Tokyo-Mitsubishi UFJ) afirma que o espaço deixado pelo BNDES é uma questão aberta. O MUGF analisa a possibilid­ade de trabalhar no País com “project bonds”, espécie de título de crédito para grandes obras de infraestru­tura com vencimento entre 20 e 30 anos.

Os executivos, porém, fazem questão de destacar que o BNDES continuará sendo uma das principais fontes de financiame­nto do País. Só que agora terá companhia de peso em prazos e custos. A diretora do banco de fomento Marilene Ramos concorda: “Continuare­mos sendo o principal financiado­r de infraestru­tura, mas não seremos os únicos”. Segundo ela, além de financiado­r, o banco também incentiva múltiplos instrument­os para financiar o mercado.

A instituiçã­o criou um fundo de investimen­to que vai comprar debêntures de energia renovável. A captação foi de R$ 500 milhões, sendo que o banco se compromete a adquirir 50% das cotas do fundo. Outros fundos estão nos planos do banco.

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DU AMORIM/GOVSP-17/7/2015 Sem o BNDES. Fundo Pátria levantou R$ 1 bi no mercado para bancar obras das Rodovias do Centro-Oeste Paulista
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FONTES: BNDES E ANBIMA INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO

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