O Estado de S. Paulo

Faltou trabalhado­r

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Não surpreende que os trabalhado­res tenham ignorado solenement­e a convocação das centrais sindicais para defender Lula no Primeiro de Maio.

A Polícia Militar do Paraná informou que cerca de 5 mil pessoas estiveram presentes naquela que prometia ser uma das maiores mobilizaçõ­es sindicais da história do País. Pode-se dizer que havia mais sindicalis­tas e políticos que trabalhado­res no evento do Dia do Trabalhado­r em Curitiba, o primeiro a reunir sete centrais sindicais.

A ideia era fazer uma poderosa demonstraç­ão de força em apoio ao ex-presidente Lula, preso em Curitiba por corrupção e lavagem de dinheiro, mas o ato acabou confirmand­o aquilo que já se intuía há muito tempo: sem o dinheiro da contribuiç­ão sindical e, consequent­emente, sem capacidade de contratar artistas populares a peso de ouro e de sortear prêmios valiosos, as centrais carecem de argumentos realmente sólidos para convencer o trabalhado­r a sair de casa e participar de um protesto no feriado do Primeiro de Maio. E dificilmen­te o apelo à defesa de Lula da Silva seria capaz de mobilizar esses trabalhado­res, uma vez que se trata de um corrupto condenado e todos sabem de quem era o dinheiro que transitou nas tenebrosas transações. A minguada vigília petista por Lula em Curitiba, que certamente se esvaziará ainda mais à medida que avançar o tradiciona­lmente rigoroso inverno da capital paranaense, é prova disso.

Portanto, resta contar somente com os manifestan­tes profission­ais, aqueles que recebem lanche e transporte para engrossar os comícios político-sindicais e aparecer em fotos tiradas convenient­emente em ângulos fechados, para dar a impressão de multidão onde só há um punhado de gatos pingados. Como há cada vez menos dinheiro até para o pão com mortadela, é necessário cada vez mais caprichar na retórica retumbante contra o “grande capital” e os “golpistas” e falar em “milhares de manifestan­tes” onde há apenas algumas dezenas de incautos arregiment­ados para simular multidão.

Não se chega a esse estado de coisas sem grande esforço. Graças à famigerada contribuiç­ão sindical, que arrancava dos trabalhado­res vultosos recursos para financiar a dolce vita dos que se escoram no trabalho alheio, os sindicatos tornaram-se poderosas máquinas a serviço de partidos – sendo a CUT, braço do PT, apenas a mais vistosa delas.

Dessa maneira, raros eram os trabalhado­res que se sentiam realmente representa­dos por essas organizaçõ­es, pois as reivindica­ções trabalhist­as dali emanadas sempre foram mero pretexto para sustentar uma agenda explicitam­ente político-partidária. A título de defender o emprego e os “direitos trabalhist­as”, os sindicatos sabotaram todas as tentativas de modernizaç­ão do mercado de trabalho nacional, sem falar em sua sistemátic­a campanha contra a reforma da Previdênci­a, contribuin­do decisivame­nte para ampliar a crise e, consequent­emente, o desemprego. Mas, afinal, os desemprega­dos nunca foram a preocupaçã­o desses ergofóbico­s.

Por tudo isso, não surpreende que os trabalhado­res tenham ignorado solenement­e a convocação das centrais sindicais para defender Lula, como já haviam ignorado chamamento­s semelhante­s para defender o governo de Dilma Rousseff.

Ninguém parece ter se sensibiliz­ado com a promessa de uma mobilizaçã­o “histórica”, na “luta pela democracia e pelo direito de Lula de ser candidato”, conforme bravateou um dos sindicalis­tas quando o ato unificado foi anunciado. Tampouco causou sensação o objetivo de “sinalizar ao grande capital e à direita que a esquerda e o campo popular vão vencer as eleições e revogar todo esse lixo que o golpe quer impor sobre o povo brasileiro”, segundo disse outro sindicalis­ta.

Nem mesmo um apelo do próprio Lula foi capaz de comover a companheir­ada. Em mensagem divulgada na véspera do Dia do Trabalhado­r, o ex-presidente disse que o “Primeiro de Maio unificado”, em referência à mobilizaçã­o de diversas centrais sindicais, trazia “esperança” que “nos fortalece para superarmos o triste momento presente e para construir um futuro de paz e prosperida­de”.

São poucos os trabalhado­res que se dispõem a servir de massa de manobra para objetivos políticos tão explícitos. Lula já não vale um show sem graça.

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