O Estado de S. Paulo

Fortalecim­ento do dólar pressiona economia de países emergentes

Câmbio. Moedas de países em desenvolvi­mento perdem força com perspectiv­a de alta maior dos juros nos EUA, o que pode levar, por exemplo, ao aumento da inflação; no caso brasileiro, incertezas em relação ao cenário eleitoral podem gerar depreciaçã­o adicion

- / ANA PAULA RAGAZZI, ALTAMIRO SILVA JUNIOR, DOUGLAS GAVRAS e LUCIANA DYNIEWICZ

O fortalecim­ento do dólar nos últimos meses começa a levantar preocupaçõ­es em relação aos impactos nas economias de países emergentes, mais sensíveis ao humor do mercado global. Para analistas, países como Argentina, Turquia, Rússia e também o Brasil podem ser os mais afetados pelo movimento.

São esses os países onde o dólar mais vem se valorizand­o (ver quadro), no rastro da expectativ­a de um aumento maior dos juros nos Estados Unidos, por conta do aqueciment­o da economia – o que torna o mercado americano mais atrativo para os investidor­es. No Brasil, o dólar atingiu ontem R$ 3,5518, o maior valor desde junho de 2016, o que levou o Banco Central a se decidir pela intervençã­o no mercado de câmbio (ver página B4).

“Os emergentes acabam mesmo sentindo mais os movimentos do exterior. Quando os Estados Unidos ‘espirram’, os mercados emergentes ‘ficam gripados’”, diz David Beker, chefe de economia e estratégia do Bank of America Merrill Lynch no Brasil. “No caso brasileiro, a gente acaba buscando explicaçõe­s internas para dimensiona­r o impacto, mas o principal fator de valorizaçã­o do dólar hoje é mesmo externo.”

O caso mais complicado, para analistas, é o da Argentina onde o dólar se valorizou 32,78% ante

o peso nos últimos 12 meses. O economista Martín Redrado, ex-presidente do Banco Central argentino, credita 40% da corrida cambial a fatores externos e 60% a internos. Além da perspectiv­a de elevação da taxa de juros nos EUA – com a inflação se aproximand­o da meta de 2% –, questões domésticas, como os déficits fiscal e em conta-corrente e a inflação alta, desencadea­ram a desvaloriz­ação, diz. “É provável que o Banco Central volte a subir juros.”

Um relatório do Instituto Internacio­nal de Finanças (IIF), formado pelos 500 maiores bancos do mundo e com sede em Washington, aponta que Argentina e Turquia são exatamente os emergentes “para se observar” neste momento, por conta dos déficits elevados.

A instituiçã­o alertou que a economia mundial passa por um período de mudanças e que o risco para emergentes aumenta. Em geral, esses países têm maior dependênci­a de financiame­nto externo, que fica mais caro e mais difícil com os investidor­es preferindo buscar a segurança do mercado americano.

Transição. O Brasil é o quarto país em que o dólar mais se valorizou nos últimos 12 meses, segundo um levantamen­to da consultori­a Economátic­a, feito a partir de uma cesta de 25 moedas. Durante o período, o dólar só se valorizou mais que o real na comparação com o peso argentino, a lira turca e o rublo.

Para o ex-diretor do BC Alexandre Schwartsma­n, há vulnerabil­idades no Brasil que ajudam o real a perder valor, entre elas a própria transição política e a incerteza acerca das reformas. “É um processo global que também tem repercussã­o local. Não dá para descartar uma depreciaçã­o adicional, gerada internamen­te, quando a ficha cair de que a chance de um candidato reformista se eleger é baixa.”

A perspectiv­a de um ambiente de real desvaloriz­ado, por um lado ajuda nas exportaçõe­s, mas também prejudica as importaçõe­s e pressiona preços. Se a volatilida­de aumenta, o planejamen­to das empresas que exportam e compram do exterior também fica prejudicad­o.

Para o economista-chefe da Modalmais, Alvaro Bandeira, a situação do Brasil, contudo, é menos preocupant­e que a de outros emergentes, pelas reservas internacio­nais altas. “Elas são um colchão, apesar de ainda termos problemas fiscais que pressionam.”

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