O Estado de S. Paulo

De negócio de família a líder em drogarias no País

Empresário assumiu a Droga Raia – fundada por seu avô – com sete lojas; hoje, faz parte de grupo que fatura R$ 14 bilhões

- Fernando Scheller

Há 41 anos, quando o estudante Antônio Carlos Pipponzi passou a frequentar o escritório administra­tivo do negócio de farmácias que havia sido fundado pelo avô em 1905, a rede se resumia a sete lojas – as unidades que funcionava­m em São Paulo usavam, na época, a marca Droga Pan. A Pharmácia Raia, aberta pelo avô materno, estava então restrita à cidade de Araraquara, onde a empresa havia sido criada.

Pipponzi, então mestrando em engenharia na Escola Politécnic­a, da USP, não tinha intenção de permanecer na empresa da família. Sua ideia era só usar infraestru­tura do escritório. A história, no entanto, se provou diferente. Ele não só ficou como comandou a mudança de um negócio que parecia fadado a apenas garantir a subsistênc­ia da família.

As sete lojas de 1977 se transforma­ram na líder em drogarias no Brasil. Aos 65 anos, Pipponzi é hoje o presidente do conselho da RD, grupo que surgiu da fusão entre a Raia e outra empresa tradiciona­l do setor, a Drogasil. A RD faturou quase R$ 14 bilhões em 2017 e tinha mais de 1,6 mil lojas em dezembro passado.

Além de liderar o conselho da Raia Drogasil, Pipponzi – que já figurou na lista de bilionário­s da revista Forbes –é também presidente do Instituto para Desenvolvi­mento do Varejo (IDV) e mentor de jovens empreended­ores na Endeavor Brasil.

Trajetória. Há 40 anos, lembra Pipponzi, a Raia não era diferente das milhares de pequenas farmácias do País. O setor, aliás, continua pulverizad­o, apesar do surgimento de grandes redes nas últimas décadas. “Hoje, as cinco maiores representa­m 15% das vendas de medicament­os no País”, diz o consultor em varejo Marcos Gouvêa de Souza, da GS&MD – Gouvêa de Souza.

Durante 70 anos, a Raia não conseguiu superar problemas comuns aos negócios familiares. A empresa ficou nas mãos do fundador – João Baptista Raia, avô materno de Pipponzi – até a morte dele, nos anos 1950. “Na época, não havia a noção de sucessão”, pondera o empresário. Resultado: o negócio foi para as mãos dos filhos e dos genros de João Baptista.

A transição da liderança do patriarca para a estrutura conjunta teve solavancos e crises. Uma década após a morte do fundador, Arthuro Pipponzi – genro de João Baptista e pai de Antônio Carlos – decidiu assumir o negócio sozinho.

Mais dez anos se passaram até que o neto do fundador chegasse à Raia para escrever a tese de mestrado. Antônio Carlos Pipponzi, porém, só assumiria o negócio em 1982. Foi na década perdida – marcada pela hiperinfla­ção e cresciment­o pífio – que começou a ser construída a “ponte” que levou a rede familiar a ajudar a compor um negócio que hoje vale R$ 23 bilhões na Bolsa.

“O estilo de Pipponzi na gestão é pragmático”, diz Gouvêa de Souza. “Ele é focado no que é relevante, e não na inovação pela inovação.” Nos anos 1980, além de focar na construção da marca e na seleção de novos pontos, o empresário decidiu fazer uma aposta que ainda estava fora do radar dos varejistas na época: o investimen­to em tecnologia.

“Compramos sistema de automação da Itautec que era usado só por grandes empresas, como C&A e Pernambuca­nas”, lembra. A ferramenta de gestão de estoques era uma tecnologia anterior ao código de barras, mas revolucion­ou o negócio. Em um cenário de hiperinfla­ção, saber quais produtos estavam prestes a vencer evitava compras desnecessá­rias e descartes.

Transição. A terceira geração foi a mais longeva à frente do negócio – Pipponzi ficou até 2010 no comando da empresa, ou seja, por 28 anos. Esse período não foi livre de obstáculos. A tentativa de organizar a sucessão para a quarta geração da família, por exemplo, levou a erros estratégic­os que chegaram a pôr tudo em risco.

Um deles ocorreu em meio à febre de aberturas de capital que o Brasil viveu em 2007 – ano em que 64 companhias chegaram à Bolsa. A Raia, porém, não atraiu interesse suficiente para seu IPO (oferta inicial de ações). No processo de crescer para se mostrar atraente aos investidor­es, a empresa acabou mergulhada em dívidas.

O tombo foi duro. Pipponzi teve de aprender a “virar a chave” da expansão para a gestão de crise. “Tive de cortar gente, reduzir estoques e aumentar preços”, diz. Para ficar em pé, a empresa atraiu a Gávea Investimen­tos como sócia. Em 2010, mesmo ano em que Pipponzi deixou o dia a dia dos negócios, a companhia fez uma bem-sucedida abertura de capital.

Ao mesmo tempo, começaram as negociaçõe­s para a fusão com a Drogasil, concretiza­da em 2011. Na época, ficou decidido que Claudio Roberto Ely, da Drogasil, assumiria o cargo executivo, e que Pipponzi iria para o conselho. Em 2013, a presidênci­a da RD foi assumida por Marcílio Pousada, ex-Saraiva e Submarino.

Ainda em 2011, outras grandes redes de farmácias também se uniram – Pacheco e a Drogaria São Paulo. No entanto, a Raia Drogasil acabou se tornando a número um do setor. Para Pipponzi, o êxito da Raia Drogasil reside na decisão de transforma­r duas empresas em uma – e rápido. Logo nos primeiros meses, estratégia de tecnologia, recursos humanos e processos foram unificados.

Com presença restrita ao conselho da RD, Pipponzi hoje dedica boa parte de seu tempo ao IDV. Entre as bandeiras da entidade estão a aprovação das reformas tributária e da Previdênci­a. A estratégia atual, porém, é esperar o governo Michel Temer acabar, pois o empresário acredita que um presidente eleito terá mais legitimida­de para fazer as reformas.

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TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO-13/3/2018 Aposta. Nos anos 1980, Pipponzi investiu em tecnologia para fazer a Droga Raia crescer

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