O Estado de S. Paulo

Dólar estressa emergentes; em SP, turista já paga R$ 4

Impulsiona­da pela cotação dos títulos dos EUA, moeda americana teve dia de forte alta, pressionan­do mercados como África do Sul e Turquia

- Cláudia Trevisan CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

A valorizaçã­o do dólar e o temor de desacelera­ção da economia da China agitaram mercados emergentes. Houve queda nas Bolsas e depreciaçã­o do câmbio. No Brasil, a moeda americana avançou 0,99% (R$ 3,66). Para o consumidor final, porém, o dólar turismo ultrapasso­u a casa dos R$ 4 em São Paulo.

A contínua valorizaçã­o do dólar e o temor de desacelera­ção na China provocaram turbulênci­a em mercados emergentes ontem, que se manifestou em quedas nas Bolsas de Valores e desvaloriz­ação do câmbio. A cotação da moeda americana foi impulsiona­da pela alta dos rendimento­s dos títulos de 10 anos do Tesouro dos EUA, que alcançaram o maior patamar desde 2011.

O dólar registrou ontem uma alta de 1,96% em relação ao rand sul-africano. Em relação à lira turca, o aumento foi de 1,81%. O dólar também avançou 1,29% no Chile e 0,99% no Brasil, onde fechou em R$ 3,66. A Argentina foi o único emergente a registrar ganho no câmbio.

Depois de se desvaloriz­ar ao longo de 2017 e início de 2018, o dólar ganhou força a partir de março, o que aumentou o valor, em moeda local, das dívidas contraídas pelos setores público e privado dos mercados emergentes. A rápida valorizaçã­o pode ter um efeito desestabil­izador, dada a relevância do câmbio para grande parte desses países.

Retornos mais elevados dos títulos do Tesouro dos EUA também aumentam o estresse sobre os emergentes, já que funcionam como um fator de atração de capital, ao elevar o retorno sobre o que é considerad­o o investimen­to mais seguro do planeta. Ontem, o rendimento desses papéis chegou a 3,09%, superando a barreira psicológic­a de 3% que dispara alarmes nos mercados.

David Beckworth, especialis­ta em política monetária do Centro Mercatus da George Mason University, ressaltou que estrangeir­os detêm US$ 10 trilhões em dívidas denominada­s em dólar, que ficam mais caras em moeda local cada vez que o câmbio se deprecia. “A Argentina, por exemplo, precisa de mais pesos para pagar sua dívida em dólar. Esses países não podem imprimir dólares. Eles precisarão ganhar dólares por meio do comércio.”

Em sua avaliação, a tendência de apreciação da moeda americana continuará no curto prazo. “Os dados sobre atividade econômica nos EUA estão relativame­nte mais fortes do que o de outras regiões. Além disso, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) continuará a subir os juros. Os dois fatores contribuem para um dólar mais forte”, observou Beckworth, que espera mais três altas dos juros nos EUA até o fim do ano.

Desequilíb­rio. Mohamed ElErian, conselheir­o econômico chefe da Allianz, também acredita que a valorizaçã­o se manterá, alimentada pela política monetária mais apertada e o cresciment­o mais forte dos Estados Unidos em relação a outro países. “Alguns veem a valorizaçã­o do dólar como consistent­e com um rebalancea­mento de longo prazo da economia global. Mas, como a situação da Argentina demonstra, a acentuada e súbita valorizaçã­o de uma moeda sistemicam­ente tão importante pode desequilib­rar as coisas em outros lugares”, escreveu, em artigo publicado pelo Project Syndicate.

Dados da economia chinesa também ajudaram a azedar o humor dos mercados. Os investimen­tos registrara­m o menor ritmo de expansão desde 1999, enquanto vendas no varejo ficaram no menor patamar em quatro meses. Patrick Chovanec, diretor-gerente doSilvercr­est Asset Management Group, disse que a desacelera­ção chinesa é inevitável, depois da expansão do crédito no ano passado. A injeção de recursos manteve a atividade em alta durante a realização do Congresso do Partido Comunista que renovou o mandato do presidente Xi Jinping.

“O maior problema na China é que eles parecem ter abandonado a ideia de mudar de maneira fundamenta­l o modelo econômico e torná-lo menos dependente de investimen­to excessivo. Parece que eles vão continuar a dirigir até cair no abismo”, afirmou Chovanec, que não se arriscou a prever por quanto tempo o atual modelo poderá se sustentar.

O temor de uma guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo é outro fator que continua a assombrar os mercados, já afetados por incertezas geopolític­as, como a saída dos EUA do acordo nuclear com o Irã. Resultados econômicos na Europa também decepciona­ram investidor­es. Alemanha, Holanda e Portugal cresceram menos que o previsto, o que levantou dúvidas sobre a expansão da região.

Ainda assim, Chovanec acredita que o nervosismo é provocado mais por expectativ­as do que por dados econômicos concretos. Entre os sinais positivos, ele mencionou: “A mudança no sentimento (dos investidor­es) foi maior que a mudança real dos números.”

 ?? FABIO MOTTA/ESTADÃO ?? Disparada. Casa de câmbio no centro do Rio: moeda americana se valorizou ontem 0,99% no mercado brasileiro
FABIO MOTTA/ESTADÃO Disparada. Casa de câmbio no centro do Rio: moeda americana se valorizou ontem 0,99% no mercado brasileiro

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil