Pedofilia provoca renúncia de todos os bispos do Chile
Religiosos puseram cargos à disposição do papa após a divulgação de estudo que revelou graves negligências em coibir abusos sexuais
Todos os 34 bispos chilenos puseram seus cargos à disposição do papa Francisco, após os escândalos de abuso sexual cometidos por religiosos no país. O anúncio foi feito ontem, em Roma, pelos porta-vozes da Conferência Episcopal do Chile.
Em declaração à imprensa, os 34 bispos convocados pelo pontífice para prestar contas sobre os escândalos anunciaram que puseram suas “acusações nas mãos do Santo Padre para que ele livremente decida em relação a cada um”. Agora, o papa pode aceitar ou rejeitar as denúncias – ou adiar a decisão.
Esta é a primeira vez que uma conferência nacional de bispos oferece renúncia coletiva. A questão revela a devastação que os abusos sexuais causaram à Igreja Católica no Chile. As renúncias foram apresentadas após a divulgação dos detalhes de um relatório de 2,3 mil páginas produzido pelo Vaticano. Nas conclusões do papa sobre o documento, ele acusa os bispos de destruir provas dos crimes, pressionar os investigadores para reduzir as acusações de abuso e cometer “graves negligências” na proteção das crianças contra padres pedófilos.
Francisco afirma ainda que toda a hierarquia católica chilena é responsável por “defeitos graves” no tratamento dos casos e, por conta disso, a Igreja Católica sofreu as consequências. “Ninguém pode se eximir e colocar o problema sobre os ombros dos outros”, disse o pontífice no documento, divulgado pelo canal chileno T13.
Em resposta, os bispos disseram que o conteúdo do documento é “absolutamente deplorável” e mostra um “abuso inaceitável de poder e consciência”, assim como de abuso sexual. Eles pediram perdão às vítimas, ao papa, aos católicos e prometeram reparar os danos.
Francisco convocou todos os bispos chilenos a Roma para uma conferência após receber o relatório, produzido por especialistas em crimes sexuais do Vaticano que foram ao Chile para investigar o caso. O documento não foi divulgado em sua totalidade, mas o papa revelou suas principais conclusões e as entregou aos bispos durante a reunião.
Entre os 34 bispos presentes estavam vários dos acusados de ter acobertado durante décadas os abusos cometidos pelo padre Fernando Karadima, suspenso de forma vitalícia após ser declarado culpado, em 2011, por abuso sexual de menores nos anos 80 e 90.
Fontes garantiram que Francisco substituirá quatro religiosos que se formaram à sombra de Karadima na Igreja de El Bosque, em Santiago. O papa afirmou que a apuração evidenciou “defeitos graves” no modo como os casos de abuso foram tratados, com investigações superficiais ou inexistentes, enquanto as alegações continham evidências óbvias de crimes. O resultado, disse Francisco, “criou um escândalo para os que denunciaram e todos os que conheciam as vítimas”.
Em alguns casos houve “negligência grave” na proteção das crianças contra padres pedófilos pelos bispos. Esta parte se refere aos muitos casos de abuso sexual que surgiram dentro das ordens religiosas chilenas nos últimos anos, envolvendo salesianos, franciscanos e a Comunidade dos Irmãos Maristas. Alguns religiosos foram expulsos por conduta imoral, mas seus casos acabaram reduzindo a “gravidade dos seus atos criminosos, atribuindo a eles mera fraqueza ou lapsos morais”, disse o pontífice.
Francisco ressaltou que o problema poderia ser atribuído ao treinamento que os padres chilenos recebiam no seminário, evidenciando uma “fratura profunda” dentro da Igreja. A investigação, segundo o papa, continha “graves acusações contra alguns bispos e superiores que enviaram a essas instituições educacionais padres suspeitos de homossexualidade ativa”.