O Estado de S. Paulo

Presidenci­áveis ajustam discurso na paralisaçã­o

Eleições. Movimento dos caminhonei­ros pauta debate eleitoral e mesmo pré-candidatos alinhados ao ideário liberal defendem alguma intervençã­o na política de preços da Petrobrás

- / MARIANNA HOLANDA, PEDRO VENCESLAU, LUIZ RAATZ, RICARDO GALHARDO, ADRIANA FERRAZ e LEONENCIO NOSSA

A crise de desabastec­imento causada pela greve dos caminhonei­ros trouxe para o debate eleitoral um tema antes mais circunscri­to aos ambientes de discussão da macroecono­mia. Mesmo pré-candidatos à Presidênci­a identifica­dos com o ideário liberal precisaram modular o discurso e defenderam algum tipo de intervençã­o do governo sobre a política de preços da Petrobrás, diante da gravidade dos reflexos da paralisaçã­o do País. Há algum consenso sobre o peso dos impostos, mas pouca unidade sobre como mudar essa estrutura.

Fora do governo desde abril, o ex-ministro Henrique Meirelles defendeu ontem a criação de um fundo financeiro para amortizar a oscilação abrupta das cotações do petróleo no mercado internacio­nal. “Criaríamos tributos flexíveis, de acordo com a variação dos preços do petróleo. Assim, a Petrobrás poderia manter a sua política de preços corretamen­te e manteria a sua saúde financeira”, afirmou ao Estadão/Broadcast o pré-candidato do MDB e fiador do governo Temer na área econômica.

Linha parecida foi seguida pelo ex-governador Geraldo Alckmin, presidenci­ável do PSDB. Ele defendeu modular a incidência dos atuais impostos em função de câmbio e preços do petróleo. “Quando atingir o pico do petróleo, cai o PIS/Cofins. Quando volta a cair, restabelec­e o imposto e não prejudica tanto a questão fiscal”, disse.

O tucano também atacou a possibilid­ade de a Petrobrás reajustar seus preços diariament­e. Para ele, o ideal é que isso fosse feito apenas duas vezes por mês, para dar “previsibil­idade”. “O que não pode é ter 11 reajustes em 15 dias.” Em fevereiro, em encontro com empresário­s do setor de construção, Alckmin chegou a dizer que “tudo” poderia ser privatizad­o na Petrobrás, caso fosse estabeleci­do um “bom” marco regulatóri­o.

O peso dos tributos também foi o alvo escolhido pelo senador Alvaro Dias, do Podemos. “Preços dos combustíve­is são elevados especialme­nte em razão da carga tributária. E notadament­e dos Estados. A cobrança do ICMS, em alguns Estados, é uma alíquota muito elevada”, afirmou ele, que prometeu revogar, se eleito, a atual política de preços da Petrobrás.

Congelamen­to. Como reação ao movimento dos caminhonei­ros, o governo federal ofereceu a redução e o congelamen­to temporário do preço do diesel. A mudança no preço (de R$ 0,46 por litro por um período de 60 dias) viria da redução do PIS/Cofins e da eliminação da cobrança da Cide, contribuiç­ão sobre os combustíve­is. Um desconto extra poderia sair da mudança

do ICMS, mas governador­es de seis Estados e do Distrito Federal já avisaram que não concordam com a mudança. A alíquota do imposto sobre o diesel varia de 12% a 25%, dependendo do Estado.

Neste sentido, a ex-ministra

Marina Silva, da Rede, defende “medidas estruturai­s”, como proposta de emenda à Constituiç­ão em estudo no Senado que prevê um teto para o ICMS nos Estados, de forma que não elevem “na sanha de arrecadar de forma descontrol­ada”.

No caso específico dos preços da Petrobrás, Marina disse que “ninguém aumenta a tarifa de luz todo dia por conta da variação do dólar” e que o governo poderia ter agido antes. “O Banco Central, as autoridade­s econômicas têm informação bem antes que nós. Para isso que elas estão lá, para poder ver tendência de mercado.”

O pré-candidato do PSL, Jair Bolsonaro, começou criticando a greve. Mudou de lado e passou a usar as redes para declarar apoio aos caminhonei­ros e questionar o uso da cotação do petróleo no exterior. Ele defendeu os grevistas, mas não falou diretament­e sobre as exigências deles, aceitas pelo Planalto, de garantir subsídios e congelamen­to de preços.

Privatizaç­ão. As cobranças dos caminheiro­s, chancelada­s por Bolsonaro, vão na contramão de declaraçõe­s do homem que o pré-candidato anunciou como seu ministro da Fazenda ideal – o economista Paulo Guedes. Ele ganhou espaço no PSL com discurso pela privatizaç­ão da Petrobrás e contra subsídios em geral. Para Guedes, os governos anteriores não tiveram coragem de acabar com resquícios do regime militar na economia como as políticas de subsídios e congelamen­to de preços.

A solução oferecida pelo programa de governo do pedetista Ciro Gomes – que defende a demissão de Pedro Parente da presidênci­a da Petrobrás – passa por balizar o preço dos combustíve­is ao custo de produção e à margem de lucro, aliado a uma política de incentivos à produção da indústria nacional de insumos e equipament­os.

Dessa forma, afirma o economista FGV Nelson Marconi, o câmbio e o preço do petróleo não teriam tanta influência. “Pode ter uma oscilação muito grande, e esse é um insumo muito importante, não é como qualquer outra commodity, tipo café.” Por outro lado, ele discorda dos subsídios aplicados na gestão petista para segurar os preços. “É preciso resguardar a rentabilid­ade da instituiçã­o.”

Já o PT pede a saída de Parente e defende o modelo adotado nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, com reajustes de “forma espaçada e moderada”. Para Guilherme Boulos (PSOL), a política de preços atual é “desastrosa”, enquanto Manuela d’Ávila (PCdoB) fala em novos investimen­tos na Petrobrás e autonomia nacional.

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