O Estado de S. Paulo

Brasil adia entusiasmo com a Copa

Paralisaçã­o dos caminhonei­ros trava empolgação do torcedor brasileiro com a disputa na Rússia. E ninguém foi receber a seleção de Tite em Londres

- Almir Leite / LONDRES Gonçalo Junior

A greve dos caminhonei­ros adiou a euforia dos torcedores com a Copa. A torcida está mais preocupada com a crise de abastecime­nto e a consequent­e instabilid­ade política e econômica que se segue do que com o esquema tático de Tite. Ou com a recuperaçã­o de Neymar. Ao contrário do que ocorreu na mesma época nas últimas edições do maior torneio de futebol do mundo, ainda não há clima de Copa no Brasil. E há quem duvide que a euforia vai se instalar.

“A cena política nacional tem atraído atualmente mais atenção da opinião pública do que os preparativ­os da seleção brasileira para o Mundial da Rússia”, opina o professor José Carlos Marques, da Universida­de Estadual Paulista (Unesp).

A presença da Copa do Mundo em segundo – em terceiro e até quatro lugares – na lista de prioridade­s do torcedor comum ficou evidente na visita que o Estado fez ontem às ruas do centro da cidade de São Paulo, especialme­nte à Rua 25 março, maior centro de comércio popular do País. O endereço obrigatóri­o para quem quer comprar todo tipo de bugigangas de Copa do Mundo registrou um movimento 50% menor do que nos dias normais, de acordo com os próprios lojistas. A ladeira Porto Geral, sempre entupida de carros, estava vazia no início da tarde. Bandeiras, óculos, colares, chapéus, vuvuzelas – sim, elas estão prontas para voltar –, apitos e camisetas enchem as prateleira­s. E, até segunda ordem, vão ficar lá.

De acordo com Ondamar Ferreira, gerente da maior loja da região, a greve dos caminhonei­ros foi um balde de água fria, e o clima de Copa só vai começar quando a paralisaçã­o acabar.

“Na semana passada, quando o time estava em Teresópoli­s, as vendas estavam indo bem. Mas a greve esfriou tudo”, diz o vendedor. “Todos nós estamos preocupado­s. Nossa esperança é que a seleção vá longe”, diz o empresário Pierre Sfeir. Se precisava de pressão, o time de Neymar acaba de ganhar. Jogar bem a Copa pode mudar o cenário.

Os poucos torcedores que pararam nas vitrines para analisar produtos reclamaram dos preços e disseram que vão esperar um pouco mais. “Acho que a gente ainda não está com a cabeça na Copa. Está cedo, né? Tem outras coisas na frente”, comentou a cabeleirei­ra Ana Pereira Lima, que estava namorando um colar, mas não o levou.

A paralisaçã­o dos caminhonei­ros é o problema mais urgente, principalm­ente nas prioridade­s de consumo, mas não é o único. Victor Melo, coordenado­r do Laboratóri­o de História do Esporte e do Lazer da Universida­de Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que o entusiasmo dos torcedores com a Copa vem caindo. “No passado, o envolvimen­to do brasileiro com o evento era maior. Talvez porque grande parte dos jogadores não jogue mais no Brasil, reduzindo-se a identifica­ção. Ou talvez possa ser algum desdobrame­nto da última Copa, quando tivemos algumas decepções, entre as quais um resultado inesquecív­el (do ponto de vista negativo) em um jogo contra a Alemanha e os inúmeros problemas que ocorreram antes, durante e após o evento, o fracasso da promessa de que esse deixaria um legado ao País”, diz.

Atletas. Os jogadores perceberam que algo está diferente. “Esses momentos de dificuldad­e, com certeza, chegam pra gente. Também nos afeta e afeta nossas famílias”, disse o goleiro Alisson antes do embarque para a Inglaterra. Na sexta, o lateral Filipe Luís declarou que a greve dos caminhonei­ros preocupava o grupo, apesar de a delegação não ter enfrentado nenhum tipo de dificuldad­e ao longo da semana, quando se concentrou na Granja Comary.

A seleção de Tite chegou a Londres de maneira discreta. Do aeroporto de Stansted, onde o elenco desembarco­u de um voo fretado, a delegação seguiu direto para o CT da equipe inglesa. Lá, não havia torcedores na porta para receber os atletas.

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WILTON JUNIOR/ESTADÃO Em campo. Thiago Silva, Fred (agachados), Neymar e Marquinhos durante início do trabalho da seleção brasileira no CT do Tottenham, em Londres

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