Pressão política
Após queda de quase 15% ontem, petroleira agora vale menos que Ambev, Vale e Itaú
Ficou claro que o governo deixou de garantir que não haveria interferência nas decisões administrativas.
Na esteira do pedido de demissão do presidente da Petrobrás, Pedro Parente, as ações preferenciais e ordinárias da estatal registraram ontem quedas de quase 15% ontem. A reação dos investidores à troca de comando da estatal, logo após o estresse da greve dos caminhoneiros e da paralisação dos trabalhadores de refinarias, fez a empresa perder R$ 40 bilhões em um só dia. Ou seja: a Petrobrás amanheceu o dia valendo R$ 271 bilhões e anoiteceu cotada a R$ 231 bilhões.
Foi uma brusca mudança de cenário, em questão de três semanas. No dia 10 de maio, segundo a consultoria Economática, a Petrobrás havia retomado o posto de companhia mais valiosa da América Latina. Naquele dia, a soma de suas ações era de R$ 358,9 bilhões.
Dias mais tarde, no pico de cotação do mês, a estatal chegou a ser avaliada em R$ 388,9 bilhões – ou quase R$ 150 bilhões a mais do que a soma de todos os papéis, ontem. Em termos porcentuais, a desvalorização da companhia desde o dia 16 superou a marca de 40%.
Em 15 dias, a companhia passou de negócio mais valioso do Brasil e da América Latina à quarta posição entre as companhias listadas na B3, nova denominação da bolsa de valores de São Paulo. Outras companhias foram ganhando posições enquanto as ações da estatal derretiam.
Ao longo da semana, de acordo com a Economática, a empresa já havia sido ultrapassada pela gigante das bebidas Ambev e pela mineradora Vale. Ontem, foi superada também pelo banco Itaú, e por uma margem de mais de R$ 30 bilhões.
A influência da queda nos papéis da estatal não tem contaminado outros negócios. Ontem, houve forte altas de outras companhias na B3, entre elas a Eletropaulo, que subiu 27%, e a BRF, que ganhou mais de 9%, justamente pela expectativa de que Parente vá assumir o comando da gigante de alimentos (leia mais abaixo).
Influência política. A tensão do mercado com a troca do principal executivo da Petrobrás se concentra na expectativa de que, com a saída de Parente, a gestão da estatal passará a ficar cada vez mais subordinada a ingerências políticas. Para tentar reduzir essa impressão, o governo anunciou ontem o diretor financeiro Ivan Monteiro, de perfil técnico, como novo presidente da empresa.
Apesar da tentativa de apagar o incêndio, analistas de mercado se mostravam céticos com a Petrobrás. Para o diretor de renda variável da Franklin Templeton Investments, Frederico Sampaio, a saída de Parente abala a retomada de confiança na estatal, construída em uma gestão que alinhou os preços locais às cotações globais do petróleo. “O cristal se quebrou de novo”, disse ele, referindo-se à frágil situação da companhia.
O analista político da XP Investimentos, Ricardo Back, avalia que a intervenção na política de preços na Petrobrás indica que o governo poderá interferir em outras estatais. “Da mesma forma que o governo usa (agora) a Petrobrás para adotar medidas populistas, poderia usar o Banco do Brasil, a Caixa ou qualquer outra estatal (no futuro)”, ressalta Back.
Segundo André Perfeito, economista da corretora Spinelli, a mudança na Petrobrás é reflexo da fragilização do governo de Michel Temer. “O governo tem tido enorme dificuldade de resgatar a autoridade ao longo de 2018”, frisa o analista, lembrando que essa impressão só foi reforçada pela greve dos caminhoneiros. “Parente pediu demissão para se preservar.” / COLABORARAM LUANA PAVANI, CAIO RINALDI e CYNTHIA DECLOEDT
“O governo tem tido enorme dificuldade de resgatar a autoridade. (...) Parente pediu demissão para se preservar.” André Perfeito
ECONOMISTA DA SPINELLI