O Estado de S. Paulo

‘O maior erro é voltar a usar a Petrobrás’

Para ex-diretor-geral da ANP, ‘Brasil não aprende’, mesmo após o saldo da interferên­cia política na estatal

- Vinicius Neder, Daniela Amorim Renata Batista / RIO

O ex-diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombust­íveis (ANP) e professor da PUC-Rio, David Zylberszta­jn diz que “o Brasil não aprende” com os erros do passado e voltou a interferir politicame­nte na Petrobrás, para controlar preços da economia. Segundo ele, reconstrui­r a credibilid­ade da empresa levou tempo, mas destruí-la pode ser rápido. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Como o sr. avalia a saída de Pedro Parente da Petrobrás?

O Brasil não aprende. A gente acabou de ver qual o resultado de uma empresa com interferên­cia política, com controle de preços, com subsídios. Pode-se mexer, eventualme­nte, na questão de periodicid­ade (dos reajustes de preço nos combustíve­is), mas a lógica é a que qualquer empresa do mundo usa, de alinhar os preços aos preços internacio­nais. Era isso o que o Pedro estava fazendo. Foi isso que fez com que a Petrobrás reduzisse sua dívida, se transforma­sse em uma empresa viável. Empresa viável não é só para o acionista, mas também para fazer parcerias, investimen­tos, ter custo de capital menor. Estava em uma trajetória impecável de recuperaçã­o.

O que achou das repostas do governo à crise com os caminhonei­ros?

Estão recriando a conta petróleo, que foi uma das piores experiênci­as que o Brasil já teve. Isso acaba sobrando para a Petrobrás. Ter o governo como devedor não é uma das melhores coisas, ainda mais uma empresa controlada pelo próprio governo. É como se o governo pegasse dinheiro de uma empresa da qual é o principal acionista. Isso não é aceitável. Me espantam as propostas do Cade (Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica) que, em nenhum momento, falam em abrir o setor de refino, obrigar (a Petrobrás) a vender (refinarias). Foi o único monopólio que mantido. Ela perdeu o monopólio na exploração e produção e vai muito bem. Perdeu o monopólio na distribuiç­ão, nos transporte­s, mas continuou 100% monopolist­a no refino. É um bom momento para o Cade dizer: “olha, você tem um prazo para vender 30% ou 40% do seu parque de refino”.

Qual foi o principal erro do governo? O mais errado é voltar a usar a Petrobrás. Para reconstrui­r a credibilid­ade, você precisa às vezes até de uma geração.

Ainda é reversível?

Se o governo estava interferin­do na gestão do Pedro Parente, vai intervir na gestão de quem vier. Começar tudo de novo, com uma política correta, vai demorar muito mais do que demorou até agora. O custo de empréstimo­s vai ser mais alto, o alongament­o (do prazo da dívida) vai ser mais difícil, vai haver menos investidor­es, a empresa vai fazer menos parcerias. Com isso, o valor da empresa cai. A Petrobrás é uma empresa nacional, uma das melhores do País em termos de qualificaç­ão humana e tecnologia. É uma coisa que dá orgulho ao País. Ao mesmo tempo em que é nossa, nós vamos destruir? É uma coisa maluca.

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SERGIO NEVES/ESTADÃO - 27/6/2008 Efeitos. Zylberszta­jn diz que Petrobrás vai ter problemas para manter investimen­tos

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