O Estado de S. Paulo

Confusão de ideias O petróleo e a Petrobrás são nossos. Mas as pessoas querem que seja “nosso” o preço praticado pelo mercado.

- CELSO MING E-MAIL: CELSO.MING@ESTADAO.COM

Embora seja funcionári­o de carreira de empresa estatal (Banco do Brasil), o novo presidente da Petrobrás, Ivan Monteiro, tem perfil técnico parecido com o de Pedro Parente. Na condição de diretor financeiro da Petrobrás, trabalhou na formulação da política de preços, nos expurgos (impairment­s) dos ativos podres do balanço da empresa e no programa de desinvesti­mentos. Ou seja, a agenda saneadora da Petrobrás, que produziu a ira dos políticos populistas e foi a causa da derrubada de Parente, leva as digitais de Monteiro.

Ele assumiu sexta-feira o mandatotam­pão que lhe cabe até a mudança de governo no início de 2019 com a afirmação de que manteria a blindagem da Petrobrás a interferên­cias políticas e, nisso, avisa que obteve garantias explícitas do presidente Temer. É bom ponto de partida que, no entanto, não passa firmeza. Por que tudo aquilo que o fraco presidente Temer garantiu e não sustentou para Parente pode ser garantido e sustentado para Monteiro, num período em que os políticos entregam a alma ao diabo para se reeleger?

O petróleo é nosso e a Petrobrás, também, desde os anos 50. Mas grande número de pessoas espera que esse “nosso” seja a Petrobrás a serviço de si próprio, a começar por preços ao consumidor subvencion­ados.

Nessa hora, essas pessoas não olham para o resultado da missão de recuperaçã­o da empresa, que continua nossa, e que, portanto, deveria ser entendido como benefício nosso. Olham para o impacto imediato nos próprios bolsos, pouco ligando para as graves distorções que essa atitude acarreta.

Grande confusão de ideias subjaz a esse pressupost­o. Uma delas é a de que a Petrobrás tem de atender não propriamen­te a exigências de boa governança, que seria a melhor maneira de obter dela o melhor resultado para a sociedade, mas ao que se presume ser, um tanto vagamente e com muita deformação, “o interesse nacional”.

Entre os predicados desse suposto interesse nacional estaria o de ser obrigada a repassar ao consumidor um produto a preços subsidiado­s. Esse ponto de vista ignora que a Petrobrás é obrigada a fazer dívidas em dólares e a importar equipament­os e combustíve­is (óleo diesel, por exemplo) a preços internacio­nais em dólares.

Outros argumentam que o critério da formação de preços de uma empresa estatal, como a Petrobrás, não teria o de ser o vigente em dólares no mercado internacio­nal a ser convertido em reais pelo câmbio do dia. Tem de ser, segundo essas pessoas, os verdadeiro­s custos da empresa, acrescidos de “margem razoável” de lucro. O equívoco desse ponto de vista é o de toda a formação de preços pretensame­nte com base nos custos. Ora, custo qualquer um põe onde quer. Basta contratar um cupincha para o cabide de empregos para o custo ir lá para cima. E, no caso da Petrobrás, o que fizeram dela foi uma pilhagem sistemátic­a de patrimônio. Se isso é custo e tem de ir para o preço, então o preço do óleo diesel teria de ir para acima dos R$ 10 por litro.

De todo modo, qualquer que seja a política que se adote para os combustíve­is, nada revoga o fato de que gasolina e diesel são caros demais porque o governo federal e os Estados usam os preços para tascar imposto sobre imposto. Problema com essa dimensão não existe em outros países onde os insumos básicos da economia são taxados apenas moderadame­nte, com o objetivo de não compromete­r a competitiv­idade do produto nacional. É só no Brasil que acontecem greves de caminhonei­ros quando sobem os preços internacio­nais.

Isso significa que os problemas de fundo não se resolvem nem com as subvenções decididas pelo governo, nem pela demissão do presidente, nem pela nomeação do novo presidente.

A crise dos caminhonei­ros foi apenas a primeira a espocar na economia. A maneira desastrosa como o governo a enfrentou e o desfecho da demissão do presidente da Petrobrás indicam que o País está fortemente vulnerável a outros ataques predatório­s.

Enfim, foi assim que tomaram forma tantas e seguidas previsões pessimista­s sobre o desempenho da economia, da política econômica e do processo eleitoral que ainda não engrenou.

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FABIO MOTTA/ESTADÃO - 12/5/2016 Monteiro. Com que blindagem?
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