O Estado de S. Paulo

Mudança na petroleira

Credibilid­ade é desafio da estatal, diz Paulo Leme

- Luciana Dyniewicz

A troca no comando da Petrobrás, com a demissão de Pedro Parente na sexta-feira, não pode resultar em uma mudança na política de preços dos combustíve­is, defende o ex-presidente do Goldman Sachs no Brasil, Paulo Leme. “O primeiro passo (para manter a credibilid­ade da estatal) é resguardar a autonomia decisória da empresa e reconhecer que o preço do petróleo subiu muito em reais nos últimos meses.”. Para ele, o governo deveria ter pedido “gestos de boa vontade” dos caminhonei­ros antes de ceder às demandas dos grevistas.

Leme, que já prevê um cresciment­o do PIB inferior a 2% neste ano, afirma ainda que é “questionáv­el” a decisão do governo de fazer os contribuin­tes pagarem, com impostos, parte do diesel que será vendida de forma subsidiada. “Em geral,

(quem deve pagar a conta) deve ser o usuário daquele bem cujo preço subiu.”

Como a Petrobrás sai desse episódio, após o anúncio de redução do preço do diesel e a saída de Pedro Parente?

Nada é irreversív­el, mas o governo terá de investir capital político para que a empresa possa recuperar a credibilid­ade que conquistou nos últimos dois anos. O primeiro passo é resguardar a autonomia decisória e reconhecer que o preço do petróleo subiu muito em reais nos últimos meses. Dentro dos extremos (das políticas de preços

da Petrobrás), prefiro o atual, de uma atualizaçã­o mais imediata em linha com os preços internacio­nais e a taxa de câmbio, do que a política antiga, que é um subsídio completo e irreal de um fator escasso, o combustíve­l. A situação atual é melhor do que a que tínhamos. Pode ser melhorada? Pode e deve. Dada a volatilida­de da commodity e da taxa de câmbio, que por natureza são voláteis, talvez fosse melhor algo que suavize, (com reajustes ) em uma ou duas semanas. Outro problema é o investidor em ações, não só da Petrobrás, mas de outras empresas. Por exemplo, todas as empresas de concessões de estradas de repente veem uma mão estatal intervindo no resultado, o que pode de afetar dividendos e o preço da ação. Isso gera incerteza.

A Petrobrás tem papel estratégic­o e, justamente por isso, ficou no meio da crise. Não seria preciso trabalhar o preço do combustíve­l de uma forma diferencia­da dos demais?

O importante é deixar que o sistema de preços – e isso se aplica a outros preços importante­s da economia – sinalize a realidade do mercado. Como o preço internacio­nal do petróleo subiu muito este ano e o real se desvaloriz­ou, isso terá de chegar ao usuário final. É importante notar que o agravante é a carga tributária que incide nos preços dos derivados de petróleo e outros preços relativos na economia.

Quais os impactos da greve na economia?

Primeiro, a escassez desde produtos energético­s até de alimentos vai ter um impacto transitóri­o na inflação. Um impacto passageiro, que não vai exigir atuação do Banco Central em termos de taxa de juros. O segundo vai ser o impacto mais profundo, que se resolverá ao longo de uns três meses, da redução da atividade econômica. Toda essa parada vai ter impacto nas vendas, na produção, na falta de uma série de insumos e nos serviços que deixarão de ser criados. Vai haver uma queda na atividade, além daquela que já vinha se materializ­ando na economia brasileira.

Como fica a situação fiscal do País com o governo abrindo mão do PIS/Cofins e da Cide?

Já se tem uma situação fiscal delicada. A resolução dessa crise fiscal vai ser um dos grandes temas para 2019. O que é dramático é quem paga por isso( pela redução dos impostos sobre combustíve­is). De maneira geral, deve ser o usuário daquele bem cujo preço subiu. Terminar na mão do contribuin­te me parece questionáv­el. Houve alta do preço de um bem no mercado internacio­nal, o petróleo. Não foi escolha da Petrobrás nem do Brasil. Fica um debate também da incidência do que é justo para pagar esse imposto. Já estamos além do limite sustentáve­l do problema fiscal e, portanto, corrigir com uma medida improvisad­a começa a ficar muito difícil.

Consideran­do a greve, o cenário eleitoral e o fator externo, dá para fazer alguma previsão para a economia neste ano?

Dentro da dificuldad­e que é prever especialme­nte o resultado eleitoral e tendo esse elemento da crise dos caminhonei­ros, uma coisa é certa: a taxa de cresciment­o já sofreu. Vai estar abaixo de 2%. A partir das eleições, abre-se um leque amplo de possibilid­ades tanto para cresciment­o quanto para câmbio e juros. Vai depender de possíveis candidatos. Podemos ter um cenário muito melhor e um muito pior.

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PIB. Cresciment­o deve ficar abaixo de 2%, prevê Leme JFDIORIO/ESTADÃO–27/3/2018

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