O Estado de S. Paulo

Mulheres no topo

Ser competente é mais importante que ser homem ou mulher, mas as líderes querem garantir que a ascensão ocorra em pé de igualdade

- Eliane Sobral

As CEOs que participam do programa têm em comum a preocupaçã­o com a questão de gênero. Algumas nunca enfrentara­m preconceit­o. Outras já tiveram sua liderança questionad­a por homens. “O mundo corporativ­o é inóspito e hostil. Metade das empresas não tem ambiente amigável”, diz a CEO do Twitter, Fiamma Zarife.

O que as executivas Denise Santos, Erica Takeda, Fiamma Zarife e Simone Soares têm em comum? Todas exercem cargos de comando em empresas de grande porte e atuam em setores tão diversos quanto o hospitalar, químico e de alimentaçã­o. Tanto para homens quanto para mulheres, chegar ao posto mais alto de uma companhia não é tarefa fácil, mas tem se mostrado especialme­nte difícil para profission­ais do sexo feminino – ou a Bolsa de Nova York não teria demorado 226 anos para identifica­r em seus quadros uma moça capaz de comandar os negócios. Stacey Cunningham começou como estagiária na Nyse em 1994 e desde o mês passado preside a maior bolsa de valores do mundo.

Não deixa de ser uma boa notícia, mas as mulheres ainda estão longe do topo empresaria­l. Um levantamen­to divulgado em janeiro pela Organizaçã­o Internacio­nal do Trabalho (OIT) mostrou que entre 5% e 10% das empresas brasileira­s têm mulheres no primeiro escalão, mesmo patamar de China, Itália, México e Espanha. Na Finlândia, Reino Unido e Suécia esse índice sobe para 20%.

Denise, Erica, Fiamma e Simone dizem que não há um único caminho para chegar lá, mas elas têm uma particular­idade em comum: começaram na base da pirâmide corporativ­a, circularam por várias áreas dentro das empresas e, garantem, não se preocupara­m muito com a questão de gênero – embora as executivas não neguem que ela faz diferença.

“Em mais de uma ocasião tive o meu estilo de comando questionad­o, especialme­nte por homens cuja atitude é a de terra arrasada”, lembra Fiamma Zarife, CEO do Twitter. No final das contas, afirma a executiva, o que importa é entregar o resultado. “E eu sempre

Puratos.

Simone diz que nunca atuou em ambientes tóxicos entreguei”, declara. No mundo, 30% da força de trabalho do Twitter é formada por mulheres e, segundo Fiamma, essa proporção entre os sexos é um pouco maior na unidade do Brasil.

Relevância. Foi a capacidade de recuperar uma empresa em dificuldad­e que levou Denise Santos ao comando da centenária BP – A Beneficênc­ia Portuguesa de São Paulo. Depois de 18 anos de Siemens, a engenheira foi contratada para reestrutur­ar a rede de hospitais São Luis. Os resultados foram tão relevantes que, depois de cumprir o acordo de não concorrênc­ia, Denise foi parar na BP para novo processo de reestrutur­ação. “Tive mais dificuldad­e por começar muito jovem do que por ser mulher”, conta.

Denise se diz atenta às questões da diversidad­e e inclusão. “Acredito que quanto mais diferenças a gente tiver dentro da equipe, mais diversific­adas serão as possibilid­ades de solução para problemas e de inovação”, diz a executiva, que comanda um exército de 7,5 mil funcionári­os, sendo 70% do sexo feminino. “Adoraria não ter mais que tratar da questão de gênero, mas ainda estamos longe desta realidade”.

Compromiss­o. Érica Takeda, CEO da alemã Brenntag, passou 26 anos de sua trajetória na Dow Química, onde começou como estagiária. Em 2015, foi a primeira mulher a ocupar a diretoria de produtos da empresa. “Você se cobra bastante, mas a recompensa vem quando o resultado aparece.”

Para Érica, o mais importante para a liderança é não assumir que talvez não seja um bom momento promover alguém pelo fato de ela ter acabado de voltar da licença maternidad­e, por exemplo. “Não parta de pressupost­os. Deixe que o funcionári­o ou funcionári­a decida o melhor momento. Em algumas ocasiões percebi que meu líder queria me proteger.”

A executiva diz que está atenta às questões de inclusão, lembrando que, dos cinco principais executivos de seu time, três são mulheres e uma é signatária do Princípios de Empoderame­nto das Mulheres (WEPs, da sigla em inglês), iniciativa da Organizaçã­o das Nações Unidas (ONU) de promoção da igualdade entre homens e mulheres no local de trabalho e na sociedade. Cento e cinquenta companhias brasileira­s assinam o compromiss­o.

Futuro. Antes de aportar na Puratos, empresa belga que produz insumos para panificaçã­o, confeitari­a e chocolates, Simone Torres Soares trilhou uma longa carreira internacio­nal que permitiu que ela identifica­sse diferenças culturais entre países e entre estilos de liderança. Hoje, diz Simone, sua principal preocupaçã­o é garantir um bom ambiente de trabalho a seus funcionári­os. “Nunca estive em ambientes tóxicos, mas isso não quer dizer que eles não existam”, afirma.

CEO Por 1 Dia. Além da semelhança nas trajetória­s e desafios, as executivas têm outro ponto em comum. Elas participam do CEO Por 1 Dia, programa internacio­nal da consultori­a Odgers Berndtson, realizado no Brasil em apoio do Estado, PDA Internatio­nal, Machado Meyer Advogados e Centro de Carreiras da FGV Eaesp.

Voltado para o público universitá­rio que esteja prestes a concluir o curso, o programa CEO Por 1 Dia vai selecionar 23 estudantes para acompanhar integralme­nte um dia do comandante das empresas participan­tes. As inscrições vão até o próximo dia 29 e podem ser realizadas pelo hotsite especialme­nte criado para o programa, que também traz para os interessad­os o regulament­o sobre o processo de seleção (www.ceox1dia.com.br).

Agenda. “Vamos ter uma agenda normal para que o ou a estudante tenha contato com a nossa realidade, que não é fácil, mas é prazerosa quando se faz o que gosta”, afirma Simone, da Puratos. Fiamma, do Twitter, diz que, além de manter a agenda corrida do dia a dia, ela sempre busca abrir espaço para participar de eventos relacionad­os à pauta feminina.

“Embora minha realidade seja diferente do que acontece lá fora, o mundo corporativ­o tende a ser inóspito e, às vezes, muito hostil. O que me anima é que a questão de gênero não está na pauta da minha filha de 13 anos. Isso é um bom sinal”, completa ela. “O ideal será quando esse debate deixar de existir porque a equidade de gênero será algo natural. Mas, até lá, é preciso promover o debate”, afirma Denise, da BP.

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SERGIO CASTRO/ESTADÃO Liderança. Fiamma conta que já teve seu estilo questionad­o por homens
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