Locação corporativa em risco
No recente projeto de alteração da Lei de Falências e Recuperação Judicial, encaminhado pelo presidente Michel Temer ao Congresso Nacional, merece destaque a questão envolvendo os contratos de locação de imóveis. Dentre as alterações, está a inclusão de um parágrafo cujo teor é: o pedido de recuperação judicial suspende a ação de despejo fundada em não pagamento de aluguéis até a data do pedido”. Este parágrafo revela uma grande preocupação para o mercado de locação de imóveis comerciais e lajes corporativas. Este mercado gira bilhões de reais no País, já que grande parte das empresas locam imóveis para suas sedes e unidades operacionais.
Estes imóveis são de propriedade ou administrados por diversos públicos, como pessoas físicas, empresas e fundos imobiliários e empresas de construção de imóveis e lajes corporativas para locação.
Como esse contexto é extremamente relevante para uma grande parcela da sociedade, é necessário destacar que os pagamentos de alugueis constituem-se como fonte de renda para estes proprietários. Ocorre que a nova legislação em debate poderá colocar em risco esse mercado, uma vez que empresas em situação de recuperação judicial que forem locatárias de imóveis com pendências financeiras poderão gozar de proteções que anteriormente não eram previstas.
Caso a legislação seja aprovada, esta não trará consigo somente impactos financeiros aos proprietários e administradores de imóveis destinados à locação, os quais sem dúvidas são favoráveis ao devedor. A legislação trará consigo, também, impactos financeiros negativos ao proprietário locador do imóvel, pois, ao passo que este não poderá executar os valores que lhes são devidos, sofrerá prejuízos ainda em ter o seu patrimônio imóvel estagnado durante o trâmite da ação de recuperação judicial do locador do bem: não receberá e não poderá retomar a posse direta do imóvel para si, dando ao imóvel nova circulação de mercado. Assim, a problemática desse novo dispositivo legal é justamente a adequação do princípio da preservação da empresa com o dos direitos inerentes à propriedade.
No mesmo sentido, a sugestão de inclusão de tal parágrafo acaba por considerar como unitária duas pretensões que possuem naturezas absolutamente distintas: a de desocupação/despejo do imóvel alugado e de cobrança dos débitos locatícios. Assim, é fundamental que se tenha em mente que a pretensão do despejo possui natureza jurídica e fundamentos jurídicos totalmente desvinculados da natureza jurídica e dos fundamentos jurídicos da cobrança de alugueres.
Ademais, o texto legal ainda causa margem para novas discussões processuais, uma vez que a prática nos mostra que o pagamento do aluguel é muitas vezes somado ao pagamento dos encargos da locação, tais quais IPTU e cotas condominiais. Assim, e aplicando-se corretamente os conceitos jurídicos, na medida em que o aluguel corresponde tão somente à contraprestação por parte daquele que tem a posse direta do imóvel, o inadimplemento dos encargos da locação não obstará o prosseguimento do despejo, fato que, sem dúvidas, tornaria o novo dispositivo legal inócuo.
O prosseguimento do despejo nessas hipóteses estaria se desvirtuando do espírito da lei, uma vez que normas restritivas de direito devem necessariamente ser interpretadas também restritivamente, tal qual a presente que restringe o direito de propriedade em benefício da possibilidade e necessidade de recuperação de empresas em dificuldade.