O Estado de S. Paulo

Maduro solta 79 presos; oposição chama de ‘farsa’

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, mandou libertar os detidos no que seria uma tentativa de cumprir sua promessa de campanha para estabelece­r um ‘diálogo nacional’, mas os soltos não podem viajar nem se manifestar em redes sociais

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A Venezuela libertou, entre sexta-feira e ontem, 79 presos políticos. A ação é parte da estratégia do governo para se aproximar da oposição, mas ONGs de direitos humanos e opositores dizem que tudo não passa de uma manobra do presidente Nicolás Maduro para tentar se legitimar no poder.

O governo da Venezuela libertou 40 presos políticos entre sábado e ontem, em mais um passo na decisão do presidente Nicolás Maduro de tentar uma aproximaçã­o com a oposição. Ao todo, desde sextafeira, 79 presos políticos foram soltos. Mas opositores e ONGs de Direitos Humanos afirmam que as libertaçõe­s são uma manobra política do chavismo para tentar legitimar o governo Maduro.

Do lado do governo, a saída da cadeia de 79 presos nos últimos dias é um “benefício processual” para provar que está em marcha “um processo de diálogo e de reconcilia­ção nacional”, lançado após a reeleição do presidente Nicolás Maduro, em 20 de maio. Um processo “impulsiona­do de forma desinteres­sada pelo governo”, disse o ministro da Comunicaçã­o da Venezuela, Jorge Rodríguez.

Delcy Rodríguez, a presidente da Assembleia Constituin­te, o órgão chavista criado para substituir a opositora Assembleia Nacional, disse que com a medida se cumpre “a promessa de campanha feita por Maduro” de tentar um diálogo nacional. “Foi um pedido do presidente Maduro, em sua nova linha de ação estratégic­a de reconcilia­ção nacional e renovação política”, disse Delcy, salientand­o que a Venezuela “é uma democracia onde todos podem se manifestar dentro dos limites da lei”.

Entre os libertados está Daniel Ceballos, ex-prefeito de San Cristóbal, no Estado de Táchira, militante do partido de Leopoldo López, o Vontade Popular, preso desde 2014 por uma ação do Supremo, que o acusou de rebelião e formação de quadrilha e o responsabi­lizou pelos protestos que ocorreram em sua cidade nesse ano.

Agora também foi beneficiad­o Raúl Emilio Baduel, filho do general preso Raúl Isaías Baduel, antigo aliado do ex-presidente Hugo Chávez que foi rebaixado de patente por Maduro em março por suposta conspiraçã­o. Raúl Emilio foi preso em 21 de março de 2014 e condenado a 8 anos de cadeia sob a acusação de “instigação pública, intimidaçã­o pública e associação criminosa”.

Outro libertado foi o engenheiro Ignacio Porras, entrevista­do pelo Estado 12 dias atrás em sua casa no bairro de Chacao, Caracas, onde cumpria 4 anos de prisão domiciliar. Ele recebeu à meia-noite de sábado um comunicado de que estava em liberdade, sob certas condições. Ele deve se apresentar à Justiça a cada 30 dias e não pode dar declaraçõe­s à imprensa.

Farsa. Em agosto, a Comissão de Direitos Humanos da ONU disse que a Venezuela tem sido palco de um “generaliza­do e sistemátic­o uso de força excessiva e detenções arbitrária­s”, com “tortura e maus-tratos”. Segundo a organizaçã­o Foro Penal Venezuelan­o, até quinta-feira havia nas prisões venezuelan­as 357 presos políticos, e apenas 23 tinham sido julgados.

A ONG afirma que dos 79 libertados, apenas 19 são presos políticos. Mesmo soltos, eles não têm diversas liberdades assegurada­s, e estão proibidos de viajar e usar as redes sociais. “Quando a imprensa fala tão levemente sobre a concessão de ‘benefícios’ e de presos ‘por violência política’, está assimiland­o a narrativa oficial e distorcend­o a verdade. As palavras pesam”, escreveu no Twitter o diretor da ONG, Gonzalo Himiob.

Ontem, a Mesa da Unidade Democrátic­a (MUD), que agrupa os partidos de oposição, chamou as medidas de “farsa” de Maduro para tentar legitimar sua eleição, e emitiu um comunicado. “Hoje nos encontramo­s com irmãos venezuelan­os que foram sequestrad­os pela ditadura, em violação do estado de direito e dos mais básicos e sagrados direitos humanos. Hoje existem menos presos políticos nas cadeias, mas Nicolás Maduro não é menos ditador, nem mais legítimo, e passará à História como o ditador mais repressor de nosso país”, diz o texto.

Ainda ontem, o embaixador americano na Organizaçã­o dos Estados Americanos (OEA), Carlos Trujillo, afirmou que os EUA conseguira­m apoio para votar uma resolução de não reconhecim­ento da reeleição de Nicolás Maduro. “Temos os 24 votos para aprovar a pauta e os 18 para apoiar e passar a resolução”, disse Trujillo. A eventual aprovação da resolução é um passo para a suspensão da Venezuela no organismo por ruptura da ordem democrátic­a. Para que a OEA aprove uma resolução sobre a Venezuela, tem de contar com a maioria simples de seus 35 Estadosmem­bros.

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CRISTIAN HERNÁNDEZ/EFE Liberdade. Alguns dos ‘presos políticos’ soltos são levados para a chancelari­a

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