O Estado de S. Paulo

Venezuela retira suas reservas no FMI e produz menos petróleo

Agora, Caracas tem no Fundo apenas bolívares que não valem nada e a quantidade de barris/dia é igual à produção em 1949

- Cláudia Trevisan CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

A Venezuela sacou em abril US$ 475 milhões de sua reserva no Fundo Monetário Internacio­nal (FMI). No início do ano, o país já havia retirado os últimos US$ 250 milhões de seus Direitos Especiais de Saque (SDR), conta na qual tinha US$ 3,6 bilhões em 2015. Caracas ainda possui US$ 362 milhões em sua reserva na instituiçã­o. O restante de sua cota é integrado por bolívares que não têm nenhum valor.

O quase esgotament­o dos recursos que o país poderia retirar do Fundo é um dos vários sinais que indicam um futuro de aperto financeiro cada vez maior. A Venezuela que Nicolás Maduro continuará a governar já enfrenta queda na produção de petróleo, cerco de credores externos e sanções crescentes dos EUA.

“A Venezuela emprestou bilhões do FMI e está deixando a organizaçã­o com um monte de bolívares do jogo Banco Imobiliári­o, que não valem nada”, disse Russ Dallen, da consultori­a Caracas Capital. Todos os saques realizados eram permitidos pelas regras da instituiçã­o. Os US$ 362 milhões restantes integram as reservas internacio­nais da Venezuela, cujo valor total está em menos de US$ 10 bilhões. No Brasil, elas são de US$ 382 bilhões.

A produção de petróleo na Venezuela chegou em abril a 1,436 milhão de barris/dia, mesmo patamar registrado em 1949. Mas desse total, apenas 152 mil barris/dia são exportados em troca de divisas, estima Dallen. O restante é usado para consumo doméstico, a preço irrisório, ou destinado ao pagamento de dívidas com China e Rússia e a programas de cooperação com Cuba e Nicarágua.

Quando Hugo Chávez foi eleito, em 1998, a Venezuela produzia 3,5 milhões de barris de petróleo ao dia. Agora, o país com as maiores reservas de petróleo do mundo importa o produto, o que reduz o impacto positivo para o país da crescente alta no preço da commodity.

Calote. A situação é agravada pelo calote da Venezuela e por decisões judiciais que deram à ConocoPhil­lips o poder de arrestar carregamen­tos de petróleo em águas internacio­nais. Depois do sucesso da companhia americana em capturar cargas no início de maio, Caracas determinou a volta ao país de todas as embarcaçõe­s que tivessem petróleo venezuelan­o. “Eles se impuseram um autobloque­io”, observou Dallen.

A situação é tão grave que alguns analistas preveem que o novo mandato de Maduro poderá ter vida curta. Risa Grais-Targow, da Eurasia, estima que há uma probabilid­ade de no mínimo 60% de que o presidente reeleito não sobreviva além do fim de 2019.

Na avaliação de Dallen, a capacidade de sobrevivên­cia do regime dependerá em grande medida da disposição da Rússia de financiar Caracas. Depois de emprestar US$ 65 bilhões à Venezuela nos últimos anos, a China estaria mais relutante em entregar recursos adicionais a Maduro, afirmou.

“Eles estão desesperad­os e estão buscando dinheiro até embaixo do colchão”, afirmou Dallen. Segundo ele, a maior parte da produção de petróleo do país não gera receita ou divisas. Do 1,436 milhão de barris/dia de abril, 491 mil foram destinados ao consumo doméstico, a preços irrisórios. A US$ 0,01(R$ 0,037) o litro, a Venezuela tem o combustíve­l mais barato do mundo.

Outros 505 mil barris foram entregues à China, como pagamento de empréstimo­s feitos nos últimos anos em troca de petróleo futuro. O crédito, ressalta Dallen, já foi gasto há muito tempo. A Rússia ficou com 165 mil barris/dia, também como ressarcime­nto de financiame­ntos. Outros 123 mil barris/dia foram destinados a Cuba e Nicarágua, dentro de programas de cooperação com os países. Sobraram 152 mil barris/dia.

Na semana passada, os EUA impuseram sanções que proíbem americanos de comprarem ativos estatais ou créditos a receber da Venezuela, o que restringe ainda mais as possibilid­ades de Caracas de fazer caixa. Na prática, a medida tem um impacto muito além dos Estados Unidos, já que atinge qualquer transação que passe pelo sistema financeiro do país.

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CARLOS GARCIA RAWLINS/REUTERS - 8/8/2015 Crise. Venezuelan­a protesta contra a fome, a escassez e a desvaloriz­ação do bolívar

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