O Estado de S. Paulo

Queda nos investimen­tos põe em xeque busca por mais risco

Cenário externo, taxa de juros no Brasil e crise dos combustíve­is minaram investidas mais arriscadas

- Jéssica Alves

A greve dos caminhonei­ros foi a cereja que faltava no bolo de surpresas que o mercado teve nos últimos meses. Tudo começou com a alta de juros nos Estados Unidos, passando pela crise na Argentina e, mais recentemen­te, com a surpresa da taxa Selic e a crise dos combustíve­is. Com o cenário bastante diferente do projetado no início do ano, o panorama favorável a aplicações de risco começa a mudar, sobretudo para o pequeno investidor.

O efeito da greve, segundo especialis­tas, veio para “acordar para a realidade” e mostrar que, até as eleições, o sobe e desce nas aplicações pode ser mais brusco do que se imaginava. Diante desse cenário, adotar postura mais conservado­ra pode ser um bom negócio.

Em maio a bolsa, que até poucos meses atrás poderia chegar aos 100 mil pontos, perdeu os 12% que tinha ganhado no ano e fechou no zero a zero. Na indústria de fundos houve resgate de R$ 23 bilhões. Até o dia 18 de maio, antes da greve dos caminhonei­ros, a indústria havia captado R$ 28 bilhões. No balanço divulgado na quarta-feira, contudo, o total adquirido até o dia 25 havia caído para R$ 5,1 bilhões, segundo a Associação das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Os fundos imobiliári­os também não foram poupados e recuaram 5,76%.

Até os produtos mais conservado­res da renda fixa sofreram. O IMA-B 5 +, índice da Anbima que mede os retornos de uma carteira composta de títulos atrelados à inflação com vencimento­s de mais de cinco anos, caiu mais de 4%. Pontualmen­te, títulos indexados à inflação com vencimento em 2045 chegaram a perder 11,6%, enquanto os papéis prefixados com resgate em 2025 caíam 7,4%. As perdas refletem a atualizaçã­o dos preços no mercado e só valem para quem quiser se desfazer do papel antes do prazo de vencimento.

“O mercado vinha ignorando um pouco a situação político econômica, achando que ela se resolveria num passe de mágica, mas o que aconteceu foi um choque de realidade”, explica Arnaldo Curvello, diretor da Ativa Corretora. Segundo ele, o mercado reagiu mal às concessões feitas pelo governo, o que pode piorar as contas públicas e a atividade econômica. Com essa nova realidade, não há motivo para ver nova euforia com a Bolsa.

Diferente da calmaria de fim de mês, Marcio Cardoso, sóciofunda­dor da Easynvest, afirma que os últimos dias foram atípicos. Parte do movimento foi de mudanças de posições, privilegia­ndo agora investimen­tos mais conservado­res, mas também teve quem aproveitou os baixos preços das ações.

“Ficamos pelo menos 12% mais barato”, resume o coordenado­r do laboratóri­o de finanças do Insper, Michael Viriato. Segundo ele, esse nível pode significar boas oportunida­des, mas o pulo do gato é saber se esse é só um desvio de rota ou é uma nova trajetória que vai se manter por mais tempo. Para Viriato, quem quiser entrar em produtos mais arriscados como Bolsa ou fundos de mais risco pode fazê-lo, porém com menos aporte do que previa.

Novas oportunida­des. Diante do novo cenário, Curvello, da Ativa, aconselha os investidor­es a olharem para os títulos prefixados de longo prazo. Isso porque a expectativ­a dos juros aumentarem no futuros está mais forte, o que favorece esses produtos. Para ele – um dos poucos que acertou a última decisão do Banco Central –, a autoridade monetária não deve elevar a taxa de juros até o fim da eleição, mas os papéis futuros já começam a precificar alguma alta.

Na quarta-feira os títulos acima de quatro anos já estavam pagando taxa perto dos 10%. Com o CDI, que baliza as operações em renda fixa, na casa dos 6%, os títulos estão com boa vantagem.

Para Viriato, o importante é carregar o papel até o final, para não ficar exposto a variações como da última semana. Além dos prefixados, ele aconselha os de longo prazo atrelados à inflação.

Quem ainda quiser risco, pode ter nos fundos imobiliári­o cotas mais baratas e que não sofrem tantos solavancos como a Bolsa, explica Viriato. Na maré do risco, a melhor aplicação em maio foi o dólar, que teve alta de 6%.

Ele diz que as aplicações atreladas à moeda americana têm dinâmica inversa da Bolsa, mas é tão volátil quanto, ou seja, requer sangue frio e pode não ser o mais indicado para o pequeno investidor.

 ?? WERTHER SANTANA/ESTADÃO–23/3/2018 ?? Curvello. “O que aconteceu foi um choque de realidade”
WERTHER SANTANA/ESTADÃO–23/3/2018 Curvello. “O que aconteceu foi um choque de realidade”

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil