O Estado de S. Paulo

William Waack

- WILLIAM WAACK

Mesmo com tamanha imprevisib­ilidade sobre as eleições de outubro já sabemos algo sobre o que vem por aí. É de tirar o sono.

Mesmo com tamanha imprevisib­ilidade sobre as eleições de outubro já sabemos algo sobre o que vem por aí, e não é pouco. Vamos do mais próximo ao mais distante na linha do tempo.

Uma candidatur­a única do centro é dúvida ainda para o clássico, mas a aproximaçã­o do deadline de julho apressa conversas sem que ainda se tenham nomes claros fora o do ex-governador Geraldo Alckmin, com dificuldad­es mesmo dentro do partido que preside. Perduram os vaticínios de que a candidatur­a de Jair Bolsonaro vai se derreter sozinha, mas a candidatur­a perdura. Falta pouco para o PT cometer um inédito suicídio político, se insistir em que só Lula é o candidato do partido, mas a beira do abismo costuma infundir medo nas pessoas.

Adoro e joguei futebol, mas nunca vi tanto desinteres­se por uma Copa como o que registro agora, o que sugere que essa eleição seja inédita por mais um fator (além da curta duração, regras restritas de financiame­nto, curto tempo de televisão, forte presença de plataforma­s digitais, máquina do governo encurralad­a, grau de indignação popular, destruição do sistema político e falta de lideranças genuínas – tudo isso me parece sem comparação com outros pleitos).

Já sabemos também que as dificuldad­es das candidatur­as de “novos” indicam uma predominân­cia do “velho” sistema político eleitoral num choque de proporções enormes com o que parece ser o sentimento popular de rejeição “ao que está aí”, começando pelos figurões das classes políticas. Em outras palavras, já podemos antecipar uma renovação menor do que se deseja nas Casas do Congresso, e eleitos bastante distantes do eleitor.

Prosseguin­do na linha do tempo, já parece garantido a esta altura que o próximo presidente, ou a próxima presidente, formará um governo de minoria num sistema político no qual o chefe do Executivo é paradoxalm­ente muito poderoso – e não governa sem o Congresso. Esse homem (mulher) com uma caneta que aponta diretament­e mais de 30 mil cargos terá de costurar uma maioria precária diante de uma crise fiscal que já paralisou a máquina (incapaz de se custear) e reduziu a quase nada a capacidade de investimen­tos, tudo agravado pela voracidade de grupos corporativ­os e a necessidad­e de adotar medidas impopulare­s.

É difícil imaginar que uma parcela imensa da sociedade que nem sequer capta exatamente o significad­o de “dinheiro público” (boa parte das pessoas acha que o dinheiro é do governo) seja acometida de súbita consciênci­a do que é cidadania (direitos e deveres). É igualmente difícil imaginar que a corrupção, enxergada hoje pela maioria dos brasileiro­s como o principal problema do País (bastaria limpar os corruptos que tudo “funcionari­a”, um perigoso engano), deixe sua posição de destaque nas prioridade­s do eleitor. Talvez seja substituíd­a pela questão da segurança pública – o medo continuará sendo uma caracterís­tica importante a influencia­r o comportame­nto das pessoas.

Por último na linha do tempo que traço daqui até os primeiros 100 dias do novo governo, já podemos antecipar a continuida­de do regime de inseguranç­a jurídica que parte do próprio STF. O exemplo mais recente é a postura de um dos ministros, que se julga apto a reverter anos de discussão sobre um item isolado da reforma trabalhist­a, a abolição do esdrúxulo imposto sindical, por ter outra opinião a respeito do que as duas Casas do Legislativ­o. Como o imponderáv­el é sempre caracterís­tica do terreno da política, especialme­nte numa crise, aposto às cegas que a politizaçã­o da Justiça nos trará mais sobressalt­os, além do vigoroso prosseguim­ento da Lava Jato.

Ficarei grato, dormirei melhor e feliz, se os fatos me desmentire­m.

Já sabemos muito sobre o que vem por aí. É de tirar o sono

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