ACORDO AMEAÇADO
Greve. Medidas acertadas para encerrar a paralisação dos motoristas desagradaram a vários setores e correm sérios riscos, com empresas ameaçando, por exemplo, ir à Justiça contra a tabela do frete; governo diz, porém, que está cumprindo o que foi prometid
Pressionado por vários setores, o governo enfrenta dificuldades para pôr em prática os principais pontos do acordo feito para acabar com a greve dos motoristas, como desconto de R$ 0,46 no litro do diesel e tabelamento do frete. O impasse tem deixado os caminhoneiros novamente inquietos. Planalto diz que está cumprindo o prometido.
1 PREÇO. Desconto no litro do diesel não chega a R$ 0,46, por causa da mistura do biodiesel. E a fiscalização dos postos é difícil
2 FRETE. Após pressão do agronegócio, tabela de preço mínimo do frete já está sendo revista. Tabelamento também pode ser questionado na Justiça
3 PEDÁGIO. Desconto está sendo dado para os caminhoneiros, mas concessionárias ficarão com buraco nas contas e Estados não querem arcar com custo
Menos de uma semana após seu lançamento, o pacote do governo para encerrar a greve dos caminhoneiros está ameaçado, por desagradar a outros setores e recorrer a medidas consideradas inconstitucionais. Se sobreviver e for implementado, ainda corre o risco de ser desmontado nos tribunais.
No Planalto, os auxiliares mais próximos do presidente Michel Temer temem pelo futuro das negociações, feitas sob pressão. E há grande preocupação com uma nova paralisação, apesar de agora o movimento não contar mais com o apoio das transportadoras. O medo é em relação aos grupos mais radicais de caminhoneiros autônomos.
Mas, para o ministro dos Transportes, Valter Casimiro, o acordo continua, porque o governo está cumprindo o que prometeu. Segundo ele, o Ministério dos Transportes mantém um “fórum permanente” para tratar do tema e não houve ameaça
Desconto de R$ 0,46 no litro do diesel
- Governo diz que valor pode ficar em R$ 0,41, por causa da mistura de biocombustível
- Não há como fiscalizar todos os postos
- A multa aos postos que não repassarem o desconto pode ser questionada na Justiça, por ser inconstitucional
Preço mínimo do frete
-Após pressão do agronegócio, tabela que define preço mínimo do frete já está sendo revista - Tabelamento também pode ser questionado na Justiça, por ser inconstitucional
pelos caminhoneiros de retorno à paralisação nas estradas.
Dúvidas. O governo recuou ontem da medida de maior visibilidade do pacote, o desconto de R$ 0,46 no litro do diesel. Em - O desconto está sendo dado, mas as concessionárias ficarão com um buraco em suas contas.
entrevista à rádio CBN, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, admitiu que o corte será menor: R$ 0,41. O argumento é que o desconto só incide sobre o diesel, mas o que é comercializado nos postos contém 10% de - Estados não querem arcar com o prejuízo e pedem compensação do governo federal
- Isenção pode ser questionada na Justiça
biocombustíveis, sobre o qual não houve corte. O raciocínio, porém, é refutado pela Aprobio, a associação dos produtores de biodiesel, que diz que o corte prometido se refere ao produto na saída da refinaria.
Além disso, após prometer o uso do “poder de polícia” para garantir o repasse do desconto aos consumidores nos postos, o governo passou a admitir, internamente, que as multas aplicadas pelos Procons podem virar alvo de batalha na Justiça, já que o preço dos combustíveis é livre. “Se multar, a Justiça derruba no dia seguinte”, disse Arthur Rollo, ex-secretário Nacional do Consumidor.
Uma fonte do Palácio do Planalto avaliou ontem que o governo perdeu o controle sobre outra questão que gerou grande pressão durante a paralisação: a periodicidade dos reajustes. Depois de muitas declarações desencontradas e do pedido de demissão de Pedro Parente da Petrobrás, a questão foi entregue à Agência Nacional de Petróleo (ANP), para uma consulta pública. Para esse interlocutor do presidente Temer, agora só resta “ficar na torcida”.
A tabela do frete mínimo, outra antiga reivindicação dos caminhoneiros atendida, está em revisão por pressão do agronegócio. No Planalto, há temor em contrariar um lado ou outro da disputa. A avaliação, além disso, é que o tabelamento é inconstitucional, porque fere o princípio da livre concorrência. Por isso, entidades empresariais consideram derrubar a tabela nos tribunais, se não ficarem satisfeitas com a revisão.
Outra medida adotada e que gera dor de cabeça é a isenção de pedágio sobre os eixos suspensos de caminhões vazios nas rodovias concedidas por Estados e municípios. As concessionárias deixaram de cobrar o pedágio, mas vão ficar com um buraco nas contas. E vão pedir medidas para reequilibrar seus contratos. A isenção do pedágio, determinada pelo governo federal sobre concessões que são de outras esferas de governo, também pode ter sua constitucionalidade questionada.