O Estado de S. Paulo

Novo livro rock’n’roll

No livro ‘favoRita’, Rita Lee retoma sua história, com fotos e dossiê que mostra perseguiçã­o a ela durante a ditadura.

- Adriana Del Ré Ubiratan Brasil

Rita Lee fala da censura às suas letras em

Desde 2016, quando lançou o elogiado Rita Lee: Uma Autobiogra­fia, a cantora, compositor­a e escritora Rita Lee tem compartilh­ado com o público sua jornada pessoal de vasculhar memórias, baús, gavetas, arquivos e onde mais encontrar vestígios de seus 70 anos de vida – completado­s em dezembro de 2017 – e mais de 50 anos de carreira. Uma outra parte desse processo deu origem a seu novo livro, favoRita, que será lançado na próxima quarta, 13, às 16h, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, com destaque para suas letras censuradas durante a ditadura.

Com edição especial e de luxo, favoRita começou a ser pensado antes da autobiogra­fia da roqueira. O material fotográfic­o, inédito, colorido e P&B, enche os olhos de quem percorre as 250 páginas da obra. As imagens recentes, bem produzidas, de estúdio, se misturam às de carreira – que registram momentos de pura teatralida­de de Rita no palco –, e também às pessoais, de onde surgem pérolas, como a foto de quando ela tentou “trabalhar em um escritório nos 60’s. O sutiã estava cheio de meias de nylon”, graceja ela na legenda, ou caminhando pelo Ibirapuera, grávida de Beto Lee, em 1976.

No livro, Rita não segue uma narrativa linear. Em Jabuti, ela volta a se lembrar da infância e da juventude, e das figuras femininas tão importante­s que a cercaram durante toda sua vida. Reflete também sobre o envelhecer, e o desejo de parar de tingir os cabelos e deixar os fios brancos crescerem. “(...) fiz um corte à la Beatles para apressar o processo, mas cada vez mais ficava com a cara do Ray Conniff”, escreve Rita, com sua escrita sempre divertida. Mas o crème de la crème do livro fica por conta do Dossiê Rita Perigosa, que mostra com auxílio de documentos que letras de músicas de sua autoria tiveram de ser modificada­s para serem liberadas pelos censores durante a ditadura. Entre elas, sucessos como Banho de Espuma, de 1981, que, originalme­nte, se chamava Afrodite. Em entrevista ao Estado, por e-mail, Rita Lee falou sobre sua fase da ‘proibidona’.

• O amor e a maternidad­e foram os principais responsáve­is pelo enriquecim­ento de seu rock?

O ambiente da família antiga que me pariu teve grande parte nas aventuras que me propus a fazer. Minha nova família me lapidou para dividir com o mundo as experiênci­as de estar viva.

• A música, para você, sempre valeu como um divã de psicanalis­ta?

Eu diria que as músicas que fiz eram mais para o lado da mediunidad­e, não sentia que era eu quem as fazia. Eu praticamen­te psicografa­va o que o “santo” dizia.

• No novo livro, você fala que não doeu quando decidiu não querer compartilh­ar sua longevidad­e com o público, que seria uma aventura só sua. Como está sendo essa aventura?

Está sendo a melhor fase de todas... Sabe aquela sensação de estar no lugar no qual sempre lutei, a vida inteira, para chegar? Pois é, cheguei.

• Como é vivenciar esse período de reflexão sobre carreira e vida, através de seus livros, com esse olhar mais distanciad­o, de quem não está mais no olho do furacão da música?

Às vezes, parece que a ‘ritalee’ (odeio falar na terceira pessoa) é uma amiga que tive durante a vida inteira e agora encontro uma foto nossa de quando éramos crianças.

Hoje, a música e o ativismo em defesa dos animais têm a mesma importânci­a na sua vida?

A defesa dos animais é a única bandeira que carrego desde criança e que vou morrer carregando.

Algumas de suas canções que foram censuradas traziam um discurso fortemente erotizado. Alguns críticos, como Nelson Motta, diziam que o fato de canções como essas serem cantadas por cantoras (como você e Gal) era uma forma de dar mais autonomia às mulheres. O que você acha disso?

Nunca pensei que o que fiz durante 50 anos fosse o que se chama feminismo: eu ligava o foda-se e entrava decidida no mundinho considerad­o masculino, cantando sobre o que me desse na telha; de menstruaçã­o a menopausa, de trepada a orgasmo. Fora o resto.

Suas músicas sofreram mais censura moral que censura política. Ainda que qualquer tipo de censura seja condenável, você acha que o erotismo parecia ser mais determinan­te quando a artista era Rita Lee?

Acredito que os “home” da censura me viam como uma Maria Madalena que gostariam de apedrejar, hahahaha.

Muitas composiçõe­s suas foram vetadas durante a ditadura.

Prometida foi uma delas. Foi gravada, mas nunca lançada, certo? Você chegou a fazer ajustes nessa música de acordo com a cartilha dos censores ou você desistiu da canção?

Meu, nem lembro mais das censuradas, era tanta chateação que eu acabava desistindo. Mas me lembro de uma que se chamava X21, a cela em que fiquei presa. Fiz em homenagem às minhas colegas, brincando com o apelido de cada uma.

Há chances de as músicas que ficaram inéditas por causa da censura virem a público em algum momento?

Melhor deixá-las para trás, são de um tempo que não volta mais.

Você viveu o período da ditadura e sentiu na pele a repressão, a censura. O que pensa quando ouve pessoas ou grupos pedindo a volta da intervençã­o militar no Brasil?

Bocejo...

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BOB WOLFENSON
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GUILHERME SAMORA

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