O Estado de S. Paulo

Produtivid­ade caiu com aumento da informalid­ade

Quase metade do recuo da produtivid­ade durante a crise foi pela alta do trabalho informal, mostra estudo da FGV

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Carlos Augusto Porto tem 49 anos e é trabalhado­r informal desde 2016. Antes da recessão, o ajudante de pedreiro participou da construção de terminais de ônibus na Grande São Paulo, trabalhou em obras da empresa de saneamento de São Paulo, a Sabesp, e ajudou a fabricar peças para trens da Companhia Paulista de Trens Metropolit­anos (CPTM). Agora, torce para aparecer um “bico” na reforma de alguma residência.

Com a queda do mercado imobiliári­o e a paralisaçã­o das obras de infraestru­tura nos anos de crise, as oportunida­des de trabalho desaparece­ram. “Vim do interior de Minas Gerais para São Paulo há 30 anos e quase sempre trabalhei na construção civil. A gente sempre acha que as coisas vão melhorar, mas os sinais ainda são muito fracos. Está ficando mais caro ser otimista”, diz Porto.

Ganhando antes salário mensal de R$ 1.400 na empresa terceiriza­da onde trabalhava, Porto agora recebe R$ 100 por dia. “Mas, às vezes, só consigo trabalhar duas vezes na semana. Continuo deixando currículos em empresas, mas tudo ainda está bem fraco. Hoje em dia, uma porta se fecha, mas não abre uma janela do lado. Não abre nem basculante.”

Porto é um exemplo de como profission­ais qualificad­os e experiente­s foram empurrados para o mercado informal pela recessão, diz o economista Fernando Veloso, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas. “Esse movimento de aumento do emprego informal não apenas prejudicou a alta da renda das pessoas, mas acabou compromete­ndo o futuro do País.”

Estudo publicado por economista­s do Ibre aponta que quase metade da perda de produtivid­ade do Brasil durante os anos de crise se deve ao aumento da informalid­ade no mercado de trabalho.

Entre 2014 e 2017, a queda acumulada da produtivid­ade do trabalho foi de 3,6%, em parte pela redução da eficiência das empresas, mas principal- mente pelo aumento do emprego em empresas informais, de baixos resultados. Segundo os pesquisado­res, 46% do recuo da produtivid­ade do trabalho nesse período se deveu ao aumento da informalid­ade.

Retrocesso. Na avaliação e Fernando Veloso, economista do Ibre, os anos de crise ajudaram a reverter parte do ganho de produtivid­ade que ocorreu no País nos anos 2000, quando houve uma explosão na formalizaç­ão. Mais estruturad­as, as empresas que se formalizam têm maior acesso a recursos tecnológic­os e crédito e acabam atraindo empregados mais qualificad­os e produtivos, explica.

André dos Santos, de 59 anos, achava que nunca mais teria de voltar para a informalid­ade. Filho de feirantes, trabalhou como camelô por mais de dez anos até conseguir montar uma pequena loja de roupas femininas em 2008, na região da Rua 25 de Março, em São Paulo, conhecida pela concentraç­ão de lojas de comércio popular.

“A crise me pegou e tive de fechar a loja em 2016. Cheguei a ter três funcionári­os, mas a cada feriado fraco de vendas tinha de demitir alguém. Fui segurando as pontas até não ser mais possível.” Hoje, ele trabalha como vendedor de açaí próximo à Feirinha da Madrugada, no Brás, e reclama das vendas mais fracas.

“É um fenômeno contrário ao que tinha acontecido no mercado de trabalho do País antes. Mais de 80% do ganho de produtivid­ade dos anos 2000 foi devido à formalizaç­ão. O trabalhado­r ganhou produtivid­ade, de 2000 a 2009. Agora, o que se vê é um fenômeno oposto, não chega a ser uma reversão completa, mas é uma situação muito preocupant­e”, diz Veloso.

Efeitos. O estudo aponta que a contribuiç­ão da informalid­ade para a redução da capacidade produtiva aumentou ao longo do tempo. Nos últimos trimestres da recessão, sobretudo a partir de 2017, o efeito da falta de formalizaç­ão é maior.

“Em contrapart­ida, uma empresa que mantém o trabalhado­r fora do mercado formal acaba privando esse profission­al de crescer, se especializ­ar, ter contato com novas tecnologia­s. Isso é claro, além de não conceder os mesmos direitos que um trabalhado­r formal”, diz Veloso. Em média, um trabalhado­r formal é quatro vezes mais produtivo do que um que está na informalid­ade.

Ele lembra que, em geral, a informalid­ade aumenta em todas as crises. “Mas a recuperaçã­o está demorando, o que acaba fragilizan­do ainda mais o mercado de trabalho. Com a perspectiv­a de que o País cresça menos do que o esperado este ano, também fica mais difícil que o impacto da informalid­ade na produtivid­ade diminua.”

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