O Estado de S. Paulo

O desmonte da recuperaçã­o

- JOSÉ ROBERTO MENDONÇA DE BARROS E-MAIL: JR.MENDONCA@MBASSOCIAD­OS.COM.BR

Desde o segundo trimestre do ano passado assistimos a uma recuperaçã­o da atividade que parecia bastante robusta. Embora o cresciment­o no ano tenha sido de apenas 1%, a evolução ao longo do tempo projetava algo como 3% a 3,5% para 2018.

Essa era minha expectativ­a, e ela se revelou um erro. De fato, durante o primeiro trimestre os números foram seguidamen­te frustrante­s, o que levou a uma redução nas projeções de cresciment­o feitas pela maior parte dos analistas, inclusive pela MB, para a faixa de 2,5%.

O que foi específico deste ano é que os setores que puxaram a recuperaçã­o continuara­m a performar bem no início do ano.

Falo de segmentos da indústria de transforma­ção, como bens de consumo duráveis e bens de capital, cujos resultados no primeiro quadrimest­re foram bastante bons. Os primeiros indicavam cresciment­o tanto em veículos quanto em utilidades domésticas e bens de consumo eletrônico­s, nesse caso estimulado­s também por uma importante expansão no crédito para as famílias.

Em máquinas, mencionamo­s mais de uma vez, uma situação também peculiar no mercado interno: apesar da ausência de grandes projetos novos, muitas companhias estavam repondo parte dos equipament­os desgastado­s e não substituíd­os nos últimos anos. Além disso, as exportaçõe­s de equipament­os foram muito boas até abril. Ainda no lado da produção, mineração e petróleo andam bastante bem, como atesta o bem-sucedido leilão na última semana.

Finalmente, o setor agropecuár­io conseguiu manter e até aumentar um pouco o elevado patamar de produção obtido em 2017. Do lado da demanda, exportaçõe­s e consumo das famílias davam suporte a esse desempenho.

O que não houve, e daí a frustração, foi a esperada difusão positiva sobre os segmentos que estavam mais atrasados, sendo que o mais importante deles foi a construção civil, na qual apenas o segmento do Minha Casa, Minha Vida segue relativame­nte bem.

Nas obras públicas, a falta de dinheiro é universal e, no setor de residência­s, o fenômeno da devolução de imóveis já comerciali­zados continua amassando o mercado. Com a construção não evoluindo, a redução do desemprego ficou mais lenta, o que deve explicar o mau desempenho do setor de bens de consumo não duráveis.

Em terceiro lugar está o segmento de bens intermediá­rios, no qual a questão não é apenas de uma demanda que anda pouco, mas muito mais do cresciment­o das importaçõe­s.

Tendências. Entretanto, em meados de maio configurou-se rapidament­e um cenário de crise, que resultou da confluênci­a de duas tendências, ruins e incertas, com dois fatos detonadore­s, o Copom e a greve dos caminhonei­ros.

A primeira tendência ruim é que o cenário internacio­nal, que vinha muito tranquilo, está claramente piorando. Na política, temos disputas dos Estados Unidos com China, Coreia do Norte e Irã e crises na Europa (Brexit, Europa Oriental, mudanças de governo na Itália e na Espanha).

Na área comercial, Trump briga com todo mundo e ameaça renegar todos os acordos já feitos, como o que já ocorreu com o TPP. Finalmente, a combinação de pleno emprego com política fiscal expansioni­sta e das tarifas está levando a uma alta dos juros e ao fortalecim­ento do dólar.

Nada disso é bom para o Brasil. Na política interna, depois do receio de uma polarizaçã­o Lula x Bolsonaro, veio o temor de uma final Ciro x Bolsonaro, resultado, inclusive, da grande fragmentaç­ão do chamado “centro democrátic­o”.

Essas incertezas encontrara­m na decisão do Copom em 16 de maio e na greve dos caminhonei­ros os detonadore­s da paralisia da economia e de uma crise nos mercados.

Se esta última poderá ser contornada com uma ação firme do Banco Central (como aconteceu na sextafeira), o enfraqueci­mento do governo não tem solução. Basta ver a péssima gestão da crise e as idas e vindas da tabela de fretes.

Independen­temente do que possa acontecer adiante, já temos uma vítima fatal: o cresciment­o de 2018.

ECONOMISTA E SÓCIO DA MB ASSOCIADOS. ESCREVE QUINZENALM­ENTE

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