Reunião desafia Trump a trocar ruptura por diálogo construtivo
Acapa da edição dessa semana da revista The Economist mostra o presidente Donald Trump manejando uma gigantesca bola de demolição – uma metáfora de sua política exterior. A revista o chama de “o demolidor” e faz um retrato alarmante. Amanhã, em Cingapura, quando se reunir com o líder norte-coreano, Kim Jong-un, Trump terá oportunidade de começar a mudar essa imagem. Conseguirá?
O prelúdio foi tudo menos suave. Anunciada de chofre, a cúpula pegou até alguns conselheiros de Trump de surpresa. Duas semanas atrás, ela fora cancelada abruptamente – por um chilique presidencial ou numa estratégia de jogador? Seja como for, o evento voltou rapidamente ao calendário.
O objetivo do encontro não mudou: o presidente quer que a Coreia do Norte concorde com uma completa, verificável, e irreversível desnuclearização. As expectativas, porém, mudaram. Antes, Trump queria ver tudo decidido em um único encontro. Agora já admite que a cúpula será apenas o primeiro passo de um longo processo.
Dúvidas persistem quanto à aptidão do presidente para as negociações. Trump diz que esteve se preparando “durante toda a vida”. Ele também afirma que tal evento necessita de pouca preparação. Os que já participaram de encontros do tipo riem da ideia. A confiança do presidente decorre de suas incontáveis negociações como executivo e empreendedor imobiliário. Nunca, porém, ele esteve envolvido em nada de tal complexidade e com tais possíveis consequências.
A cúpula poderá ser o tipo de evento que o presidente adora, com plateia mundial, repercussão midiática e tudo e todos focados nele (e no ditador norte-coreano, claro). Trump vem dizendo que está preparado para se retirar se as coisas não correrem bem, mas ele investiu para fazer da cúpula um sucesso. Dado seu pendor para a hipérbole e o exagero, é fácil imaginar os sorrisos, os apertos de mão e a retórica grandiosa.
A realidade é outra. Não será a primeira vez que os norte-coreanos discutem suas ambições nucleares nem será o primeiro acordo que fazem com outras nações. No passado, suas palavras se mostraram vazias. Como disse Leon Panetta, ex-diretor da CIA e ex-secretário de Defesa, “será difícil acreditar em qualquer coisa dita” na cúpula. “A premissa é ‘não dá para confiar em Kim’.”
Ao mesmo tempo, o sucesso em eliminar o programa nuclear da Coreia do Norte pode depender de os dois líderes conseguirem estabelecer uma relação de confiança mútua que possibilite negociações subsequentes entre seus assessores e conselheiros à medida que o processo avance. Para o presidente, isso pode ser mais difícil do que parece.
Ele tem se mostrado hábil em desenvolver relações aparentemente boas com outros líderes mundiais – e em seguida comprometêlas com palavras e ações inesperadas. Se o encontro for apenas um começo, como poderá ser avaliado? Analistas acham que um critério de avanço, além da química que possa ocorrer entre Trump e Kim, seria um quadro que inclua um compromisso explícito dos norte-coreanos, uma disposição de limitar seu programa de mísseis balísticos, e a aceitação de um sistema de verificação intrusivo.
Em troca, os EUA ajudariam a chegar a um tratado de paz entre as Coreias; prometeriam não invadir a Coreia do Norte; e eventualmente dariam ajuda econômica a Pyongyang. Tudo isso seria normal e esperado. “Normal” e “esperado”, porém, nem sempre constam do vocabulário do presidente americano. Na verdade, em sua presidência, Trump mais contrariou do que respeitou as regras da política exterior. Enquanto isso, ele ainda precisa fazer mudanças que devolvam os EUA a sua posição de força. Como escreveu Susan Glasser na revista The New Yorker, “Trump é melhor em romper do que em fechar acordos”.
“Não surpreende que tenhamos chegado a essa fase de ruptura levando-se em conta a personalidade de Trump e considerandose que está empenhado em agir à sua maneira”, disse Stephen Hadley, conselheiro para segurança nacional do presidente George W. Bush. “A pergunta agora é: ele pode ele fazer acordos diferentes?” A cúpula de Cingapura será um teste inicial para a capacidade de Trump de mudar – e sua disposição para isso.