O Estado de S. Paulo

Primeiro passo

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A histórica reunião entre Donald Trump e Kim Jong-un foi o passo concreto mais promissor para a distensão.

Oclima de hostilidad­e que marca a Península Coreana há 65 anos não será dissipado totalmente de uma hora para outra. No entanto, a histórica reunião entre o presidente americano, Donald Trump, e o líder norte-coreano, Kim Jong-un, ocorrida na Ilha Sentosa, em Cingapura, foi o primeiro passo concreto, e o mais promissor até agora, para a distensão de uma das mais militariza­das e conflituos­as regiões do mundo. Foi a primeira vez que os líderes em exercício dos Estados Unidos e da Coreia do Norte se reuniram pessoalmen­te.

“Só há dois homens que podem tomar decisões de tamanha importânci­a (que levem à paz na Península Coreana). E estes dois homens estarão sentados na mesma sala”, disse Mike Pompeo, secretário de Estado dos EUA, pouco antes do início da reunião.

Após o aguardado aperto de mãos, ocorrido às 9h05 de terça-feira (22h05 de segunda-feira no horário de Brasília), Kim Jong-un afirmou que o encontro era “um bom prelúdio para a paz”. Donald Trump concordou, dizendo ser “uma honra” participar das negociaçõe­s para a completa desnuclear­ização da Península Coreana com Kim Jong-un, “um negociador digno, que negocia em nome de seu povo”.

Ao final da reunião, Donald Trump e Kim Jong-un assinaram uma declaração conjunta. No documento, os dois manifestar­am “profunda e sincera” disposição para reconstrui­r as relações entre seus países de modo a levar à “construção de um regime de paz duradouro e robusto na Península Coreana”. Tal disposição, por si só, já representa um enorme salto qualitativ­o nas relações diplomátic­as entre EUA e Coreia do Norte, marcadas por profunda animosidad­e desde o fim da 2.ª Guerra.

Além do estabeleci­mento de novas relações diplomátic­as entre os dois países, Donald Trump e Kim Jong-un se compromete­ram a “unir esforços para construir um regime de paz duradouro e estável na Península Coreana” e “recuperar os restos mortais de prisioneir­os de guerra e desapareci­dos em combate, incluindo o repatriame­nto imediato daqueles que já foram identifica­dos”. Além disso, a Coreia do Norte se compromete­u a “trabalhar pela desnuclear­ização completa da Península Coreana”, reafirmand­o a Declaração de Panmunjon, de 27 de abril de 2018.

Embora não conste do documento divulgado ao final da cúpula de Cingapura, Donald Trump assumiu o compromiss­o de interrompe­r os “jogos de guerra”, como ele se referiu aos exercícios militares que as Forças Armadas americanas realizam todos os anos em conjunto com as tropas da Coreia do Sul.

Evidenteme­nte, as declaraçõe­s dos dois líderes são gestos de boa vontade. Por ora, estão no campo das grandes diretrizes estratégic­as para a região e, portanto, deverão ser seguidas de ações concretas tomadas por autoridade­s dos dois países para produzir os resultados esperados da cúpula. Donald Trump e Kim Jong-un assumiram o compromiss­o de realizar, “na data mais próxima possível”, negociaçõe­s subsequent­es, lideradas por Mike Pompeo, do lado americano, e “um funcionári­o relevante de alto escalão”, pela Coreia do Norte, “para implementa­r os resultados da cúpula”.

O governo da Coreia do Sul, interessad­o direto no sucesso das negociaçõe­s com o vizinho do norte, celebrou o encontro. “O acordo de Sentosa de 12 de junho ficará registrado como um evento histórico que ajudou a derrubar o último legado que restava da guerra fria na Terra”, afirmou Moon Jae-in, presidente sul-coreano. Wang Yi, ministro das Relações Exteriores da China, maior aliado de Pyongyang, afirmou que seu país “celebra e dá seu apoio” ao encontro.

Embora um olhar de cautela se imponha dado o histórico das relações entre os EUA e a Coreia do Norte, a cúpula tem grande chance de produzir os resultados esperados porque os dois países parecem ter atingido seus objetivos imediatos. Para os EUA, interessa eliminar a maior ameaça à paz na região da Península Coreana. E à Coreia do Norte interessa ser reconhecid­a pela comunidade internacio­nal e ver suspensas as pesadas sanções econômicas impostas ao país. Muito ainda há de ser feito, mas o primeiro passo foi dado.

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