O mundo está mais seguro depois da cúpula de Cingapura?
Bret Stephens / NEW YORK TIMES Não
Uma visão otimista do histórico encontro de Donald Trump com Kim Jong-un é que se trata da Genebra Revisitada deles – uma reprise da cúpula de 1985 entre Ronald Reagan e o líder soviético Mikhail Gorbachev que alterou o teor das relações entre as superpotências e levou ao fim da Guerra Fria.
Poderia o mesmo cenário desenrolar-se com a Coreia do Norte? Provavelmente não, por razões que teriam sido óbvias para a maioria dos conservadores antes do atual transtorno Trump. Em primeiro lugar, Trump não é Reagan, que agia em conjunto com os aliados. Trump descaradamente age contra eles. O método de negociação de Reagan: “Confie, mas confira”. Método autodeclarado de Trump: “Meu toque, minha percepção”. Reagan rejeitou ceder às exigências soviéticas de que deveria abandonar a Iniciativa de Defesa Estratégica. Trump rendeu-se imediatamente à insistência de Pyongyang de que os EUA deveriam suspender os exercícios militares com a Coreia do Sul sem receber nada em troca. O objetivo de Reagan era derrubar o governo do Partido Comunista em Moscou. O de Trump é preservar o de Pyongyang.
Em segundo lugar, Kim não é Gorbachev, cuja família sofreu os horrores do stalinismo. Kim nasceu em uma família que fazia o próprio povo morrer de fome. E Kim sabe o que aconteceu com Gorbachev, cuja queda espetacular serviu de lição aos ditadores de toda parte sobre a loucura de tentar reformar um sistema totalitário. Kim pode buscar uma versão da perestroika para evitar o colapso econômico, mas não haverá glasnost. A sobrevivência de seu regime depende domesticamente do terrorismo de Estado e internacionalmente de seu arsenal nuclear. Ele não abandonará nenhum dos dois.
Trump quer uma “conquista” de política externa em nome das eleições de meio de mandato, e talvez um Prêmio Nobel da Paz em algum momento antes da eleição de 2020. Kim planeja governar a Coreia do Norte até quando um dos filhos de Chelsea Clinton for presidente. O incentivo de Trump será fazer concessões adiante. Kim pode voltar atrás em suas promessas mais tarde.
Trump é um otário. Kim não é. Digam o que quiser sobre o déspota norte-coreano, mas consolidar o poder em seu regime de ninho de víboras, montando um arsenal nuclear confiável, melhorando sua economia sem atenuar o controle político, jogando uma arriscada diplomacia nuclear com Trump e depois, em poucas semanas, obter o prestígio de uma cúpula de superpotências são conquistas políticas de primeira ordem. Maquiavel sorri do túmulo. Quanto a Trump, o suposto sucesso da cúpula após o fracasso em Quebec remete ao amor inato pelo drama. Ele está onde adora estar: no centro das atenções de um mundo aturdido.
Eu ficaria feliz em estar errado. Ficaria emocionado em saber que Kim é um reformador de visão ampla disfarçada, por necessidade e desespero, como um vigarista. Também seria bom pensar que Trump está jogando uma partida de xadrez geopolítico num nível que os especialistas mal conseguem conceber. Os comentaristas políticos devem sempre manter a capacidade de se surpreender e admitir erros. Mas, por enquanto, é difícil ver o que a cúpula de Cingapura alcançou além de trair os aliados dos Estados Unidos, a nossa crença nos direitos humanos, a nossa história de sobriedade geopolítica e a nossa dependência do senso comum. Para quê? Uma foto com um glutão sinistro e seu colega norte-coreano?