O Estado de S. Paulo

Maioria é punida com uma ‘vida de oração’

- / J.C.

O que incomoda ainda as vítimas é que as punições não têm sido exemplares. Em 2014, Silvano Tomassi, embaixador do Vaticano na ONU, declarou que a Santa Sé investigou 3,4 mil casos entre 2004 e aquele ano – e 848 padres foram destituído­s. Mas outros 2,5 mil apenas foram enviados a mosteiros para que tenham uma vida de “oração e penitência”.

Para o francês François Devaux, também vítima de abuso sexual em sua infância em uma Igreja de Lyon, a estimativa é de que entre 4% e 5% dos padres no mundo podem estar envolvidos em algum tipo de crime. Na Austrália, os dados oficiais de uma investigaç­ão apontaram para 7% dos padres.

A avaliação de Devaux é de que a pressão popular tem obrigado o Vaticano a reagir. “Mas pedimos medidas urgentes”, disse. “Não queremos destruir a Igreja. A questão agora é como o papa vai lidar com o que ele mesmo reconheceu ser um problema”, completou.

O chileno José Andres Murillo, um dos que denunciara­m a situação em seu país ao papa Francisco e foi vítima de abusos, confirmou à reportagem a resistênci­a que ainda existe dentro do Vaticano para tratar do assunto. “Em um encontro que tive com o papa, eu sugeri que ele olhasse o que estava ocorrendo também na África. Mas ele me disse que não achava que ali era um problema grande. Eu lhe disse: o senhor está errado.”

Lição. Murillo ainda rejeita a tese de que Francisco não tinha informação sobre o que ocorria no Chile. “É impossível. Eu mesmo lhe entreguei tudo.” Mas a esperança, interna e mesmo entre as vítimas, é que o caso sirva de “lição” ao papa e o ajude a mudar de uma forma permanente sua convicção.

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