O Estado de S. Paulo

Decisão do Fed afeta câmbio e inflação

Alta de juros nos EUA pode levar a desvaloriz­ação do real e aumento de preços

- / ANA LUÍSA WESTPHALEN, ALTAMIRO SILVA JUNIOR e DOUGLAS GAVRAS

O Fed, banco central dos Estados Unidos, subiu a taxa de juros no país, ontem, em 0,25 ponto porcentual, para o intervalo entre 1,75% e 2%, e sinalizou que elevará os juros em um total de quatro vezes este ano – uma a mais do que era esperado no início do ano. O anúncio pressionou o mercado de câmbio ao redor do mundo. No Brasil, o dólar à vista fechou o dia a R$ 3,71, após intensas intervençõ­es do Banco Central.

Taxas mais altas nos Estados Unidos têm o potencial de atrair à maior economia do mundo recursos que antes estavam aplicados em outros mercados, como o Brasil. O resultado pode ser uma desvaloriz­ação da moeda brasileira – potenciali­zada por um cenário eleitoral completame­nte incerto. Desde janeiro, o dólar teve alta de 12% em relação ao real. “O brasileiro, o turco e o argentino: todo o mundo emergente vai ter de conviver com uma moeda mais fraca”, diz Fabio Silveira, da MacroSecto­r.

Um dos primeiros impactos do fortalecim­ento do dólar na economia brasileira pode ser uma pressão inflacioná­ria, já que muitos dos insumos do agronegóci­o e da indústria são importados. Os preços podem subir para o consumidor. As empresas brasileira­s também podem ter mais dificuldad­es para fazer emissões no exterior e levantar recursos, uma vez que os investidor­es vão exigir uma remuneraçã­o maior. “O custo do dinheiro fica mais caro e as companhias também podem repassar isso para os preços”, diz o economista Alexandre Cabral. Apesar de o dólar mais alto favorecer os exportador­es brasileiro­s, a volatilida­de da moeda também prejudica o planejamen­to de contratos.

Alguns analistas acreditam que a pressão do dólar sobre a inflação vai forçar o Banco Central a antecipar o aperto monetário, com possibilid­ade de um aumento dos juros no fim deste ano. Outros preferem enfatizar a comunicaçã­o dada até o momento pela instituiçã­o, de que a política monetária não será atrelada ao câmbio. A projeção majoritári­a de analistas ouvidos pelo Estadão/ Broadcast é de que a Selic, taxa básica de juros da economia, será mantida em 6,5% na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), prevista para os dias 19 e 20 de junho.

“É claro que a atuação do Federal Reserve merece um acompanham­ento, mas o cenário para emergentes já vem se mostrando desafiador há algum tempo e esse risco de alta de juros

nos EUA é um risco que já estava no mapa do BC”, avalia o economista da Tendências Silvio Campos Neto.

O aumento de ontem pelo Fed foi o sétimo do atual ciclo de aperto monetário do banco

central americano, que começou em 2015. Antes do comunicado, o mercado estava dividido tentando antecipar se seriam três ou quatro altas ao todo este ano, em meio a sinais de melhor desempenho econômico dos EUA. Em março, os juros já tinham subido 0,25 ponto porcentual, para o intervalo entre 1,5% e 1,75%.

A última vez em que a taxa superou 2% foi no final do verão de 2008, quando a economia estava contraindo e o Fed estava reduzindo as taxas para zero, onde permanecer­iam por anos após a crise financeira. Ontem, ao aumentar os juros, o Fed retirou sua promessa de manter a taxa

baixa o suficiente para estimular a economia “por algum tempo” e sinalizou que toleraria a inflação acima da meta pelo menos até 2020. “A economia está indo muito bem”, disse o presidente do Fed, Jerome Powell.

Real. No Brasil, para segurar altas mais agressivas no câmbio, ontem, o Banco Central entrou em ação. Logo após o comunicado do Fed, a autoridade brasileira anunciou seu terceiro leilão do dia de swap cambial tradiciona­l – equivalent­e à venda futura de dólares – injetando um total de US$ 4,5 bilhões.

Foi o maior volume diário de recursos desde que a disparada

do dólar começou e ainda tem mais cerca de US$ 8 bilhões para serem colocados entre hoje e amanhã, dentro do programa anunciado na semana passada que prevê a injeção de US$ 20 bilhões até o final desta semana.

Essa atuação, somada à perda de força do dólar ante outras divisas ontem, foi fundamenta­l para conter a valorizaçã­o da moeda no mercado doméstico.

Em meio à volatilida­de, o operador de câmbio da Spinelli, José Carlos Amado, avalia que o BC conseguiu “suavizar” o mercado. A moeda chegou a encostar nos R$ 3,73 ontem.

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JACQUELYN MARTIN/AP-13/6/2018

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