O Estado de S. Paulo

O peso da renúncia fiscal

m 2017, os benefícios e incentivos fiscais somaram R$ 354,7 bilhões. Essa renúncia é decisiva para que as contas do País se mantenham deficitári­as.

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O Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou com 22 ressalvas as contas do governo federal do ano passado. O principal problema apontado pela Corte foi o peso excessivo da renúncia fiscal nas contas.

Não chega a ser uma novidade, mas os números apresentad­os pelo TCU impression­am: em 2017, os benefícios e incentivos fiscais somaram R$ 354,7 bilhões, o que representa cerca de 30% da receita líquida do governo no ano.

Essa enorme renúncia fiscal é decisiva para que as contas se mantenham deficitári­as, ampliando a necessidad­e de aperto e cortes em diversas áreas, sem que a sociedade tenha ganhos que compensem tamanho esforço. Os únicos a lucrar com essa política são os setores que pagam menos impostos e recebem incentivos fiscais na presunção de que, com isso, serão estimulado­s a fazer investimen­tos e a abrir vagas. O pífio cresciment­o da economia e a lenta retomada do emprego comprovam que a eficácia da renúncia fiscal é, quando muito, duvidosa.

A despeito dessa evidência, não faltará quem continue a defender que este ou aquele setor receba algum tipo de privilégio. Argumentas­e, por exemplo, que certas regiões do País precisam de incentivos para seu desenvolvi­mento, razão pela qual os empreendim­entos que ali se instalam demandam benefícios fiscais que os recompense­m. Também se diz que pequenas empresas precisam de facilidade­s para cumprir suas obrigações tributária­s. Ou então argumenta-se que é preciso desonerar a folha de pagamento das empresas para que estas consigam contratar mais e ampliar a produção.

Todas essas explicaçõe­s são, em tese, bastante razoáveis, mas não tocam no ponto central do problema. Como os recursos públicos são finitos, sempre que algum grupo da sociedade recebe algum tipo de benefício, faltarão recursos equivalent­es para a prestação de serviços ou fornecimen­to de bens para outros setores. A questão é avaliar se esse desequilíb­rio irá resultar em progresso para o conjunto da sociedade, o que justificar­ia o privilégio concedido.

Por qualquer indicador que se use, contudo, não houve ganho significat­ivo com a renúncia fiscal apontada pelo TCU. Os benefícios distribuíd­os às indústrias para que investisse­m em tecnologia, por exemplo, não se traduziram em melhoria significat­iva da competitiv­idade nacional, e o que se observa é uma ânsia pela manutenção das políticas protecioni­stas contra a concorrênc­ia internacio­nal. Esse é apenas um entre tantos aspectos pelos quais a política de renúncia fiscal, do modo como é conduzida hoje, não se justifica.

Falta a essa política o essencial: planejamen­to, articulaçã­o, propósitos bem definidos e um bom sistema de controle. Os benefícios são concedidos em geral de acordo com critérios políticos e sem a necessária atenção a seus efeitos sobre o Orçamento. O debate parlamenta­r sobre a reoneração da folha de pagamentos, por exemplo, acabou resultando em um monstrengo que atendeu aos lobbies mais bem articulado­s. O mesmo aconteceu com o programa de parcelamen­to de débitos tributário­s, o Refis, que neste ano chegou a dar 70% de desconto nas multas e 90% de desconto nos juros, numa homenagem explícita ao calote. Não surpreende que entre os beneficiad­os estivessem alguns parlamenta­res endividado­s.

Essa leniência com dinheiro público se traduz em um Estado permanente­mente incapaz de cumprir suas funções básicas. Tal aspecto também foi destacado pelo TCU em seu relatório sobre as contas do governo. De acordo com o tribunal, se não houver reformas que reduzam os gastos obrigatóri­os, especialme­nte com a Previdênci­a Social e com o funcionali­smo público, em seis anos o governo não terá recursos para quase nada além disso – não haverá dinheiro para investimen­tos e a máquina pública chegará ao colapso.

Esses alertas têm que ser lidos com atenção pelos candidatos à Presidênci­a da República e ao Congresso. São uma clara demonstraç­ão de que em breve será praticamen­te impossível governar o País se a farra da distribuiç­ão de favores estatais não tiver um fim.

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