O Estado de S. Paulo

Fifa mantém esquema de luxo e ostentação

Dirigentes da Fifa mantêm rotina de luxo e ostentação durante o torneio

- Jamil Chade

Após ser abalada por uma série de escândalos, a Fifa banca hotéis e carros de luxo e paga diárias a seus convidados na Copa.

No lobby de um luxuoso hotel de Moscou, um dos cartolas do órgão mais importante­s da Fifa espirra. Segundo depois, um dos funcionári­os corre segurando comas duas mãos, como se fosse um tesouro, uma caixa de couro com lenços, quase fazendo uma reverência ao dirigente p araque eleposs alimpar o nariz. Junto comap ressaem servir, um desejo de“saúde ”.

Três anos depois de ser abalada pela prisão dese usdi rigentes e estar“clinicamen­te morta ”– nas palavras de seu próprio presidente, Gianni Infantino –, a Fifa pouco mudo uno estilo de vida dos dirigentes.

Tudo parece ter de remeter ao luxo e ostentação. Os hotéis usados para sua corte ainda são os mais caros da cidade e até as suítes de luxo estão reservadas para os auditores supostamen­te independen­tes da Fifa. Enquanto isso, motoristas com ternos impecáveis e seguranças promovem um balé de idas e vindas com carros negros pelas ruas de Moscou.

Para classifica­r os dirigentes mais importante­s e o restante, a Fifa dividiu o grupo de mais de mil pessoas entre “ouro” e “prata”. “Nunca menos do que prata para um dirigente de futebol”, brincou um dos responsáve­is pela organizaçã­o. O convite aos eventos lembram documentos que fazem referência­s às monarquias.

Cada uma das 210 federações nacionais ganha ainda, por dia, até US$ 1 mil para gastos pessoais de seus dirigentes, o que não inclui transporte, alimentaçã­o, hotel ou passagem aérea. O dinheiro é mesmo apenas para o benefício pessoal de cada um deles. E ninguém precisa prestar contas de como usou o cheque.

A Fifa apresentou nesta semana números que provam que sua saúde financeira está resgatada, com uma receita recorde de US$ 6,1 bilhões. O presidente da entidade, Gianni Infantino, garantiu que 73% da receita será gasta com o futebol. Mas isso também inclui gastos para as operações das federações, compra de carros ou mesmo reforma de prédios de sedes.

P orano, cada um dos 37 membros do Conselho da Fifa recebe US $250 mil par aira três reuniões, além devo o sem classe executiva e hotéis de luxo. Ao jornal The New York Times, uma das poucas mulheres no órgão, a italiana Evelina Christilli­n, admite que o valor não faz sentido. “Acho que ainda recebemos muito”, disse. Até houve um corte. Mas ele caiu de US$ 300 mil para os atuais US$ 250 mil.

A Copa de 2018 em Moscou deixa claro que as mordomias jamais sumiram para a aristocrac­ia do futebol, mesmo ficando abafadas por alguns meses.

Num jogo entre cartolas promovido pela Fifa durante a semana, para aproximar os dirigentes, a ordem era de que nada poderia faltar. Na beira do campo, garçons com gravata borboleta e bandejas de prata circulavam com garrafas de água para os “atletas” em campo.

Até mesmo a roupa é fornecida pela Fifa. Neste ano, um alfaiate e seu grupo de especialis­tas foi levado a Moscou para vestir os cartolas. Cada um deles era convidado a passar por uma ala do hotel para tirar as medidas e, depois, ir buscar o terno pronto. Nele, o nome “FIFA” é bordado com fios dourados.

Pedras preciosas.

Ao longo da semana, jantares e eventos para os dirigentes se proliferar­am por Moscou. Num deles, Abobacar Camara, representa­nte da Guiné – que já foi ministro de Defesa do país –, foi acompanhad­o da mulher. Vestida a caráter, ela chamava a atenção pelo número de pedras preciosas no pescoço, orelha e dedos. A Guiné é um dos países mais pobres do mundo. Em apenas dois dias na Fifa, o cartola recebe como benefícios em dinheiro o equivalent­e à renda média da população de seu país. Por ano.

Metade da população vive abaixo da linha da pobreza e 40% das crianças estão desnutrida­s. De 187 países avaliados pela ONU, Guiné é o 178.º pior em termos de índice de desenvolvi­mento humano (IDH).

Na quinta-feira, a reportagem do Estado foi a única a entrar na ala vip do estádio Luzhniki, na abertura da Copa do Mundo. Camarões, ostras, salmão e champanhe explicavam o motivo pelo qual, depois do fim do intervalo, centenas de cartolas nem se deram ao trabalho de voltar para assistir ao segundo tempo do jogo entre Rússia e Arábia Saudita.

Ali, presidente­s de países semidemocr­áticos e verdadeira­s ditaduras faziam questão de serem fotografad­os ao lado de exjogadore­s de futebol. Paciente, o presidente da Fifa, Gianni Infantino, atendia a cada convidado, enquanto no centro de todas as atenções estava Vladimir Putin.

Quando o concerto acaba, a festa continua. Num dos hotéis praticamen­te fechados pela Fifa, a recepção atendia, a partir das 2h da manhã, meninas com roupas mínimas que se esforçavam em dizer ao funcionári­o o nome de quem iriam visitar.

Um dirigente com muitas Copas do Mundo nas costas admitiu que a prática não é nova. Ele revela que, nos anos 80, nos hotéis do Mundial, os estabeleci­mentos ofereciam um livro com as fotos das meninas que os dirigentes poderiam chamar. A cobrança? Bastava mostrar a credencial da Fifa. “Eram outros tempos”, disse.

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JAMIL CHADE/ESTADÃO
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DMITRY ASTAKHOV/EFE1. Champanhe na sala vip do Luzhnik. 2. Putin entre os presidente­s do Quirguistã­o e o príncipe Saudita. 3. Nicolas Sarkozy, ex-presidente da França, com o presidente de Ruanda e Infantino
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ALEXEI DRUZHININ/EFE

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