O Estado de S. Paulo

Esquerda tem chance real pela primeira vez com ex-guerrilhei­ro

Propostas de ex-prefeito de Bogotá preocupam parte de um país tradiciona­lmente conservado­r

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Gustavo Petro, ex-guerrilhei­ro que governou Bogotá entre 2012 e 2015, luta para se tornar hoje o primeiro presidente de esquerda da Colômbia. O economista de 58 anos está atrás do candidato de direita, Iván Duque, em todas pesquisas sobre a disputa, mas sua presença no segundo turno tem preocupado muita gente num país tradiciona­lmente conservado­r.

As propostas de Petro de mudar o modelo econômico da nação, taxar proprietár­ios de terras improdutiv­as e abandonar o petróleo e o carvão, optando por energia limpa, têm assustado investidor­es. Alguns temem que as medidas que ele propõe possam transforma­r a Colômbia em outra Venezuela.

Conhecido por seus discursos inflamados no Senado contra a corrupção e os grupos paramilita­res de direita, Petro diz que seu despertar político começou em 1973, quando ocorreu o golpe militar que pôs fim ao governo do presidente socialista do Chile, Salvador Allende. A Colômbia descambou para a violência na mesma época, quando grupos guerrilhei­ros iniciaram uma onda de sequestros e ataques contra civis. Foi então que Gustavo Petro, filho de um professor, prometeu combater a oligarquia feudal e se uniu ao grupo guerrilhei­ro M-19.

Embora nunca tenha sido um combatente, o fato de se ligar ao hoje extinto grupo rebelde M-19, que invadiu a Suprema Corte do país em 1985, um ataque que deixou mais de 100 mortos, tem servido para alimentar

“A política do século 21 está entre a política da vida e a política da morte. Eu represento a política da vida” Gustavo Petro CANDIDATO DO MOVIMENTO COLOMBIA HUMANA

as críticas dos oponentes. Petro foi detido naquele ano por posse de armas e passou 18 meses na prisão, onde, disse, foi torturado.

Embora seja muito difícil para Petro conseguir que mudanças radicais sejam aprovadas pelo Congresso – seu movimento Colombia Humana conquistou somente seis assentos nas legislativ­as em março – ele diz que tentará fazer alianças com partidos de centro, esquerda e outros minoritári­os. Conhecido por seu estilo obstinado de administra­r e legislar por meio de decretos, Petro é criticado por viver em um condomínio fechado e usar sapatos de US$ 500.

Sua eleição para prefeito de Bogotá em 2011, o segundo maior posto na Colômbia depois da presidênci­a, foi vista como prova de que a política era o caminho a ser seguido pelos movimentos de insurgênci­a como Forças Armadas Revolucion­árias da Colômbia (Farc), que se desmobiliz­aram no ano passado e formaram um partido político.

Petro obteve 4,8 milhões de votos no primeiro turno. “Gustavo Petro representa um projeto claramente populista”, disse Andrés Molano, diretor do Instituto de Ciências Políticas Hernan Echavarria Olozaga. “Ele se apresenta como um outsider – um inimigo das elites e elaborou um discurso messiânico e antilibera­l que promete uma revolução, tanto econômica como política.”

Uma vitória de Petro poderia consolidar o frágil processo de paz que encerrou cinco décadas de guerra com as Farc, mas irritou muitos ao oferecer para seus comandante­s uma voz política e não uma cela.

Petro promete que a quarta maior economia da América Latina incluirá todos da sociedade, criando um sistema bancário público que vai garantir crédito barato para empresas de pequeno e médio porte e ampliando o ensino gratuito. A proposta poderá ser difícil. A economia continua frágil, uma nova onda de gangues criminosas envolvidas com o tráfico de drogas ocupou áreas outrora controlada­s pelas Farc e milhares de venezuelan­os chegaram ao país em busca de comida e trabalho.

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