O Estado de S. Paulo

‘Fauda’ amplifica ódio na 2ª temporada

Série disponível na Netflix mostra o sofrimento nos dois lados da fronteira entre Israel e os território­s palestinos

- Pedro Venceslau

Já disponível na plataforma Netflix, a segunda temporada da série Fauda amplifica o ódio e o sofrimento nos dois lados da fronteira entre Israel e os território­s palestinos.

A verossimil­hança é preservada, apesar de alguns deslizes pontuais. O principal deles é a desenvoltu­ra dos terrorista­s que circulam entre Tel-Aviv e Ramallah, na Cisjordâni­a, carregando bombas e armas.

Quem conhece a região sabe da dificuldad­e de cruzar a fronteira e como é minuciosa a verificaçã­o de documentos nos check points. Mas isso é um detalhe. A série ficou ainda mais perturbado­ra com a entrada em cena de uma organizaçã­o que causa calafrios no Ocidente: o Estado Islâmico.

Os protestos de ativistas pró-Palestina contra a Netflix registrado­s após a estreia da primeira temporada não se repetiram com a mesma intensidad­e. Depois de estrear na TV israelense em 2016, a série ganhou o mundo e conquistou a crítica após ser adquirida pela plataforma de streaming.

Para os não iniciados, Fauda é uma série de ação e suspense que, à primeira vista, parece uma versão israelense e fracionada do longa Tropa de Elite, de José Padilha.

A trama, porém, é ambientada

em uma das regiões mais turbulenta­s do mundo. Com diálogos em hebraico e árabe, Fauda coloca em cena um mosaico de polêmicas. Mas apesar da origem israelense, a série não trata com condescend­ência as autoridade­s e forças de segurança do país.

O primeiro-ministro, por exemplo, é um político ambicioso e com muitos esqueletos

no armário. A política propriamen­te dita é um jogo de chantagens e ameaças.

As estratégia­s da unidade de contraterr­orismo que comanda ação, por sua vez, contemplam a tortura bárbara como rotina de trabalho. O outro lado é pintado com cores fortes.

A lealdade, a fé e o fanatismo dos “mártires” escalados para abrir mão da vida com bombas

coladas ao corpo em nome da causa palestina se contrapõem ao oportunism­o político dos líderes das facções terrorista­s, que usam seus militantes como massa de manobra.

Mas também há afeto, amizade sincera e amor na complexa relação subterrâne­a entre representa­ntes dos dois mundos. Tudo é exacerbado em Fauda. Há uma urgência

na rotina que deixa todas as cores fortes.

A doce filha de um líder religioso assassino é obrigada pela mãe a abandonar em um ponto de ônibus o enorme urso que ganhou de presente em um hospital israelense. Todos se afastam achando que se trata de uma bomba.

Adolescent­es jogam bola nas ruas de Ramallah sem imaginar que uma tragédia está prestes a acontecer no momento em que um terrorista devora barras de chocolate Toblerone para aliviar a tensão.

Após terminar o último tablete, ele recebe de um aliado a encomenda tão esperada: gás sarin. O emissário explica então o procedimen­to: primeiro parece um resfriado, mas logo começa a sufocar. Então vem o vômito e, por fim, a morte.

Realismo A peça de resistênci­a de Fauda é a atuação de Lior Raz, cocriador da série e também protagonis­ta. É ele que interpreta o ex-agente Doron, que foi tirado de sua zona de conforto em uma vinícola onde vive com a família para participar de uma derradeira missão: matar um terrorista que todos achavam que já estava morto.

Seu time é formado por agentes que, como ele, estão na casa dos 40 anos. São pais de família carinhosos no pouco tempo livre que desfrutam e máquinas de matar em serviço.

A eles não é permitido pensar em nada além do alvo. Se isso acontecer, como diz um agente, a imagem de casa é capaz de petrificar o indivíduo e colocar tudo a perder.

Fauda é uma série que deixa marcas em quem assiste. Quem consegue chegar ao fim, nunca mais vê o conflito no Oriente Médio do mesmo jeito.

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RONEN AKERMAN Conflito. Apesar da origem israelense, série não trata com condescend­ência forças de segurança do país

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