A FRONTEIRA FINAL
Em uma era na qual indivíduos privilegiados buscam constantemente a próxima experiência para ficar obcecados, o espaço realmente continua como a fronteira final, um luxo que apenas 1% do 1% pode se dar ao luxo de pagar. Brad Pitt e Katy Perry estão entre os que, segundo relatos, gastaram US$ 250 mil em uma das espaçonaves Virgin Galactic, de Richard Branson, sem medo de um voo de teste de 2014 que matou um piloto.
Agora, uma empresa chamada Axiom Space está dando às pessoas com pilhas de dinheiro e um espírito aventureiro algo novo para cobiçar: a perspectiva de uma viagem de oito dias ao espaço que seja luxuosa, se não inteiramente confortável, e com um pouco do brilho da Nasa junto.
Circundando o piso de seu escritório forrado de carpete cinza em data recente, Mike Suffredini – veterano da Nasa, nativo de Houston e principal executivo da Axiom Space – parou em frente a um compartimento de madeira do tamanho de uma cabine telefônica. “Não é um quarto de hotel em Nova York”, disse com um encolher de ombros, como se estivesse se desculpando pelo tamanho da maquete inicial de uma cabine que ficará dentro de uma estação espacial comercial, entre as primeiras do seu tipo, que a Axiom está construindo. Uma mistura de hotel butique, acampamento especial para adultos e uma instalação do nível de pesquisa da Nasa, projetada para pairar aproximadamente 402 quilômetros acima da Terra.
A Axiom contratou Philippe Starck, designer francês que levou ousadia a tudo, de quartos de hotel a monitores de bebês, para equipar o interior de suas cabines. As paredes foram revestidas com um tecido acolchoado de cor creme parecido com camurça e centenas de minúsculas luzes LED que brilham em tons variados, dependendo da hora do dia e de onde a estação está flutuando, em relação à Terra. “Minha visão é criar um ovo confortável, amigável, onde as paredes sejam macias e se harmonizem com os movimentos do corpo humano em gravidade zero”, afirmou Starck, chamando o efeito pretendido de “uma primeira abordagem ao infinito”. “O viajante deve física e mentalmente sentir a ação de flutuar no universo.”
Na Nasa, Suffredini passou uma década gerenciando a Estação Espacial Internacional, a gigantesca instalação de 20 anos de pesquisa em órbita baixa da Terra. A maioria dos 60 funcionários da Axiom também vieram da Nasa. Isso dá a ele certa vantagem sobre Richard Branson, da Virgin Galactic, e Jeff Bezos, fundador da Amazon, que está supervisionando a Blue Origin, concorrente da Axiom no mercado de viagem espacial privada.
“O pessoal que está fazendo a Blue Origin e a Virgin Galactic estão indo aos limites do espaço – eles não estão entrando em órbita”, disse ele. “O que eles estão fazendo é uma experiência legal. Ela dá ao viajante uns 15 minutos de microgravidade e dá para ver a curvatura da Terra, embora não seja a mesma experiência que se obtém ao ver a Terra de cima e passar o tempo refletindo, contemplando.” E, naturalmente, postar no Instagram. “Haverá Wi-Fi”, confirmou Suffredini. “Todos estarão online. Podem telefonar, dormir, olhar pela janela.”
A estação projetada por Starck deve abrir em 2022, mas a Axiom diz que eles podem começar a enviar viajantes curiosos para a órbita já em 2020. Eles terão que se contentar com as acomodações comparativamente toscas da Estação Espacial Internacional, que está trabalhando com a Axiom.
A estação comercial da Axiom pode abrigar oito passageiros, incluindo um astronauta profissional. Cada um pagará US$ 55 milhões pela aventura, que inclui 15 semanas de treinamento, a maior parte no Centro Espacial Johnson, a dez minutos de carro da sede da Axiom e, possivelmente, uma viagem em um dos foguetes SpaceX, de Elon Musk. A viagem inaugural será de apenas US$ 50 milhões. “O custo vem do voo para cima e para baixo”, continuou Suffredini. “Passeios de foguete são caros.”
Na corrida ao espaço, a Aurora Station, um luxuoso hotel espacial construído pela Orion Span, outra empresa aeroespacial de Houston, anunciou em abril que cobraria US$ 9,5 milhões por passageiro por uma viagem de 12 dias, mas não mencionou o custo do passeio de foguete indo e voltando. (Enquanto isso, a NanoRacks diz que eles construirão “postos avançados” espaciais formados a partir de estágios de foguetes usados e criarão hábitats “próximos do espaço”, inclusive para turismo, e a Bigelow Aerospace diz que está colocando grandes cápsulas infláveis em órbita, embora o turismo não seja seu foco.)
Phil Larson, ex-assessor de política espacial do presidente Barack Obama, que também trabalhou para a SpaceX, não espera que os preços das viagens caiam acentuadamente nos próximos anos. “Essas empresas de hábitat e postos avançados são ótimas, mas precisamos resolver o custo de lançamento e o problema de transporte”, disse.
As barreiras à participação, além do custo? Ter 21 anos ou mais – não há limite de idade – e passar em um exame médico, administrado antes do início do treinamento, como no filme Os Eleitos – incluindo testes de espírito e coragem, como um giro em uma centrífuga humana (até os vídeos são difíceis de suportar). Os convidados da Axion serão obrigados a usar um traje espacial da Nasa para o passeio de foguete de e para a estação. (As características incluem um torso de fibra de vidro e um tubo de bebida para consumir pequenos goles de água. Além disso, uma fralda.)
Anos depois de Pierre Cardin, Paco Rabanne e Andre Courrèges imaginarem a moda da era espacial, a Axiom também está em negociações com uma luxuosa casa europeia de moda mas também se recusou a falar sobre as roupas de lazer que os viajantes podem usar quando estiverem atracados. “Eles serão personalizados para cada pessoa e podem ser personalizados com seu próprio logotipo, se quiserem”, disse Gabrielle Rein, diretora de marketing da Axiom. “É uma lembrança muito especial e parte de sua luxuosa experiência.”
Para se entender a grande escala dos planos da Axiom, ajuda saber que os astronautas, até agora, têm sido muito duramente tratados. Atualmente o Centro Espacial Johnson, onde eles são treinados, contém uma maquete em tamanho real da ISS, cujo interior bege é revestido de suportes de mão cinzentos para amarrar coisas e pessoas, devido à falta de gravidade. E não há chuveiros.
“Para as poucas pessoas que estiveram em órbita como turistas, a viagem não foi realmente uma experiência de luxo. Era mais como acampar”, disse Suffredini. A estação Axiom ainda terá suportes de mão, mas graças a Starck elas serão revestidas em ouro ou embrulhadas em couro macio, como o volante de um Mercedes. As cabines privadas da Axiom terão telas para assistir filmes – não há muito o que fazer lá, embora sair para fazer uma caminhada espacial seja uma possibilidade – e haverá uma grande cúpula com paredes de vidro para se reunir com os viajantes e ter uma vista mais panorâmica da terra, talvez com uma bebida.
“Vinho e coquetéis funcionam bem”, disse Michael Baine, engenheiro-chefe da Axiom. “Cerveja e bebidas gaseificadas não”. Você não tem a gravidade para separar o dióxido de carbono em seu estômago, causando muito inchaço. Os visitantes vão querer levar desodorante. “Há um compartimento de higiene onde você toma uma espécie de banho de esponja”, disse Suffredini.
Apaixonado por ditos folclóricos e explicações completas, Suffredini, que tem 59 anos, teve uma vida profissional girando em torno do espaço. Logo depois de sair, em 2015, tornou-se presidente da divisão espacial comercial da firma de engenharia Stinger Ghaffarian Technologies e, em 2016, lançou a Axiom, que já arrecadou mais de US$ 10 milhões em financiamento. “Eu era como todo mundo que viu Neil Armstrong andar na lua e decidiu que queria trabalhar na Nasa”, disse ele. Mas embora tenha supervisionado muitas missões, nunca esteve em órbita e não tem planos de usufruir do passeio. “Teríamos que descobrir quem vai cobrir meu custo”, comentou. Ainda assim, Suffredini vê o Axiom como um passo necessário na contínua pesquisa e desenvolvimento científico no espaço, que ele acredita ser crucial para a sobrevivência de nossa espécie. “Você precisa ser pioneiro.”
Décadas depois da disputa que foi travada entre as nações na Guerra Fria, agora são as empresas privadas que se lançam ao vazio e investem em turismo espacial