O Estado de S. Paulo

Turbulênci­as suspendera­m Tesouro Direto 29 vezes nos últimos 30 dias

Trava nas negociaçõe­s e queda dos papéis assusta investidor – que, porém, só leva prejuízo caso resgate antes do prazo

- Anna Carolina Papp Jéssica Alves

Nos últimos 30 dias, o Tesouro Direto teve emoção digna de Bolsa de Valores. As turbulênci­as, tanto no cenário externo como no interno, mexeram com os preços dos títulos a ponto de o Tesouro interrompe­r as negociaçõe­s da plataforma quase que diariament­e. Nesse período, foram nada menos que 29 suspensões – preocupand­o investidor­es que precisavam resgatar recursos ou que simplesmen­te viam seus títulos se desvaloriz­arem.

As suspensões por volatilida­de – o Tesouro pode interrompe­r as negociaçõe­s por outros motivos, como manutenção técnica – tiveram início no dia 17 de maio, depois de o Banco Central surpreende­r o mercado com a manutenção da taxa básica de juros (Selic) em 6,5% ao ano. Logo depois veio a greve dos caminhonei­ros, somada às tensões no mercado externo – que levaram à disparada do dólar.

Esse “pacote” piorou a percepção de risco do País e derrubou o preço dos títulos públicos prefixados e dos indexados à inflação. Diante da oscilação, o Tesouro Direto congela: suspende temporaria­mente as negociaçõe­s.

Em maio e junho, essas “travas” foram recorrente­s. Para efeito comparativ­o, em todo o ano de 2017, só houve interrupçã­o de compra e venda de títulos por volatilida­de em seis dias – sendo um deles no dia seguinte à divulgação da gravação de Joesley Batista, da JBS, dia em que o Tesouro nem abriu.

“As pessoas podem até ficar preocupada­s, mas a suspensão é uma medida positiva para ajustar o preço e as taxas dos títulos. Ou seja: para que quem compre e venda o faça a um preço justo de mercado”, explica Fábio Macedo, gerente comercial da corretora Easynvest.

Michael Viriato, coordenado­r do laboratóri­o de finanças do Insper, destaca também uma questão técnica. “Os preços do Tesouro Direto são atualizado­s só três vezes ao dia – às 9h30, 12h e 15h30 – , e não instantane­amente, conforme a oferta e demanda”, diz. “A suspensão é para evitar que ele compre caro demais, por exemplo.”

A preocupaçã­o do investidor com as suspensões recai principalm­ente sobre a liquidez diária, ou seja, a capacidade de transforma­r o investimen­to em dinheiro no bolso rapidament­e – que é um dos principais chamarizes do Tesouro Direto (veja a cronologia).

“Independen­temente de haver suspensão, após o fechamento do mercado, às 18 horas, o investidor sempre pode comprar ou resgatar”, explica Sergio Gesteira, gerente da mesa de operações do Tesouro Nacional. “A diferença é que a liquidação será feita no D+1, ou seja, no preço do dia seguinte.” Isso significa que a operação fica sujeita aos preços e taxas da abertura do mercado no dia seguinte. Macedo, da Easynvest, lembra que o investidor também pode agendar as aplicações – embora também fique sujeito ao preço de abertura.

Gesteira, do Tesouro, destaca que, além dos fatos pontuais do último mês, a oscilação mais expressiva é caracterís­tica de

ano eleitoral. “Uma das principais razões para volatilida­de em qualquer mercado são incertezas. E este ano, de eleição, ninguém sabe quem vai ser o próximo governo”, diz.

‘Marcação a mercado’. Com a turbulênci­a que faz o dólar disparar e a Bolsa cair chegando aos preços dos títulos públicos, o investidor muitas vezes se assusta. O Tesouro Prefixado 2025, por exemplo, teve desvaloriz­ação de 9,43% nos últimos 30 dias. Já o IPCA+ 2045 recuou 11,39% no período.

Esse tombo ocorre por causa da chamada marcação a mercado, que é a atualizaçã­o, normalment­e diária, do preço de um ativo de renda fixa ou da cota de um fundo de investimen­to. Esse mecanismo permite que o investidor saiba quanto receberia hoje se vendesse aquele título ou aquela cota – ou seja, com base na oferta e demanda por aquele papel, quanto o mercado está disposto a pagar por ele. Os títulos prefixados e os atrelados à inflação são os que sofrem marcação a mercado, sobretudo os de prazo mais longo. Já os títulos pós-fixados não, pois seguem a Selic diariament­e.

No último mês, com a piora das expectativ­as, o preço dos papéis caiu – na contrapart­ida, para quem fosse comprar, pagavam uma taxa maior. Nesses casos, aconselham especialis­tas, o investidor deve evitar resgatar o papel, pois irá perder dinheiro.

“Vale lembrar, porém, que o título se desvaloriz­ar não significa que o investidor vai ter prejuízo – só se ele vender o título”, explica Macedo, da Easynvest. Se o preço cair e o investidor seguir até o final do vencimento, explica, não sofrerá com a oscilação e terá exata rentabilid­ade acertada no momento da compra.

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