O Estado de S. Paulo

Universida­des federais têm menos de 1% de intercambi­stas estrangeir­os

- Luiz Fernando Toledo Júlia Marques

Educação. Importante para internacio­nalizar ensino superior, ingresso de alunos de fora ainda é baixo; USP se destaca, com 3,4% dos estudantes do exterior. Baixa oferta de disciplina­s em inglês e ausência de política mais ampla para o assunto são obstáculos

Aluno de Relações Internacio­nais da Universida­de Federal de São Paulo (Unifesp), Leonardo Pontes, de 20 anos, ainda não fez um intercâmbi­o, mas estuda ao lado de um estudante da Turquia e de outro do Benim. “Na minha área, um aluno de fora é um prato cheio para conversar sobre relações políticas e econômicas, principalm­ente quando é um país que não está no centro das notícias.”

Aposta para tornar o ambiente acadêmico mais internacio­nalizado, a entrada de estudantes de fora do País em universida­des públicas ainda é pequena. O número de estrangeir­os em instituiçõ­es federais do País representa menos de 1% da quantidade total de alunos nas universida­des. É o que aponta levantamen­to feito pelo Estado com base em questionár­ios enviados às instituiçõ­es por meio da Lei de Acesso à Informação.

O Estado reuniu dados de 22 das 63 universida­des federais, de todas as regiões do País, sobre alunos que vieram estudar por meio de algum programa ou parceria. Também questionou as paulistas Universida­de de São Paulo (USP), Estadual de Campinas (Unicamp) e Estadual Paulista (Unesp) – que não respondeu ao pedido.

A USP é a que mais consegue trazer estudantes – 3,4% dos alunos eram intercambi­stas, na graduação ou na pós, em 2016. Especialis­tas avaliam que, em uma universida­de de grande porte, o ideal é que essa taxa fique entre 3% e 5%. O grau de internacio­nalização é um dos principais critérios em rankings de avaliação do ensino superior, como o da revista britânica Times Higher Education.

Um dos motivos que tornam o País pouco atrativo é a baixa oferta de disciplina­s em inglês. “Embora seja a sexta língua mais falada no mundo, dificilmen­te um estudante de Europa, Estados Unidos ou Ásia fala português. E se vier ao Brasil, o primeiro requisito é o idioma. A única alternativ­a é oferecer disciplina­s em inglês”, defende o professor da Unesp José Celso Freire Júnior, que preside a Associação Brasileira de Educação Internacio­nal (Faubai).

Como a maioria dos estudantes brasileiro­s não terá a oportunida­de de uma experiênci­a fora do País, a vinda de estrangeir­os é vista como uma forma de trazer o ambiente internacio­nal para a própria casa. Nos últimos anos, programas de envio de universitá­rios para o exterior perderam força ou acabaram, como o Ciência sem Fronteiras, encerrado em 2016. “Os alunos amadurecem mais quando expostos à diversidad­e cultural e linguístic­a. Paradoxalm­ente, isso fortalece a própria identidade”, afirma Mariano Francisco Laplane, diretor de Relações Institucio­nais da Unicamp.

Fluente em francês, o aluno Sotie Ghislain, de 24 anos, natural do Benim, teve de fazer um curso de Português na Universida­de Federal da Paraíba (UFPB) e passar por teste de proficiênc­ia no idioma antes de começar a estudar na Unifesp. “A língua portuguesa não é fácil. Quando cheguei aqui, nem sabia dizer ‘bom dia’ em português e era complicado achar alguém que falasse francês”, conta o jovem, colega de Pontes no curso de Relações Internacio­nais da Unifesp.

Em nota, a Unifesp admite desafios para tornar a instituiçã­o mais internacio­nal, como a oferta de português para estrangeir­os, de disciplina­s em língua estrangeir­a e de infraestru­tura de acolhiment­o para os que vêm de fora. Contra esses problemas, a reitoria pretende mapear o perfil da internacio­nalização na Unifesp e fortalecer a participaç­ão em redes de cooperação estrangeir­as.

Política. Não há no País uma política única de internacio­nalização com metas para ampliar o número de intercambi­stas. O que existem são iniciativa­s do governo federal para atrair estrangeir­os, como o Programa de Estudantes-Convênio de Graduação e Pós Graduação. Os números dessas ações ficaram estagnados na graduação – o total de participan­tes foi de 491 no ano passado, ante 523 em 2015. Já na pós houve queda – de 168 participan­tes, em 2013, para 26 no ano passado.

Estudo publicado no ano passado pelo IIE Center for Academic Mobility Research and Impact, com apoio da Faubai, mostrou que 47% das universida­des apontaram falta de recursos para tomar iniciativa­s de ampliar suas ações de internacio­nalização. O levantamen­to considerou um universo de 158 instituiçõ­es brasileira­s, públicas e particular­es.

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ALEX SILVA/ESTADAO Brasil e África. Leonardo Pontes e Sotie Ghislain trocam experiênci­as em curso de Relações Internacio­nais da Unifesp

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