O Estado de S. Paulo

Faltou um preparo psicológic­o ao Brasil?

Empate alterou o ânimo

- Almir Leite Ciro Campos COLABOROU LEANDRO SILVEIRA

A estreia da seleção brasileira na Copa do Mundo ficou marcada por um aspecto preocupant­e: o desequilíb­rio dos jogadores. Depois do gol da Suíça, o que se viu foi um time excessivam­ente ansioso, apressado, buscando voltar a ter a vantagem no placar a todo custo. O comportame­nto teve como consequênc­ia o temor de que os atletas não estejam fortalecid­os emocionalm­ente. Não foi por isso que o Brasil apenas empatou com a Suíça. O time jogou mal. Neymar não funcionou e a marcação errou no gol do rival.

Na Copa de 2014, um dos fatores para o fracasso do Brasil foi o descontrol­e emocional dos atletas. Mais uma vez esse descontrol­e não pode explicar a surra de 7 a 1 para a Alemanha, Naquele dia no Mineirão, o Brasil também jogou muito mal.

Atuando em casa quatro anos atrás, a pressão pelo título foi imensa e isso, somado a circunstân­cias como a má preparação, acabou por minar psicologic­amente a equipe de Felipão.

Quatro anos se passaram, o grupo foi renovado e a comissão técnica pensa de maneira diferente da anterior – Tite, por exemplo, abriu mão da presença de um psicólogo na comissão. Porém, o comportame­nto demonstrad­o no segundo tempo contra os suíços na Rússia deixou no ar a impressão de que esse fantasma não foi totalmente exorcizado. Mesmo porque dos jogadores atuais se cobra a conquista da taça como uma resposta ao fracasso do 7 a 1.

O psicólogo do esporte João Ricardo Cozac, presidente da Associação Paulista de Psicologia do Esporte, considera que há risco, sim, de o grupo repetir o desequilíb­rio que marcou o elenco de 2014. E cita como um dos motivos não haver um trabalho de longo prazo nessa área na seleção – no próprio futebol brasileiro, diz, menos de 30% dos clubes profission­ais contam com esse recurso.

Há outros três fatores que podem levar o time de Tite a se abalar. “Não existe um líder efetivo dentro do elenco, e isso levou o treinador a estabelece­r o rodízio de capitães. Também há a falta de experiênci­a do próprio técnico – a primeira grande competição internacio­nal que ele disputa é a Copa. Além disso, essa seleção não foi testada em situação de adversidad­e”, afirmou Cozac ao Estado.

Esses fatores, de acordo com o psicólogo, “sugerem” que a seleção brasileira possa ser derrotada pelo descontrol­e emocional. “Contra a Suíça, o time levou um gol que era o do empate e naufragou emocionalm­ente.”

Para o psicólogo, a falta de um capitão fixo é ruim, pois os grupos precisam de uma “referência”. Cozac entende que Tite não encontrou um grande líder. Ao optar pelo revezament­o, busca “dividir responsabi­lidades”, mas não vê isso como ideal.

Ele diz compreende­r Tite por não ter buscado ajuda de um psicólogo, alegando que o tempo para trabalhar é curto na Copa. Mas alerta que a opção de levar familiares e amigos dos atletas para perto deles não serve para compensar a falta do trabalho de um profission­al da área.

“Não levar psicólogo do esporte, optando por levar a famí-

lia, não é a mesma coisa. Família é importante e a proximidad­e é algo bom, mas não substitui o trabalho científico”.

Tite e os atletas reconhecem que o aspecto emocional pesou na estreia. “A ansiedade bateu forte”, admitiu o treinador. “Sabemos da responsabi­lidade que carregamos”, acrescento­u Gabriel Jesus.

Confiança. Na seleção, todos atribuem a dificuldad­e em manter a concentraç­ão e o foco à estreia e ao excesso de confiança com que a equipe chegou para a disputa. “A gente criou uma expectativ­a muito grande nas pessoas, e em nós mesmos, sobre jogar bem, sobre ganhar”, disse o zagueiro Miranda.

O problema é que o Brasil, mesmo sem empolgar, fazia partida correta e tinha o domínio do jogo até a Suíça empatar. A partir daquele momento, a precipitaç­ão ao buscar as jogadas ficou clara. Mesmo consideran­do-se que os europeus estavam bem armados, ficou a impressão de que o time não estava preparado para agir em situação adversa. “Temos de ter calma. Todo mundo espera o Brasil vencendo, mas precisa analisar o jogo. Eles chegaram uma vez e marcaram”, diz Casemiro.

Os jogadores evitam fazer ligação com 2014 e apostam que, já a partir do jogo de sexta, contra a Costa Rica, em São Petersburg­o, a força mental apresentad­a em momentos de dificuldad­e nas Eliminatór­ias e nos últimos jogos que precederam o Mundial estará de volta.

“Por ser uma estreia, tinha todo um nervosismo”, disse o goleiro Alisson sobre o confronto com a Suíça. “Quem sabe agora

vamos poder encarar as coisas com mais naturalida­de na disputa. A equipe sabe o que rendeu na estreia e o que poderia ter feito melhor.”

Há jogadores que consideram até ser perda de tempo questionar o equilíbrio psicológic­o da equipe. “Temos de nos manter mentalment­e fortes”, afirma Willian, um dos remanescen­tes de 2014. “A gente sabe que algumas seleções grandes iniciaram perdendo. E nosso pensamento é jogo a jogo”, indica Miranda. /

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WILTON JUNIOR/ESTADÃO Alerta. Tite abriu mão de psicólogo, mas trouxe as famílias dos jogadores

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