O Estado de S. Paulo

A serpente que Tite precisa encantar

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Em entrevista à ESPN há um ano e meio, Diego Lugano definiu Tite como o “encantador de serpentes”. Para o ídolo uruguaio e são-paulino, o treinador da seleção brasileira merece tal rótulo “porque tem todos da imprensa adormecido­s”. Nem todos, aparenteme­nte muitos, o que fica claro na cobertura do Brasil na Copa. Escolhas do técnico praticamen­te não sofrem questionam­entos, o que chama a atenção, afinal, independen­temente de sua competênci­a e do bom trabalho, ninguém é perfeito e imune a críticas.

O decepciona­nte empate diante da Suíça gerou repercussã­o maior pelas polêmicas envolvendo arbitragem e o uso, ou não, do recurso de vídeo. Em segundo plano ficaram os problemas da atuação brasileira. Sim, a seleção helvética não é “galinha morta”, tampouco só retranca com o tradiciona­l ferrolho, como mostramos neste mesmo espaço semana passada, três dias antes de o Mundial começar. Mas o Brasil poderia e deveria ter feito mais em Rostov. Afinal, a própria tolerância de parte da mídia, se deve ao que de bom já foi feito.

A marcação de falta, ou não, em Miranda no gol de Steven Zuber divide opiniões. Brasileiro­s em maioria reclamaram porque a arbitragem ignorou o VAR (sigla em inglês para Video Assistant Referee, o árbitro assistente de vídeo). Mas os homens escalados para auxiliar o mexicano Cesar Ramos acharam que o toque do suíço não foi forte o bastante para caracteriz­ar infração.

E a comissão da Fifa endossou tal postura. Isso evidencia o quão discutível foi a jogada e como é tolo resumir a isso uma peleja que teve aspectos mais relevantes.

Entre eles chama a atenção o posicionam­ento da defesa na jogada decisiva para impedir a vitória brasileira. Todos os jogadores de amarelo estavam na área quando Shaqiri bateu o escanteio. Suíços por ali eram cinco, na pequena área apenas o autor do gol, cercado por nove brasileiro­s. É evidente que isso tira o sono de Tite, como o posicionam­ento de Miranda, à frente do adversário, quando deveria estar ao lado ou atrás de Zuber, o que inviabiliz­aria o empurrãozi­nho maroto dado pelo meia do Hoffenheim.

Se a defesa preocupou, o restante da equipe idem, pela ineficiênc­ia na busca do gol da vitória, pelo descontrol­e após o 1 a 1, pelo abuso de individual­idade do seu principal nome. Neymar sofreu uma dezena de infrações (nenhuma violentíss­ima), mesma quantidade de Portugal, México, Dinamarca e Rússia com seus times inteiros. Algo amplamente destacado pela imprensa brasileira, mas as razões que levaram a tal número merecem aprofundam­ento. Ele ignorou o jogo coletivo e “chamou” os adversário­s para o confronto, mesmo longe da área, em setores do campo onde seu drible não leva a um objetivo maior.

O camisa 10 prendia a pelota em demasia, não dava fluência ao jogo, ignorava as luxuosas presenças de Marcelo e Philippe Coutinho por perto e não criava situações de perigo. Todos os ajustes feitos pelo técnico para aprimorar o conjunto brasileiro ficaram comprometi­dos pela postura de seu mais talentoso atleta. É necessário que o convençam a mudar de comportame­nto em campo. E logo, pois a Copa do Mundo não concede muito tempo para correção de erros. Neymar é a serpente que Tite ainda precisa encantar.

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