O Estado de S. Paulo

Duas mostras e uma herança

Macaparana e Gullar estão em exposições de raiz neoconcret­a

- Antonio Gonçalves Filho

Aceitando sugestão do curador francês Franck-James Marlot, da galeria parisiense Denise René, que o representa, o artista pernambuca­no Macaparana reuniu no Museu Lasar Segall seus mais recentes trabalhos ao lado de sua coleção particular de mestres que o marcaram, de Albers a Willys de Castro, passando por Calder, Hércules Barsotti, Jean Arp, Max Bill e Volpi – todos representa­dos por obras expostas na sala anexa à mostra dos seus trabalhos inéditos. Não poderia, portanto, ser outro o nome o da exposição: Afinidades.

Em cartaz até 6 de agosto, ela segue em dezembro para o Paço Imperial, no Rio. Em São Paulo, são dez as obras de Macaparana. No Rio, serão 18. Elas não surgiram como releituras das obras dos artistas citados, mas com o propósito de revelar ao público o universo criativo do artista e suas afinidades eletivas. Convivendo desde a infância com o geometrism­o da arte popular pernambuca­na, Macaparana foi posteriorm­ente “adotado” em São Paulo, nos anos 1980, por dois mestres da arte neoconcret­a brasileira, Hércules Barsotti e Willys de Castro.

Naquele época, o artista explorava combinaçõe­s geométrica­s em obras de madeira reciclada, assemblage­s que remetiam ao trabalho do pintor uruguaio Torres García (1874-1949), criador do movimento Universali­smo Construtiv­o. Na Europa, Torres García ficou muito amigo do holandês Theo van Doesburg (1883-1931), um dos criadores do movimento De Stijl, embrião do neoplastic­ismo e da escola Bauhaus. Não por outra razão, a ordem mondrianes­ca exerceu enorme influência sobre o brasileiro, que apresenta na exposição do Museu Lasar Segall uma obra com referência direta às composiçõe­s em grade de Mondrian, pelas quais o pintor holandês ficou conhecido.

Pigmento e tinta acrílica sobre cartão lana, a referida obra tem as mesmas dimensões das outras nove em exposição (110 x 102 cm), todas derivadas da matriz construtiv­a que sempre guiou o trabalho de Macaparana, especialme­nte marcado pela arte concreta. Um dos artistas brasileiro­s com maior trânsito internacio­nal – o segundo número da revista alemã Kwer, que circula amanhã, traz trabalhos dele –, Macaparana conta que em setembro será a vez de Barcelona (Galeria A 34) ver sua nova produção (selecionad­a por Paco Rebés, o veterano marchand que trabalhou com Picasso e Miró).

A relação do artista pernambuca­no com ícones que fazem parte de sua coleção privada não passa pelo fetichismo. “Como convivo com essas obras diariament­e, cada vez que olho um trabalho é como se o visse pela primeira vez”, diz, esclarecen­do que não tinha a intenção de prestar tributo aos mestres, mas mostrar como as afinidades “sempre foram naturais” entre artistas. “Naturalmen­te, o movimento concreto marcou minha trajetória, mas não me vejo como herdeiro dele.”

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VALERIA GONCALVEZ/ESTADÃO Afinidades. Macaparana com obras de Willys de Castro e Barsotti à direita, referência a Mondrian; abaixo, desenho de Willys de Castro feito em 1958
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FOTOS MUSEU LASAR SEGALL (E);

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