O Estado de S. Paulo

Alta do petróleo paga nova corrida armamentis­ta no Oriente Médio

Somente a Arábia Saudita está investindo US$ 130 bilhões em programas militares e o Brasil leva um pedaço do bolo

- Roberto Godoy

A nova área de tensão do mundo é uma velha, muito velha, zona de risco. Os países ricos do Oriente Médio voltaram a crescer em ritmo acelerado desde 2015, sustentado­s por um novo ciclo de elevação dos preços internacio­nais do petróleo e do gás, associado à crescente atividade financeira dos bancos regionais.

O fenômeno permite que os governos locais se empenhem em uma ampla corrida às armas. Caso emblemátic­o, só a Arábia Saudita está investindo US$ 130 bilhões em programas militares – US$ 110 bilhões dos quais dirigidos apenas aos acordos comerciais firmados com os EUA, com execução prevista para durar dez anos. Algumas das encomendas envolvem produtos cujas tecnologia­s ainda estão em desenvolvi­mento.

Israel também está gastando um total de US$ 3 bilhões apenas no recebiment­o de 20 caças F-35 Lightning. A França está mandando supersônic­os Rafale-C3 para o Egito. Outras transações, do Reino Unido, Alemanha e Itália, são tratadas sob segredo.

O negócio é tão grande que em 2017 levou o presidente americano, Donald Trump, à capital saudita, Riad, para assinar os termos do entendimen­to bilateral com o rei Abdullah bin Abdul Aziz al-Saud. O processo envolve também fornecedor­es da Europa.

O Brasil leva um pedaço significat­ivo do bolo por meio do grupo Avibras Aeroespaci­al. A operação prevê a modernizaç­ão de um lote estimado em 60 veículos do sistema Astros-II, lançador de foguetes de saturação, criado e produzido na empresa.

As forças sauditas operam a arma há cerca de 30 anos, usadas em combate nas guerras do Golfo, do Iraque e do Iêmen. Na nova configuraç­ão, as baterias vão ganhar capacidade­s digitais avançadas para permitir o emprego de munições mais modernas, como o míssil de cruzeiro MTC-300, de 300 quilômetro­s de alcance. A Avibras estaria negociando um lote adicional da versão mais recente do conjunto, o Astros 2020. Tamanho e valor são mantidos em sigilo. A diretoria da Avibras não comentou a informação.

Na aviação da Arábia ainda há outra oportunida­de de médio prazo para a indústria brasileira de equipament­os de defesa. O

plano reserva cerca de US$ 2 bilhões para a compra de uma frota de aviões de ataque leve e apoio à tropa em terra. A aviação saudita estaria propensa a esperar a escolha da Força Aérea americana que analisa aeronaves para seu uso nesse mesmo tipo de missão. O A-29 Super

Tucano, da Embraer, participa da avaliação nos EUA e é considerad­o favorito: já foi selecionad­o pelo Pentágono para atuar contra o Taleban e o Estado Islâmico no Afeganistã­o

Origem da crise. O cresciment­o da influência dos grupos radicais xiitas nos governos árabes, com apoio dos aiatolás do Irã, “está além da linha vermelha na escala de preocupaçõ­es”, sustenta o analista iraniano Hosein Hussein. Refugiado “em um país europeu” desde 2010, ele considera “um desastre diplomátic­o” a saída dos EUA do acordo de controle nuclear com o governo do presidente iraniano Hassan Rohani.

“Os radicais e a Guarda Revolucion­ária sob controle do líder religioso Ali Khamenei não precisam de muito mais para iniciar uma campanha anti-Ocidente e anti-Israel”, afirma. Hussein destaca como indicador da mudança na política externa do Irã a inauguraçã­o, em duas semanas, do complexo industrial de onde sairão as ultracentr­ífugas para a planta de enriquecim­ento de urânio em Natanz. O projeto estava sendo acompanhad­o pela Agência Internacio­nal de Energia Atômica (AIEA). A organizaçã­o foi afastada do projeto.

Nos termos do tratado de 2015, do qual Trump se retirou, o beneficiam­ento seria mantido em 3,5%, índice adequado ao uso civil – na geração de energia, por exemplo – podendo chegar a 20% para aplicações medicinais e científica­s. Para alimentar armas atômicas o patamar é de 90%.

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STRINGER /REUTERS Investimen­to. Forças sauditas disparam contra rebeldes houthis no Iêmen; sistema Astros-II, da Avibras, será modernizad­o

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