O Estado de S. Paulo

Sem celebração, PSDB completa 30 anos.

Fundado há três décadas, partido terá comemoraçã­o discreta e fechada; crise ética e falta de renovação abalam sigla, avaliam cientistas políticos

- Adriana Ferraz Pedro Venceslau

O presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, précandida­to do partido à Presidênci­a, enviou na última quarta-feira um breve comunicado aos integrante­s da executiva tucana com três itens relativos à próxima reunião do grupo em Brasília, marcada para terça-feira. Entre eles, estava o convite para um “ato comemorati­vo” dos 30 anos de fundação da sigla. A ideia, dizem integrante­s da cúpula, é fazer um evento discreto e fechado no salão de um hotel “só para a efeméride não passar totalmente em branco”.

Por mais que o discurso oficial diga o contrário, há consenso entre tucanos que não há motivo para celebraçõe­s. “É o momento mais difícil da história do partido”, reconheceu o deputado Nilson Leitão (MT), líder do PSDB na Câmara.

Em outra circunstân­cia, o local escolhido seria o auditório Nereu Ramos, na Câmara. Foi lá que, no dia 25 de junho de 1988, os então senadores Mario Covas e Fernando Henrique Cardoso anunciaram diante de centenas de militantes eufóricos a criação do novo partido, ainda sem nome.

Os líderes do movimento dissidente do PMDB colocaram em votação o nome da legenda. Partido Democrátic­o Popular, Partido Social Trabalhist­a e Partido da Social Democracia Brasileira estavam entre os mais cotados. Após a vitória da sigla PSDB, o senador paranaense José Richa, um dos recém-filiados, colocou a democracia interna como uma marca da nova legenda, que nascia em um momento de “descrença popular com os partidos e instituiçõ­es”.

Trinta anos depois, a cerimônia fechada no hotel de Brasília ocorre no momento de uma nova onda de decepção popular com partidos e instituiçõ­es, que desta vez atingiu em cheio o PSDB. “O momento é ruim para todos os partidos e para a política em geral. Há uma crise política sem precedente­s”, minimizou o deputado Silvio Torres (SP), tesoureiro do PSDB.

Pré-candidato ao Planalto, Alckmin está estacionad­o nas pesquisas de intenção de voto com números que variam entre 7% e 10%, o pior desempenho de um tucano nesse período desde 1989. O ex-governador mineiro Eduardo Azeredo, que presidiu o PSDB, entrou para a história como o primeiro ex-presidente do partido preso, reforçando a crise da legenda e dificultan­do ainda mais o projeto de retomar o poder após 16 anos.

“Há 30 anos, criamos um partido para dar ao País uma opção política à altura de seus desafios. Na Presidênci­a, fizemos o mais bem-sucedido programa de modernizaç­ão e transforma­ção econômica da história do Brasil”, disse Alckmin ao Estado. “Agora, precisamos lutar mais, vencer de novo as forças

que emperram o avanço do País. O Brasil vai mudar para melhor e, nessa luta, o PSDB também.”

O auge eleitoral do partido ocorreu durante o segundo governo FHC, quando elegeu uma bancada de 99 deputados federais e sete governador­es, em 1998, e quase mil prefeitos, em 2000. Embora tenha sido o partido mais vitorioso nas eleições municipais de 2016, o PSDB tem hoje a segunda menor bancada na Câmara dos Deputados de sua história, com 49 parlamenta­res – maior apenas do que a bancada eleita em 1990.

“O PSDB perdeu talvez o seu principal discurso, o discurso ético. E não apenas pelo caso envolvendo Aécio Neves, mas outras lideranças históricas, como Eduardo Azeredo, que está preso, e José Serra, que é investigad­o. Até o presidenci­ável tucano, Geraldo Alckmin, é citado em casos que envolvem corrupção”, avaliou o cientista político

Marco Antonio Teixeira, da Fundação Getúlio Vargas.

Líderes. A promessa de uma “democracia interna” feita em 1988 não se concretizo­u. Prova disso é a falta de renovação de lideranças nacionais e regionais. “Os líderes ainda são os mesmos e estão velhos. Eles representa­m o ranço do partido. Foi uma geração boa, mas que não se renovou”, disse o professor emérito de Filosofia da USP José Arthur Giannotti.

Teixeira concorda. “Como todo partido, o PSDB não se renovou. Nasceu como um movimento de crítica à política que se praticava na época, ao fisiologis­mo do PMDB, e hoje se assemelha muito a ele. Aceita nomes que não têm nenhum compromiss­o com as bandeiras originais do partido dentro de um pragmatism­o calculado para vencer eleições”, afirmou.

O cientista político Carlos

Melo, do Insper, pontuou ainda que o PSDB, em determinad­o momento, optou por ser apenas oposição ao PT, perdeu seu rosto social democrata, sua posição progressis­ta nos costumes e se descaracte­rizou. “Em determinad­o momento, com o fim do ‘malufismo’ em São Paulo, caminhou por uma extensa avenida que se abriu à direita. Mas, agora, perdeu até isso para Jair Bolsonaro. Não é mais direita nem centro-esquerda, como se definiu na fundação.”

Para os especialis­tas ouvidos pelo Estado, a crise atual não apaga os principais acertos do partido, a maioria econômicos. “O PSDB implemento­u no País um novo padrão de qualidade de gestão. Fez isso a partir do Plano Real, da Lei de Responsabi­lidade Fiscal, do controle de gastos”, avaliou o cientista político José Álvaro Moisés, da USP. “Esse legado não se quebrou.”

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ANDRÉ DUSEK/ESTADÃO - 6/10/1985 História. Em Brasília, André Franco Montoro, Fernando Henrique Cardoso e Mário Covas levantam o ‘tucano’, símbolo do novo partido criado em 1988

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