Boemia matutina
Bares da Vila Madalena abrem mais cedo para receber a torcida verde-amarela
Era manhã de segunda-feira, mas parecia feriado. Reduto boêmio de São Paulo, a Vila Madalena, na zona oeste, acordou cedo para torcer pelo Brasil no jogo contra o México, pelas oitavas de final. Ao som de bandas de pagode, os bares abriram às 10 horas – boa parte cobrou ingresso, que ia de R$ 10 a R$ 120, com open bar de gin-tônica, cerveja, mojito: mas nada de tequila, bebida típica dos adversários.
Para evitar os “filões” que costumam assistir aos jogos da calçada – e evitar aglomerações nas ruas, algo que os moradores não queriam nesta Copa –, estabelecimentos colocaram bandeiras do Brasil e faixas verdes e amarelas nas entradas, tapando a visão de TVs que transmitiam a partida. A torcida ficou concentrada dentro dos bares.
Na Rua Aspicuelta, dois estabelecimentos, um praticamente ao lado do outro, ofereciam bebida à vontade das 10 às 14 horas. “Está bombando”, comentou Elaine Melo, de 40 anos, gerente do Boteco Todos os Santos, um dos que trabalharam no sistema open bar. “A gente esperava que o movimento fosse menor, por se tratar de uma segunda de manhã e a maioria dos frequentadores ter de voltar ao trabalho às 14 horas.” No vizinho, a animação não era tanta. “A demanda está menor do que nos outros jogos da Copa”, disse um funcionário do Vila 567.
Com um chapéu tipo pescador com a bandeira do Brasil gravada, o estudante Thiago Cordeiro, de 21 anos, estava animado para festa. De férias, aproveitou para beber à vontade, acompanhado de três amigos. “Você é supersticioso?”, perguntou. “Eu não era, mas o único jogo que o Brasil empatou, as abas estavam para cima”, afirmou, mostrando que o chapéu estava com as abas para baixo.
Perto dali, o torcedor Guilherme Lopes, de 36 anos, foi acompanhar a seleção com a mulher e o filho de apenas 4 meses. “É a primeira Copa dele”, disse. Antes do jogo, estava confiante. “Em todos os bolões eu pus o Brasil campeão.” Para não perder a partida, chegou mais cedo no trabalho e “acelerou”. “Fiz tudo que tinha de fazer. Meu chefe chega daqui a pouco.”
Vigilância. No cruzamento da Rua Fidalga com a Morato Coelho, havia mais policiais militares do que torcedores. Uma viatura do 23.º Batalhão Metropolitano, estacionada na esquina, além de motos e do carro do Batalhão de Choque vigiavam a região. Com maior concentração de pessoas, a segurança era motivo de preocupação na Copa. Recentemente, a zona oeste registrou uma série de arrastões em bares e restaurantes.
Com o clima tranquilo, muitos policiais e funcionários da Prefeitura, que trabalhavam na fiscalização da área, aproveitaram para dar uma espiada no jogo. Afinal, sempre tem um bar ou outro que não “bloqueia” a TV.
No Seu Domingos, na Fidalga, que normalmente abre às 15 horas, as 273 mesas estavam ocupadas. O bar não cobrou entrada, mas fazia controle de acesso com pulseirinhas. “O jogo está difícil, não dá para esperar outra coisa”, narrou Galvão Bueno, aos 35 minutos do primeiro tempo, ainda 0 a 0. Uma onda de gritos nervosos ganhava o espaço a cada investida de Chicharito Hernández ou defesa de Alisson.
Mesmo após o início do jogo, muitas pessoas ainda procuravam um bar para beber. “Aqui não, que grita gol depois”, reclamou um passante, após perceber o delay na transmissão.
Da calçada, o percussionista Paulo Ataíde, de 30 anos, não desanimava. “A Copa emociona, a nação é sofrida, tem muito desemprego, mas o futebol faz a gente esquecer tudo”, afirmou. Do seu lado, estavam as duas filhas, Samantha e Sara, de 6 e 5 anos, respectivamente. A primeira usava uma camisa de Neymar. A segunda, de Philippe Coutinho. “A Vila Madalena faz com que eu me sinta no Pelourinho”, disse o músico, de Salvador.
Nem todos estavam tão felizes. “Moro aqui há oito anos, é bom torcer um pouquinho para o Brasil”, disse o italiano Marco Muraro, de 38 anos. “Mas é triste ver a Itália fora da Copa.”
O aposentado Durval Brito, de 70 anos, vestia uma camisa da seleção com todos os títulos do Brasil bordados. “Já bordei o da Rússia aqui, olha”, mostrou. No intervalo, estava nervoso. “Neymar tem de começar a aparecer. Parece que não quer ser o melhor do mundo!”
E Neymar apareceu. Primeiro, Willian arrancou pela esquerda e, segundos antes de o camisa 10 entrar de carrinho, o bar de trás antecipou o desfecho do lance, gritando gol. Alegria com delay. Perto do fim, o craque da seleção arrancou para servir Roberto Firmino. Mais abraços, gritaria e buzinas.
Fatura liquidada, um homem subiu na cadeira do bar e, com um megafone, puxou um Bella
Ciao, versão Copa da Rússia. “Messi, tchau! Messi, tchau! Messi, tchau, tchau, tchau!”, cantou o bar inteiro. “E o argentino já está chorando, porque o hexa vem aí.”
A Copa emociona, a nação é sofrida, tem desemprego, mas o futebol faz a gente esquecer tudo
Paulo Ataíde,
PERCUSSIONISTA