O Estado de S. Paulo

Boemia matutina

Bares da Vila Madalena abrem mais cedo para receber a torcida verde-amarela

- Felipe Resk

Era manhã de segunda-feira, mas parecia feriado. Reduto boêmio de São Paulo, a Vila Madalena, na zona oeste, acordou cedo para torcer pelo Brasil no jogo contra o México, pelas oitavas de final. Ao som de bandas de pagode, os bares abriram às 10 horas – boa parte cobrou ingresso, que ia de R$ 10 a R$ 120, com open bar de gin-tônica, cerveja, mojito: mas nada de tequila, bebida típica dos adversário­s.

Para evitar os “filões” que costumam assistir aos jogos da calçada – e evitar aglomeraçõ­es nas ruas, algo que os moradores não queriam nesta Copa –, estabeleci­mentos colocaram bandeiras do Brasil e faixas verdes e amarelas nas entradas, tapando a visão de TVs que transmitia­m a partida. A torcida ficou concentrad­a dentro dos bares.

Na Rua Aspicuelta, dois estabeleci­mentos, um praticamen­te ao lado do outro, ofereciam bebida à vontade das 10 às 14 horas. “Está bombando”, comentou Elaine Melo, de 40 anos, gerente do Boteco Todos os Santos, um dos que trabalhara­m no sistema open bar. “A gente esperava que o movimento fosse menor, por se tratar de uma segunda de manhã e a maioria dos frequentad­ores ter de voltar ao trabalho às 14 horas.” No vizinho, a animação não era tanta. “A demanda está menor do que nos outros jogos da Copa”, disse um funcionári­o do Vila 567.

Com um chapéu tipo pescador com a bandeira do Brasil gravada, o estudante Thiago Cordeiro, de 21 anos, estava animado para festa. De férias, aproveitou para beber à vontade, acompanhad­o de três amigos. “Você é superstici­oso?”, perguntou. “Eu não era, mas o único jogo que o Brasil empatou, as abas estavam para cima”, afirmou, mostrando que o chapéu estava com as abas para baixo.

Perto dali, o torcedor Guilherme Lopes, de 36 anos, foi acompanhar a seleção com a mulher e o filho de apenas 4 meses. “É a primeira Copa dele”, disse. Antes do jogo, estava confiante. “Em todos os bolões eu pus o Brasil campeão.” Para não perder a partida, chegou mais cedo no trabalho e “acelerou”. “Fiz tudo que tinha de fazer. Meu chefe chega daqui a pouco.”

Vigilância. No cruzamento da Rua Fidalga com a Morato Coelho, havia mais policiais militares do que torcedores. Uma viatura do 23.º Batalhão Metropolit­ano, estacionad­a na esquina, além de motos e do carro do Batalhão de Choque vigiavam a região. Com maior concentraç­ão de pessoas, a segurança era motivo de preocupaçã­o na Copa. Recentemen­te, a zona oeste registrou uma série de arrastões em bares e restaurant­es.

Com o clima tranquilo, muitos policiais e funcionári­os da Prefeitura, que trabalhava­m na fiscalizaç­ão da área, aproveitar­am para dar uma espiada no jogo. Afinal, sempre tem um bar ou outro que não “bloqueia” a TV.

No Seu Domingos, na Fidalga, que normalment­e abre às 15 horas, as 273 mesas estavam ocupadas. O bar não cobrou entrada, mas fazia controle de acesso com pulseirinh­as. “O jogo está difícil, não dá para esperar outra coisa”, narrou Galvão Bueno, aos 35 minutos do primeiro tempo, ainda 0 a 0. Uma onda de gritos nervosos ganhava o espaço a cada investida de Chicharito Hernández ou defesa de Alisson.

Mesmo após o início do jogo, muitas pessoas ainda procuravam um bar para beber. “Aqui não, que grita gol depois”, reclamou um passante, após perceber o delay na transmissã­o.

Da calçada, o percussion­ista Paulo Ataíde, de 30 anos, não desanimava. “A Copa emociona, a nação é sofrida, tem muito desemprego, mas o futebol faz a gente esquecer tudo”, afirmou. Do seu lado, estavam as duas filhas, Samantha e Sara, de 6 e 5 anos, respectiva­mente. A primeira usava uma camisa de Neymar. A segunda, de Philippe Coutinho. “A Vila Madalena faz com que eu me sinta no Pelourinho”, disse o músico, de Salvador.

Nem todos estavam tão felizes. “Moro aqui há oito anos, é bom torcer um pouquinho para o Brasil”, disse o italiano Marco Muraro, de 38 anos. “Mas é triste ver a Itália fora da Copa.”

O aposentado Durval Brito, de 70 anos, vestia uma camisa da seleção com todos os títulos do Brasil bordados. “Já bordei o da Rússia aqui, olha”, mostrou. No intervalo, estava nervoso. “Neymar tem de começar a aparecer. Parece que não quer ser o melhor do mundo!”

E Neymar apareceu. Primeiro, Willian arrancou pela esquerda e, segundos antes de o camisa 10 entrar de carrinho, o bar de trás antecipou o desfecho do lance, gritando gol. Alegria com delay. Perto do fim, o craque da seleção arrancou para servir Roberto Firmino. Mais abraços, gritaria e buzinas.

Fatura liquidada, um homem subiu na cadeira do bar e, com um megafone, puxou um Bella

Ciao, versão Copa da Rússia. “Messi, tchau! Messi, tchau! Messi, tchau, tchau, tchau!”, cantou o bar inteiro. “E o argentino já está chorando, porque o hexa vem aí.”

A Copa emociona, a nação é sofrida, tem desemprego, mas o futebol faz a gente esquecer tudo

Paulo Ataíde,

PERCUSSION­ISTA

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TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO 1. Todas as mesas ocupadas no São Domingos.
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HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO
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3. Museu do Futebol transmitiu a partida
FABIO MOTTA/ESTADÃO 2. Torcida na Praça Mauá, no Rio. 3. Museu do Futebol transmitiu a partida

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