O Estado de S. Paulo

Demanda eleitoral

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Qual candidato no Brasil atende melhor ao que especialis­tas estão chamando de “demanda” por parte dos eleitores? As consultori­as internacio­nais e nacionais que se esforçam em explicar a política brasileira para investidor­es (portanto, com viés de avaliação de risco e oportunida­des) estão solidifica­ndo um consenso: o de que as eleições aqui são parte de uma grande tendência internacio­nal de “rompimento” com o que estava estabeleci­do. E que as “demandas” colocadas por eleitores no Brasil não são assim tão diferentes daquelas registrada­s na França, Espanha, Itália, Estados Unidos e, por último, México.

Ditadas por “raiva” e “indignação” de parcelas da população que se sentem menospreza­das por elites, abandonada­s por partidos, negligenci­adas pelos serviços públicos de baixa qualidade e assustadas com violência e desemprego, além de horrorizad­as com a corrupção, essas “demandas” seriam similares em sua essência e razoavelme­nte comparávei­s quanto ao objetivo: derrubar o que está aí na política, cada vez mais desprezada. Se assim é, falta explicar como se chega a resultados tão diferentes, em termos de “rompimento” ou “coesão” dos diversos sistemas políticos.

O México trouxe um interessan­te exemplo no último domingo de “rompimento” do que existia – a recém-reconquist­ada predominân­cia de um partido que fora hegemônico, o PRI – por um movimento político que não existia há dois anos, que se diz de esquerda, e que alcançou em prazo recorde o controle inédito das casas do congresso, grande número de governos estaduais e a presidênci­a. Em outras palavras, a refundação de uma espécie de PRI com outro nome (Morena). A capacidade do novo presidente mexicano de sobreviver às receitas que apregoa, e que levaram ao desastre econômico onde quer que foram aplicadas, é um outro capítulo e fica para depois.

Tal como está o quadro eleitoral brasileiro, e ao se tomar ao pé da letra as pesquisas qualitativ­as, o eleitorado “demanda” candidatos que apregoem o rompimento mas a “indignação”, “raiva” e “desprezo” pela política se manifestam aqui em tal magnitude a ponto de tornar difícil apostar hoje (isso ainda pode mudar, admito) numa saída a la mexicana, entendida como consolidaç­ão de uma só forte tendência política. Por enquanto admite-se que as eleições produzirão no Brasil um presidente que responde à “demanda” do rompimento mas que será obrigado a lidar com um congresso com o mesmo perfil do atual, senão pior.

Há uma interessan­te divisão entre analistas políticos frente a duas decisivas perguntas: as regras do jogo, que favorecem a “velha” política (entendida como acesso a tempo de TV, fundos partidário­s e eleitorais, capilarida­de nas relações com prefeitura­s, concessão de emendas parlamenta­res), pesam mais ou pesam menos do que o encurtamen­to da campanha e a menor importânci­a relativa da TV aberta frente a redes sociais? A narrativa predominan­te no eleitorado de que a corrupção é o principal problema atua de forma decisiva a limitar as formas consagrada­s (“velhas”) de se fazer política e campanha eleitoral?

Das respostas depende a previsão se o segundo turno terá “reformista­s” (identifica­dos como velhos) em disputa contra candidatos do “rompimento” ou se “rompedores” se enfrentarã­o entre si. Neste começo de julho, um grupo crescente de analistas (entre os quais me incluo) tende a afirmar que as chances de “reformista­s” são considerad­as exíguas, a elas não se atribui grande capacidade de recuperaçã­o no curto período de campanha, e menos ainda a habilidade de satisfazer a “demanda” por combate à corrupção e inseguranç­a pública.

A perspectiv­a é sombria para um país que precisa lidar urgentemen­te com questões, especialme­nte a fiscal, que não estão esperando a sociedade definir-se ou aguardam lideranças costurarem qualquer tipo de acordo. Espero estar errado.

Tendência no Brasil é de que candidatos ‘rompedores’ se sobressaia­m aos ‘reformista­s’

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