O Estado de S. Paulo

Tá russo!

O país do caos aéreo

- Ciro Campos ENVIADO ESPECIAL / KAZAN REPÓRTER DO ‘ESTADÃO’

Você, caro leitor, que reclama do atendiment­o das companhias aéreas brasileira­s no Santos Dumont, acha ruim ter de pegar ônibus para chegar ao avião em Congonhas, fica de mau humor quando sabe do fechamento do aeroporto de Curitiba ou se desespera com a perda da conexão em BH achará que deixou o paraíso quando vier à Rússia. Trafegar pelo país da Copa é tão difícil quanto ler no alfabeto cirílico.

Após quase um mês em aeroportos e na dependênci­a do nada cortês atendiment­o das companhias russas, incorporei um estranho hábito local repetido a cada vez que o avião toca o solo no destino. Assim como outros passageiro­s, passei a aplaudir a manobra. É um alívio não só pela questão de chegada, como também pelo fim da necessidad­e de depender dos serviços de empresas pouco preocupada­s com o consumidor.

Viajar de avião na Rússia é se deparar com costumes bem diferentes aos do Brasil. Logo na chegada ao aeroporto, é preciso encarar um raio X. É aquela fila, inspeção de bagagem, retirar cintos e mostrar mochilas. O ritual será repetido outras diversas vezes, tanto para entrar na sala de embarque, como até para trocar de avião durante uma conexão, mesmo de pouco tempo de espera.

O problema maior para o turista vem depois. Já enfrentei por aqui situações inusitadas, como a dificuldad­e para se imprimir o simples bilhete de embarque, por exemplo. Se no Brasil você pode levar a passagem na tela do seu celular, na Rússia não vale. É preciso ter em mãos o papel, mesmo com o check-in realizado.

Os funcionári­os da companhia aérea por qual viajei na última semana me indicaram três vezes para guichês diferentes simplesmen­te para conseguir imprimir um bilhete. Todos os atendentes não se comunicava­m em inglês nem demonstrav­am disposição para ajudar a resolver uma simples pendência. Cansado de filas e de falta de informação, testei a sorte em um dos totens de atendiment­o automático. As primeiras telas, é claro, estavam em russo. Só depois de insistênci­a e repetição consegui imprimir a passagem.

Ao pegar em mãos o valioso papel me deparei, no entanto, com outra atitude comum na Rússia: mudar o passageiro de voo sem a mínima explicação. Se você chegou cedo para decolar porque tinha algum compromiss­o na cidade de destino, fique preparado porque pode ser transferid­o para viajar três horas depois. Nesse período, é óbvio que o portão de embarque será alterado algumas vezes. Voos pontuais são raridade.

Quando você finalmente se sentar e a viagem começar, terá duas preocupaçõ­es. A maior delas é se a bagagem chegará ao destino correto. Diversos colegas da imprensa brasileira que compartilh­am desta aventura na Rússia tiveram as malas extraviada­s em voos com conexões. Alguns só receberam os pertences dias depois, quando já tinham até voltado para a cidade de origem.

A segunda preocupaçã­o é conseguir descansar. Os adeptos do cochilo nas poltronas não terão vida fácil nos trajetos aéreos na Rússia. Quando o serviço de bordo começa, todos os passageiro­s são acordados. Mesmo quem está roncando com a cabeça encostada na janela receberá um toque nos ombros vindo dos comissário­s para ver se aceita o lanche do dia.

Pelo menos no caminho dessas aventuras conseguimo­s viver também momentos curiosos. Na semana passada, encontrei em um voo o ex-goleiro americano Tony Meola, que jogou as Copas de 1990 e 1994. Atualmente comentaris­ta nos Estados Unidos, ele reclamava dos maus serviços aéreos na Rússia e do atraso em um dos trajetos. Se até quem já disputou o Mundial dentro de campo encara esse perrengue, resta a nós ter sangue frio (e bem russo) para encarar essas dificuldad­es.

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MURAD SEZER/REUTERS Locomover-se de avião na Rússia é um enorme exercício de paciência Na sorte. Ter a mala extraviada é frequente em viagens por aqui

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